Correio de Carajás

Golpes do “falso advogado” atingem profissionais e clientes em Marabá, revela OAB

Presidente Rodrigo Botelho propõe a criação de uma Câmara de Conciliação da Saúde, reunindo Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e secretarias de saúde

A Subseção de Marabá encerra 2025 com uma série de propostas e inovações para os profissionais e comunidade / Foto: Evangelista Rocha
Por: Ulisses Pompeu e Kauã Fhillipe
✏️ Atualizado em 18/12/2025 10h02

Durante entrevista concedida ao CORREIO DE CARAJÁS para fazer um balanço das ações da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Subseção Marabá, ao longo de 2025, o presidente da entidade, Rodrigo Botelho, revelou que advogados da comarca de Marabá vêm sendo vítimas recorrentes de golpes virtuais, situação que também tem atingido diretamente seus clientes. Segundo ele, o avanço de crimes digitais, especialmente o chamado “golpe do falso advogado”, tornou-se uma das principais preocupações da atual gestão, ao lado dos esforços de modernização da advocacia e da defesa das prerrogativas profissionais.

As informações foram detalhadas pelo presidente da OAB Marabá, Rodrigo Botelho, em entrevista concedida à equipe do CORREIO na manhã desta quarta-feira (17), na sede da entidade, na Folha 26.

Logo no início da conversa, Botelho destacou que uma das primeiras iniciativas da atual gestão foi investir na modernização da advocacia, com foco na integração da Inteligência Artificial às rotinas profissionais. Segundo ele, o objetivo foi ir além do uso básico da tecnologia, promovendo um processo de letramento digital entre os advogados e suas equipes.

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“A gente precisa educar digitalmente os trabalhadores que estão conosco nos nossos escritórios, os nossos familiares, porque é esse o nosso empreendedorismo. Se a gente não transformar socialmente o nosso meio-ambiente de convívio, nós vamos continuar sendo vítimas”, afirma.

Rodrigo: “quando a OAB está organizada, ela consegue ajudar estruturas fantásticas, é um privilégio tá aqui” / Foto: Ulisses Pompeu

O presidente explica que a aplicação da IA passou a abranger desde o atendimento inicial aos clientes até a organização administrativa, gestão de dados e adaptação às mudanças trazidas pela reforma tributária, tornando a advocacia mais eficiente e preparada para as transformações do Judiciário.

Crimes digitais e o golpe do “falso advogado”

Outro ponto que ganhou destaque no balanço de 2025 foi o combate aos crimes virtuais, especialmente aqueles que envolvem falsos advogados. De acordo com Botelho, “a advocacia tem sido um dos principais alvos de grupos de estelionatários organizados em todo o país”.

O presidente aponta que, apesar do volume crescente de denúncias, há uma sensação de impunidade. Segundo ele, Marabá acumula centenas de boletins de ocorrência relacionados a esse tipo de crime, mas sem respostas efetivas por parte do Estado. “Como não há resposta, a gente vai caindo na impunidade, e isso afeta emocionalmente toda a classe. Esse é um dos maiores problemas que já entrou como foco logo no início de 2025”, completa.

Dados divulgados pela OAB nacional, em meados de agosto, indicam que cerca de 17,5 mil pessoas já foram vítimas do chamado “golpe do falso advogado” no Brasil. O esquema consiste no uso indevido de fotos e informações públicas de profissionais para criar perfis falsos em aplicativos de mensagens, onde os criminosos solicitam antecipação de valores, supostamente para custas processuais.

Como forma de prevenção, Botelho orienta que os clientes sempre confirmem qualquer pedido financeiro diretamente com seus advogados. Para ele, no entanto, a solução passa também por mudanças estruturais.

 

“O Poder Judiciário precisa criar núcleos rápidos, autônomos e de urgência para enfrentar esses crimes. Isso também precisa ser colocado em prática e precisa ser pesquisado, com o auxílio das universidades e faculdades”, defende.

 

Mercado de trabalho e excesso de profissionais

Durante a entrevista, o presidente da OAB Marabá também fez uma análise crítica sobre o mercado jurídico brasileiro. “O Brasil tem mais de um milhão e meio de advogados para pouco mais de 200 milhões de habitantes. Isso é uma desproporcionalidade enorme”, avaliou, atribuindo o cenário a “erros históricos na política educacional e à financeirização do ensino”.

Apesar disso, Botelho faz questão de destacar o papel positivo das faculdades de Direito, sobretudo no interior do país, apontando que a educação jurídica atual é mais diversa e conectada com a realidade social.

Câmara de Conciliação da Saúde

Um dos dados mais sensíveis apresentados durante a entrevista diz respeito à área da saúde. Entre agosto de 2024 e agosto de 2025, o Fórum de Marabá registrou mais de mil processos de judicialização da saúde, envolvendo pedidos de medicamentos, internações e transferências de pacientes. Apenas dois desses casos resultaram em conciliação. “Ninguém entra na Justiça pedindo saúde se não for muito urgente”, observou.

Diante desse cenário, a OAB propõe a criação de uma Câmara de Conciliação da Saúde, reunindo Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e secretarias de saúde.

“Com isso, a gente desjudicializa a saúde, tirando a burocracia e efetivamente vai salvar vidas. Acabamos de formalizar esse pedido para a Conferência Nacional de Direitos Humanos [que está acontecendo neste mês de dezembro] e estamos sonhando com mais recursos para o município para fazer isso de forma multilateral”.

A entrevista também mostrou o papel histórico da OAB nas pautas sociais, que seguem como prioridade para 2026. Direitos humanos, combate ao assédio na advocacia e defesa das mulheres continuam no centro das ações da entidade.

Outro eixo estratégico destacado por Botelho é a educação constitucional desde a base escolar de maneira acessível, o que para ele, o desconhecimento dos direitos fundamentais fragiliza a cidadania. “O cidadão não pode escolher sua profissão sem conhecer seus direitos fundamentais. Só o artigo 5º da Constituição tem 74 incisos que regem nosso convívio”, pontua.

Por fim, o presidente da OAB Marabá salienta a necessidade de fortalecer a estrutura institucional da região, especialmente diante do peso econômico da mineração no sudeste do Pará. Segundo ele, a ausência de órgãos como a Agência Nacional de Mineração (ANM) e o Instituto de Terras do Pará limita o desenvolvimento local e a atuação da advocacia.

Com ações voltadas à modernização, defesa da cidadania e fortalecimento institucional, a OAB Marabá concluiu 2025 projetando que o próximo ano seja marcado pela ampliação do diálogo com a sociedade e pela busca de soluções concretas para problemas históricos da região.