A manhã desta sexta-feira (6/11) foi marcada por uma manifestação em frente à sede do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) em Marabá, que reuniu três famílias revoltadas por suas vítimas parturientes e recém-nascidos, que perderam a vida durante o momento que deveria ser um dos mais felizes, a maternidade.
Elas cobram justiça por essas mortes ao órgão que fiscaliza a lei, solicitando que seja aberta uma sindicância junto ao Hospital Materno Infantil (HMI) e ao Hospital Regional (RH) para apurar os casos e a requisição de abertura de inquéritos policiais. A manifestação seguiu protocolos de distanciamento com demarcação de lugares, uso de máscara e disponibilização de álcool em gel.
As famílias foram acompanhadas pela advogada Roberta Celestino Ferreira, que explicou sobre a situação das vítimas, onde no caso da Dinalva Almeida Martins, há o inquérito policial, porém, sem respostas até o momento. “Estamos aqui para pedir justiça por essas mulheres e crianças que conseguimos identificar, e até mesmo pelos que não houve identificação, porque não temos retorno sobre nada nem do Conselho Municipal de Saúde, nem do CONDIM, nem do CRM, e o MPPA é o órgão fiscal da lei. Queremos que todas essas vítimas sejam assistidas e a justiça seja promovida”, explica Roberta.
Leia mais:Zacarias de Sousa Costa é irmão de Isabel Cristina de Sousa Costa, de 38 anos, uma das vítimas em questão. Ele conta que a sua irmã era professora da rede pública de educação municipal, atuando por mais de 10 anos nas escolas Paulo Freire e Deuzuita Melo De Albuquerque, e teve seu primeiro filho no último dia 16 de outubro.
“A gravidez dela era de risco, conforme alertava o médico, e precisava realizar o parto em um hospital que tivesse Unidade de Terapia Intensiva para ela e para o recém nascido, antes de completar 39 semanas de gestação. Por conta dessa recomendação, ela foi dar à luz no Hospital Regional do Sudeste do Pará Dr. Geraldo Veloso, onde fazia pré natal de gestação de alto risco, que era o único que possuía as UTI’s, mas, houve esse incidente, relata Zacarias.
“Isabel Cristina, deu entrada no Hospital Regional em plena saúde, no dia 12 de outubro de 2020, permanecendo até o dia da sua morte, em 18 de outubro. Inclusive, passou uma semana internada apenas para aguardar vaga nas UTI’s e com todos os exames em conformidade, fez amizades com funcionários, chegando a receber presentes de algumas das funcionárias do HR. Os problemas de saúde ocorreram somente no dia 17, um dia após a realização de seu parto cesariano, por conta de uma hemorragia pós-parto que se agravou para endema pulmonar agudo, seguido de parada cardiorrespiratória, após receber anestesia geral para tratar a hemorragia. A família só foi informada na noite do dia 17 (sábado), véspera de sua morte”, relata Zacarias.
A professora faleceu dois dias após o parto cesariano e, segundo Zacarias, nem mesmo o médico ficou sabendo da morte da paciente. “Nem o direito de visita ela teve. Nossa família não sabe se ela sentiu dor, se foi medicada com algo que não podia, nada disso sabemos. Meu cunhado foi quem contou ao médico que fez o parto de Isabel Cristina sobre o seu óbito, inclusive, estranhamente já havia um carro funerário aguardando na entrada do hospital”, relata Zacarias.
O filho de Isabel está com 20 dias de vida, órfão de mãe, e é criado hoje pelo seu pai. Enquanto isso, a família procurou todas as instâncias cabíveis para que providências fossem tomadas a respeito da morte da professora.
“Protocolamos requerimentos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Subseção Marabá, no Conselho Regional de Medicina (CRM), no Conselho Municipal de Saúde, no Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Mulher (Condim), na Câmara Municipal de Marabá (CMM) em três comissões, inclusive, e no MPPA. No MPPA, requeremos a abertura de sindicância no HMI e HR e a abertura de inquérito policial. Esperamos que gere algum resultado, pois queremos justiça por Isabel Cristina, pelas demais mães e recém-nascidos vítimas, além de evitar que isso aconteça novamente”, enfatiza Zacarias.
Familiares de Sharleana Rodrigues dos Santos, de 34 anos, que morreu junto com seu bebê, recentemente, dia 26 de outubro, no Hospital Materno Infantil (HMI), também estavam presentes à manifestação.
Segundo a casa de saúde, o filho da mulher não apresentava batimentos cardíacos durante a ultrassonografia, confirmando o óbito fetal. Com isso, a paciente teve de passar a noite no HMI para que fosse realizado o processo de indução para expelir o feto. No entanto, Charleane não saiu de lá com vida.
A irmã de Sharleana, Raimunda Nonata Batista, conta que ela deu entrada no HMI com 18 semanas, frágil, debilitada e com dores nas costas e muita cólica. “Quando eu cheguei a ver minha irmã, ela estava com os olhos escuros, nem falava direito. Até agora não há esclarecimentos sobre a morte dela. Estamos aguardando a necropsia do Instituto Médico Legal (IML) para saber o que houve, pois o HMI a família nada diz”, revolta-se Raimunda.
Familiares de Dinalva Almeida Martins, que foi a óbito durante o parto no HMI em 07/03/2020 e de sua recém-nascida Maria Vitoria Almeida do Nascimento, faleceu em 16/03/2020, na UTI Neonatal do Hospital Regional de Marabá, após ser transferida do HMI, também estavam presentes à manifestação.
POSICIONAMENTOS
A Reportagem do Portal Correio procurou o MP em Marabá, o qual informou que representantes da família de Isabel Cristina foram recebidos nesta sexta-feira (6) pelos promotores Cristine Magella e Samuel Sobral, que estão respondendo em conjunto pela 1ª Promotoria Criminal de Marabá. Ainda segundo o MPPA, uma Notícia de Fato foi distribuída e os promotores vão pedir a instalação de inquérito policial para apurar os fatos.
Sobre o caso de Isabel Cristina, o Hospital Regional de Marabá emitiu nota, confirmando que a paciente deu entrada no dia 12 de outubro, vinda “transferida de outra unidade, em estado grave, com gestação de alto risco e comorbidades que agravaram seu quadro clínico”, conforme a nota. Ainda segundo o hospital, Isabel Cristina recebeu toda a assistência necessária.
“O parto foi realizado e o bebê passa bem. Porém, mesmo com todos os esforços da equipe médica e de assistência, a paciente não resistiu, indo a óbito no dia 18. A unidade se solidariza com os amigos e familiares e permanece à disposição para demais esclarecimentos”, finaliza a nota do Hospital Regional.
Em relação ao caso da recém-nascida de Dinalva Almeida Martins, Maria Vitória Almeida do Nascimento, que faleceu na UTI Neonatal do HR, o hospital irá apurar informações para se posicionar posteriormente.
A Prefeitura de Marabá foi procurada pelo Portal Correio para posicionamento sobre os casos envolvendo o HMI, porém, até o fechamento desta reportagem não se manifestou.
A advogada Roberta Celestino informou a Reportagem do Portal Correio que além de Dinalva Almeida Martins, Isabel Cristina de Sousa Costa e Sharleana Rodrigues dos Santos, há muitos casos de mulheres que faleceram durante o parto ou gestação e de crianças recém nascidas que vieram a óbito no município de Marabá/PA. Confira abaixo as vítimas identificadas que a advogada reuniu:
– Simone de Souza Nascimento – Obito em 04/01/2019 no HMI. Ela perdeu muito sangue no parto e o HMI não possuía banco de sangue. No intervalo de tempo entre ir buscar as bolsas no Hemopa, Simone faleceu.
– Maiany de Fátima Silva Ferreira – Lesão corporal no HMI em 06/01/2019. Teve parto prematuro de seis meses e o bebê Ícaro Manuel Ferreira Trindade ficou com consequências, necessitando fazer exames de média e alta complexidade, sendo pouco assistido pelo município.
– Raquel Santos da Silva – Lesão corporal em 26/03/2019. Teve as trompas removidas sem consentimento dela ou de um familiar no HMI.
– Aline Lima Pinheiro – Lesão corporal em 06/10/2020 no Hospital Santa Terezinha, após a realização de histerectomia, teve sua alça intestinal perfurada.
(Zeus Bandeira e Josseli Carvalho)