Correio de Carajás

Juíza alerta sobre “uberização” nas relações de trabalho

Magistrada critica reforma trabalhista, que acarretou a precarização das relações empregatícias, estabelecendo o surgimento do contrato intermitente.

Lutas, manifestações e reivindicações marcam o dia 1º de maio em várias cidades ao redor do mundo. Esse movimento, para garantir os direitos dos trabalhadores, vem desde o conflito em Chicago, nos Estados Unidos, no ano de 1886, quando trabalhadores foram assassinados por reivindicarem melhores condições de trabalho.

136 anos depois, a luta continua. Para a juíza titular da Vara do Trabalho de Marabá, Marlise Maia, as relações de trabalho ainda são extremamente desiguais. “O sistema trazido pela Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), em 1943, buscava igualar relações, que, em sua essência, são de desigualdade. De um lado, o detentor do capital que tem uma gama de desempregados a procura de uma colocação; de outro, o trabalhador que necessita do seu salário para sobreviver”, explica.

Para a magistrada, essas relações jamais serão igualitárias, porque é da essência dessa relação o desequilíbrio e a subordinação de uma das partes. Marlise diz que o sistema de leis trabalhistas – tal qual o sistema que protege o consumidor – deve buscar diminuir essas desigualdades materiais existentes na relação.

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De acordo com Marlise, o atual momento é de uberização nas relações de trabalho. Ou seja, uma modernização das relações, com um estilo mais informal, flexível e por demanda.

O nome varia da empresa Uber, na qual os motoristas possuem essa liberdade e atuam de acordo com a demanda dos clientes. Contudo, o modelo não se restringe a quem trabalha com aplicativos.

A chamada Revolução Industrial 4.0, decorrente da enorme revolução tecnológica que vem ocorrendo, acarretou o surgimento de novas formas de trabalho. Os setores vêm passando por enormes transformações nos últimos anos, e um dos desafios da Justiça do Trabalho é evoluir para acompanhar tais transformações”, ressalta a juíza.

Questionada sobre o vínculo empregatício através das plataformas digitais, a magistrada fala que ainda há muita discussão nos tribunais sobre o assunto, já que a jurisprudência ainda não está estabilizada quanto ao tema, e existem decisões que os reconhecem como empregados e outras em que são reconhecidos como autônomos.

Outro ponto levantado foi quanto a exigência da carteirinha de vacinação do empregado, após entrar um vigor uma portaria do Ministério do Trabalho e Previdência que proíbe as empresas de exigirem o comprovante de vacinação contra covid-19 para contratar ou demitir trabalhadores por justa causa.

O Ministério Público do Trabalho chegou a divulgar um guia esclarecendo que a vacinação é uma medida de proteção coletiva e, portanto, um dever tanto de empregados quanto de empregadores.

“O empregador tem a obrigação de manter o meio ambiente de trabalho saudável e hígido para todos os que lá transitam. Então, entendo que está inserido dentro do seu poder diretivo a exigência da certeira de vacinação para que o empregado adentre no local de trabalho. Há decisões que confirmaram a justa causa em tais situações. Eu não enfrentei tal questão”, diz Marlise.

Reforma trabalhista

“A reforma trabalhista acarretou a precarização das relações empregatícias, como por exemplo, o surgimento do contrato intermitente. Pessoalmente, não vislumbro avanços com a reforma. Não houve aumento de empregabilidade”, resume.

Marlise admite que a reforma causou um decréscimo do ajuizamento de ações na Justiça do Trabalho, porque a partir de 2017 passou a ser exigido o pagamento de honorários de sucumbência na justiça trabalhista. “O Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região editou súmula, na qual afastou a incidência de tal dispositivo da reforma por entender que é inconstitucional”.

Marlise Maia é formada em direito pela Universidade Federal do Pará. Passou no concurso para o cargo de juiz do trabalho em 2004, e em 2010 foi promovida a juiz titular. Atuo nos municípios de Xinguara e Parauapebas antes de vir para Marabá.

Marlise integra a 4ª Vara do Trabalho de Marabá, que faz parte do TRT da 8ª Região. Atualmente, a equipe alcançou duas das quatros metas estabelecidas pelo Tribunal. “Nos encontramos em décimo quarto lugar entre as 56 varas que compõe o TRT8”, comemora. (Da Redação)