Correio de Carajás

Marabá: dependentes químicos superam o vício com apoio do Narcóticos Anônimos

Alguns integrantes do Grupo NA passaram a trabalhar como forma de ocupar a mente e a buscar novos rumos para suas vidas

Adictos leem diariamente o guia entregue no grupo Narcóticos Anônimos/foto: Josseli Carvalho

O Programa Narcóticos Anônimos é uma sociedade sem fins lucrativos que oferece ajuda mútua para pessoas em seus mais variados graus de dependência.

O grupo geralmente é constituído por pessoas que se encontram em abstinência de algum tipo de droga ou que realizam tratamentos.

O NA funciona como um alicerce para os adictos (dependente quimicamente de alguma droga ilícita ou lícita), pois é lá que eles conseguem partilhar seus sentimentos e colocar em prática as estratégias desenvolvidas para lidar, da melhor forma, com situações de risco e a manter-se distantes das drogas.

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O foco principal das reuniões não é falar sobre a droga que gerou a dependência, mas, sim, expor o problema que enfrenta, o que pode gerar uma recaída e o que pode ser feito para que ele possa ser ajudado.

Em Marabá, participantes trocam experiências livres de julgamentos e conseguem, através do autoconhecimento, liberar sentimentos e emoções, auxiliando assim o tratamento contra a dependência química.

O Correio de Carajás conversou com dois adictos que estão passando pelo processo de tratamento contra a dependência química. Sem se identificar, eles preferiram usar um nome de pássaro.

“Passei trinta anos da minha vida usando droga.  Sou um adicto em recuperação. Meu corpo está limpo só por hoje há dezessete anos”, começa falando ‘Bem-te-vi’.

Questionado sobre o porquê da escolha desse pássaro, ele conta que é a referência é por conta do primeiro som que ouve logo cedo, quando acorda.

Morador do Núcleo Velha Marabá, ‘Bem-te-vi’ conta que a Praça São Félix de Valois tem tudo a ver com a sua vida, tanto com a adicção ativa como com a maneira que vive atualmente.

“Morei na praça. Conheço cada galho dessa árvore. Participo de uma irmandade que tem salvado minha vida todos os dias, é um programa espiritual, mas não é religioso. Todos os dias eu olho para a igreja e escolho se quero continuar buscando Deus ou morar debaixo da árvore de novo”.

Frequentando o Programa Narcóticos Anônimos, ele conta que as reuniões acontecem de forma gratuita com o objetivo de ajudar uns aos outros. Bem-te-vi afirma que o único requisito para participar e ser membro é ter o desejo de parar de usar drogas.

“Não importa o que faz ou o que fez. Qualquer adicto é bem-vindo aos narcóticos anônimos. Não existe remédio e ninguém vai estar sob vigilância. Se você recair, volte. Mas, não desista”, pede.

Aos 45 anos, “Águia” como prefere ser chamado, trabalha há algum tempo em uma movelaria. O marceneiro conta que há mais de 25 anos é dependente químico.

“Sinto muita vontade de usar ainda. Mas, me inspiro na leitura e meditação, pra ver os meus erros passados para não errar mais. E, quando a gente está trabalhando a gente esquece de muitas coisas porque o objetivo é o trabalho”, diz, reforçando que tem se mantido firme no propósito.

Águia relembra que começou a usar drogas por conta de algumas companhias e pessoas que andavam com ele nas ruas. Desse período, ele revela que não aconteceu nada de bom em sua vida, muito pelo contrário, só aconteceu coisa ruim.

“Quando vejo alguém com dependência, eu tento ajudar conversando. Quem acha que nunca mais vai sair do fundo do poço, eu digo que vai sair sim, porque eu consegui sair”, finaliza.

O Grupo Narcóticos Anônimos funciona em anexo à Paróquia São Francisco, no Núcleo Cidade Nova.

As reuniões acontecem toda segunda, quarta e sexta-feira, das 19h30 às 21h30.

Diagnóstico

A dependência de drogas lícitas ou ilícitas é considerada uma doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Dentre os fatores analisados estão:

– O controle prejudicado quanto ao uso (uso contínuo apesar do desejo de parar);

– Prejuízo social (descumprimento de obrigações relativas ao seu papel no trabalho, na escola ou em casa);

– Exposição ao fator de risco (direção de automóvel sob uso de substância, por exemplo);

– Sintomas farmacológicos (abstinência, por exemplo).

DADOS

De acordo com o último relatório mundial sobre drogas, divulgado em 2022 pelas Nações Unidas, aproximadamente 284 milhões de pessoas – entre 15 e 64 anos – usaram drogas em 2020. Isso quer dizer que esse número é 26% maior do que em 2010.

No Brasil, os dados divulgados pelo Ministério da Saúde dão conta de que o Sistema Único de Saúde (SUS) registrou, em 2021, mais de 400 mil atendimentos a pessoas com transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de drogas e álcool.

A maior parte dos pacientes é do sexo masculino, com idade de 25 a 29 anos. (Ana Mangas e Josseli Carvalho)