O irmão de uma estudante denunciou um caso de homofobia dentro de uma escola particular localizada no bairro da Marambaia, em Belém. Isso aconteceu após a estudante de 14 anos, do 9º ano da Escola Adventista de Belém, mostrar a ele o conteúdo de uma prova de língua portuguesa aplicada para os alunos na última segunda-feira (18). No exame, perguntas sobre condenação e métodos para “evitar” a homossexualidade faziam parte do questionário que continha 50 perguntas.
O caso ganhou grande repercussão nas redes sociais quando o irmão da estudante, Herisson Lopes, de 26 anos, postou imagens da prova que traz questões homofóbicas. Ele contou em entrevista ao G1 que a irmã se negou a responder a perguntas, e que se sentiu indignada com as questões repassadas na prova.
“Esse livro foi recomendado pelo professor e explica como a criança pode se tornar homossexual, como deve ser evitado e que existe a cura gay. Pasmem que essa matéria não se trata de ensino religioso e sim língua portuguesa brasileira. Eu não consigo achar conveniente esse tipo de ensinamento para uma turma, principalmente a quem está prestes a fazer seu processo seletivo”, diz Herisson.
Leia mais:De acordo com o irmão da estudante, a prova contendo as questões homofóbicas seria de consulta sobre o livro “De bem com você”, de Sueli Nunes Ferreria. Na manhã desta terça-feira (19), após toda a repercussão nas redes sociais, a família da aluna procurou a escola e registrou uma ocorrência referente ao caso.
Em conversa com a direção e coordenação pedagógica, a escola disse a família da aluna desconhecer esse tipo de conteúdo aplicado em sala pelo professor. Além disso, a escola teria afirmado que os professores, independente do conteúdo programático, tem flexibilidade para tratar assuntos diversos em sala.
“Eu fico pensando como esse tipo de ensinamento para adolescentes, como a minha irmã, que estão em fase de construção podem torna-los homofóbicos. Não podemos esquecer que o Brasil é o país onde mais se mata homossexuais e uma escola aplicando, repassando e ensinando esse tipo de coisa para os alunos, sejam eles de qualquer série, está contribuindo para que a homofobia se propague cada vez mais e isso não pode ficar impune”, afirma Herisson.
O irmão da estudante disse que, após a ocorrência registrada, vai procurar Ministério Público do Estado (MPPA) e que a denúncia também será registrada no Conselho Estadual de Educação. Ainda em relação ao conteúdo repassado em sala de aula, Herisson disse que a intenção em fazer a denúncia é que livros como este parem de circular principalmente em ambientes escolares.
Em nota, a Escola Adventistas Belém disse que as questões contidas no questionário tinham como objetivo colher as diversas opiniões e sentimentos sobre a temática em estudo e davam a cada estudante a oportunidade de expressar livremente sua opinião. O livro de referência serviu como auxílio na tarefa, o que ocorre em várias disciplinas, segundo o colégio.
Também em nota, a instituição disse que procura proporcionar um debate qualificado a respeito do assunto. A escola afirmou que busca formar um cidadão que respeita opiniões diversas e todos os indivíduos, sem qualquer tipo de discriminação sexual, racial, religiosa, ou de outra natureza. A escola garante que apresenta uma proposta educacional de alta qualidade, pautada em valores baseados na Bíblia.
O livro
O livro “De bem com você”, de Sueli Nunes Ferreira se apresenta como um guia de respostas práticas sobre questões como relacionamento, solidão, separação dos pais. Na descrição da obra, a autora promete responder a questões como: O que se faz para arrumar um namorado? É possível amar duas pessoas ao mesmo tempo? Como lidar com a solidão? E quando os pais se separam? A pessoa nasce ou se torna homossexual? Como vencer as tentações?
Homofobia
De acordo com o presidente da Comissão de Diversidade Sexual e População LGBTI da OAB-PA, João Jorge Neto, o caso se trata de homofobia, sim. “Isso se constitui como uma prática de homofobia e é crime. Antigamente era só uma prática e que não necessariamente era criminalizada, mas agora além de ser uma prática, que remete a um discurso de ódio, que incita de alguma forma preconceito, discriminação, remetendo a uma visão religiosa, com indução inclusive a convicção religiosa de crianças; é crime descrito na lei 7716/1889”, explica.
Como o caso é qualificado como crime, a escola pode ser responsabilizada. “A grande questão é que a denúncia precisa chegar aos Órgãos responsáveis, como o Ministério Público, e também registrar um boletim de ocorrência na Delegacia de Crimes Discriminatórios e Homofóbicos”, acrescenta.
A prática, no entanto, atinge também o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “O estatuto fala de uma formação cidadã. A escola deve proporcionar, além da educação formal com conteúdos e matérias, como preveem os currículos, uma formação cidadã para que a criança e o adolescente possam conviver em uma sociedade, principalmente como a nossa que é diversa e abriga todos os povos”, defende João Jorge.
Ele lembra ainda que desde 1990, o termo “homossexualismo” – usado na prova – foi abolido pela Organização Mundial da Saúde (OMS), já que o significado remete a uma ideia de doença, que não é e nunca foi reconhecido pela organização. O termo correto é homossexualidade, tanto quanto heterossexualidade, que se refere ao modo ser de cada pessoa.
A comissão lista os endereços onde denúncias como essas podem ser feitas, veja abaixo:
(Fonte:G1)