Chegou ao terceiro dia, nesta quinta-feira (19), a escavação que está sendo feita no quintal de uma casa no Bairro Vale do Itacaiúnas, em Marabá, em busca de restos mortais de um desparecido político que teria sido morto durante a Guerrilha do Araguaia. Uma equipe multidisciplinar composta por 20 profissionais está no local fazendo um minucioso trabalho, mas até ontem (18) nenhum remanescente ósseo de ser humano havia sido encontrado. O CORREIO esteve acompanhando os trabalhos.
Quem esteve ontem na área da escavação foi Eugênia Augusta Gonzaga, procuradora-adjunta federal dos Direitos do Cidadão e presidente da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos. Ao jornal, com exclusividade, ela avaliou que o trabalho está na metade e admitiu que, pelo menos até esta quarta, ainda não haviam sido encontrados materiais considerados significativos por parte da perícia.
Perguntada sobre como a Comissão Especial teve acesso à informação de que possivelmente um desaparecido político poderia estar enterrado ali no quintal de uma residência, Eugênia Gonzaga explicou que se trata de uma denúncia antiga, de que um osso possivelmente de um fêmur humano foi encontrado por uma pessoa que trabalhava na construção da casa.
Leia mais:Vizinhos da residência onde é feita a escavação comentaram que quando o possível osso de ser humano foi encontrado a pessoa que o localizou (que seria um pedreiro) ficou apavorada e até abandonou a obra. Os proprietários ficaram apreensivos e procuraram as autoridades para expor o que tinha ocorrido. Aliás, a família tem acompanhado os trabalhos dando assistência à equipe, conforme constatado pela reportagem do Jornal CORREIO.
Por sua vez, Eugênia Gonzaga que durante muito tempo toda aquela região onde hoje existe o bairro Vale do Itacaiúnas era área de fazenda, que foi bastante modificada desde sua urbanização, o que dificulta ainda mais a localização de um possível remanescente ósseo.
Eugênia Gonzaga explicou que durante muito tempo as expedições de escavação nesta região vinham priorizando os cemitérios de cidades do Pará e do Estado do Tocantins, mas atendendo a pedido dos donos do imóvel, a comissão veio a Marabá.
Por outro lado, a procuradora-adjunta federal confirmou a realização de três expedições marcadas ainda para este ano na região; uma delas será feita a partir do dia 20 de agosto e a outra na última semana de setembro. Mas ela não declinou os locais das expedições por medida de segurança. “Para poder proteger mais as informações e deixar as famílias mais tranquilas”, completou.
TRABALHO DE PERÍCIA
O jornal conversou com o coordenador científico da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, Samuel Ferreira, que é perito médico legista e geneticista forense. Ele explicou que a fase pericial (que é esta) é feita por geofísicos e peritos com formação em Antropologia, Arqueologia e Medicina Legal, que visam detectar se eventualmente há restos mortais de alguma pessoa desaparecida.
Segundo Samuel, a partir de uma análise do solo, com equipamento específico para estre fim, os peritos identificaram e demarcaram a área para a escavação com maior probabilidade de alterações no subsolo. Foi aberto um buraco de 1,71 metro de profundidade por 1,87 metro de comprimento e 80 centímetros de largura, mas só foi encontrado material ósseo de animais, nenhum compatível com origem humana. Diante disso, eles começaram a expandir o buraco para aumentar sua largura.
“É um trabalho extremamente técnico”, resumiu o coordenador científico da Comissão Especial, explicando que toda a terra retirada passa por um processo de tamisação, que é a separação do conteúdo da terra, por meio de uma peneira para detectar eventuais fragmentos ósseos ou outros objetos diferentes da terra. “Esse material é peneirado literalmente em uma malha bem fina”, explica em linguagem acessível ao público leigo.
EQUIPE
Integram a equipe cerca de 20 profissionais, entre peritos, geofísicos, familiares de desaparecidos, membros da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, Ministério dos Direitos Humanos, do próprio Exército Brasileiro, Instituto Médico Legal (IML) e ainda pesquisadores da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa). (Chagas Filho)