Correio de Carajás

Incra se recusa a entregar títulos em Parauapebas alegando “questões ideológicas” do MST

O evento tinha como objetivo a entrega de Títulos Definitivos ao assentados

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) marcou para quinta-feira (18) — com a presença do presidente do órgão, Geraldo José da Camara Ferreira de Melo Filho — a entrega de 126 Títulos de Domínio de assentados do Projeto de Assentamento Palmares do Município de Parauapebas. O evento estava agendado para as 15h, na Escola Crescendo na Prática, na Vila Palmares II. No entanto, a entrega não foi realizada porque os assentados compareceram ao local com bandeiras do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). 

Jorge Neri, diretor estadual do MST e presidente da Associação de Produção e Comercialização dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Assentamento de Palmares e Região (APROCAR), se fez presente na solenidade e falou com exclusividade à equipe do CORREIO.  

A celeuma teve início porque o Incra, segundo Jorge, declarou que só realizaria a entrega do título se eles retirassem a bandeira do MST do ato. Nesse momento, os militantes do movimento se opuseram à exigência, afirmando que preferiam não receber o documento público nessas circunstâncias. 

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Os militantes consideraram um desrespeito à história de luta, sobretudo porque, afirma Jorge, o presidente é um servidor público federal e ocupa cargo para servir ao interesse público – que nesse caso se dá para a reforma agrária, cujo MST é objeto. 

Em tom de denúncia, Jorge afirmou que o presidente do Incra tirou deles o direito de receber os títulos definitivos, documentos que já estão prontos e assinados. Agora, promete, eles irão juntar todos os beneficiários – 126 famílias e 500 assentados –, e se dirigir ao prédio do Incra para fazer valer o seu direito. 

Segundo ele, o planejamento era fazer uma grande festa para comemorar a conquista coletiva do movimento. Realizar, inclusive, um churrasco com muita dança e convidar a cidade toda para festejar. 

Esse ano, o MST comemora os 28 anos de existência do maior assentamento de reforma agrária da região – e um dos maiores do Estado. Em todo esse tempo eles lidam com o Incra – que é o órgão responsável pela reforma agrária. O MST possui, enquanto simbologia do movimento, a bandeira – conhecida internacionalmente – que os acompanha em todos os eventos, junto da bandeira do Brasil, representante da pátria. 

OUTRO LADO 

Geraldo José da Camara Ferreira de Melo Filho, presidente do Incra desde outubro de 2019, alegou que, durante o ato, o instituto foi impedido de fazer a entrega, em um resumo do que o Instituto enfrenta muitas vezes no Brasil inteiro, com o que ele chama de “resistência do pessoal dos movimentos” em relação à titulação das terras. 

Geraldo Filho, de amarelo – à esquerda – e Jorge Neri, de vermelho – à direita

Uma vez que se titulam as terras, afirma o presidente, essas pessoas estão livres para continuar com o movimento e para “fazer da vida dela o que quiserem”, e nessa quinta-feira eles se “organizaram para impedir que o direito dos assentados fosse respeitado”. 

O presidente declarou que o Incra não se fez presente para criar confusão. “Mais uma vez – pensando na política deles e não no interesse dos assentados – o Instituto foi impedido de prosseguir com a entrega. Por uma questão de ideologia, as pessoas arrumaram um jeito de impedir que as coisas continuassem”, afirmou. 

Ele justificou a interrupção da entrega dos títulos afirmando que, por se tratar de período eleitoral, não é possível realizar um ato com símbolos que remetam “a qualquer lado que seja”, referindo-se ao histórico apoio do MST ao Partido dos Trabalhadores (PT). O movimento, contudo, é social e não partidário.  

Em nota oficial da assessoria de comunicação, o Incra afirma que “foi impedido por representantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) de entregar Títulos de Domínio para famílias do assentamento Palmares”. 

“Representantes caracterizados do movimento manifestaram-se”, continua a nota, “causando tumulto e impedindo o direito legal dos beneficiários do assentamento de receber o documento definitivo do lote explorado por cada família”, motivo pelo qual foi suspendida a entrega de títulos para as famílias. 

O Incra suspendeu a entrega dos títulos por conta da presença de símbolos do MST no local

O Instituto caracteriza o episódio como “lamentável” e ressalta que a titulação integra o conjunto de ações do Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA), que tem como objetivo promover a segurança jurídica, além da sucessão familiar e acesso às políticas de apoio à agricultura – objetos que fazem parte da militância do MST. 

Por fim, o Incra diz condenar o fato e afirma que garantirá a entrega dos títulos aos beneficiários em nova data, “fazendo valer seus direitos”.  

O Correio de Carajás solicitou nota também à assessoria do MST, mas não foi enviada até essa publicação. (Clein Ferreira – com informações de Ronaldo Modesto)