Correio de Carajás

Falta de medicamentos para tuberculose e hanseníase em Marabá aflige pacientes

Mais de 60 pacientes que fazem tratamento contra tuberculose, em Marabá, estão passando por um drama sem precedentes: a falta de medicação. Sem ela, eles podem até mesmo morrer. É que a doença afeta, principalmente, os pulmões. Atualmente, segundo a Secretaria Municipal de Saúde, há 61 pacientes que tratam a tuberculose em Unidades Básicas de Saúde (UBS) do município.

O caso chegou à Reportagem do CORREIO por intermédio de um paciente, que narrou seu drama e o medo de morrer pela falta da medicação, que não é comercializada em farmácias, apenas disponibilizadas nas UBS. Por causa do preconceito com quem tem tuberculose, vamos identificar o denunciante como João.

Ele relata que começou a perceber os sintomas em maio de 2020, apresentando tosse e falta de ar. Mas só descobriu a doença no mês de outubro. Quando compareceu à UBS Hiroshi Matsuda, na Folha 11, em outubro, tentou marcar uma consulta, porém, ela só seria realizada semanas depois. A essa altura, o paciente não conseguia mais esperar.

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O filho de João atua na área da saúde e conseguiu agilizar um exame de radiografia particular para ele. O resultado preocupou o radiologista, pois revelou um grande comprometimento do pulmão do paciente. Com isso, recomendou que fosse feita uma tomografia.

Por sorte do destino, o filho de João encontrou um pneumologista que estava em Marabá no mês de outubro e solicitou que fossem realizados, além da tomografia, alguns exames complementares. “Tive de fazer tudo ‘no particular’. Quando levei ao médico, ele disse que era tuberculose e que o tratamento seria via Sistema Único de Saúde (SUS)”, relembra.

Com o diagnóstico, ele voltou ao Hiroshi Matsuda e iniciou o tratamento, retirando os medicamentos semanalmente. Tudo corria bem, até o dia 17 de dezembro, quando ao comparecer à UBS, foi informado sobre a falta do medicamento.

Na primeira fase do tratamento de tuberculose é utilizado um único comprimido contendo rifampicina, isoniazida, pirazinamida e cloridrato de etambutol. Na segunda, o paciente recebe outro comprimido com rifampicina e isoniazida. Mas nenhum deles era mais encontrado na UBS, segundo João.

Cansado de esperar, o paciente foi ao Ministério Público Estadual na última segunda-feira (4), protocolar uma reclamação devido à demora, que acabou por comprometer o seu tratamento. Na quarta-feira (6), uma servidora do Hiroshi Matsuda entrou em contato para informar da disposição dos remédios, porém, suficientes apenas para uma semana.

O cenário preocupou João, já que os medicamentos seriam apenas por um curto período e ainda restavam duas semanas para finalizar o tratamento. “Sinto que estou piorando de novo, por ter ficado tanto tempo sem continuar o tratamento”, angustiou-se.

O QUE ESTÁ ACONTECENDO?

O Portal Correio levou a situação de João até a Secretaria Municipal de Saúde de Marabá, para entender o que estaria acontecendo. A realidade do problema revelou que tudo gira em torno do Governo Federal, que adquire os remédios das indústrias farmacêuticas, repassa-os para os Estados e, posteriormente, eles chegam aos municípios.

Uma falha nesse processo, que mais parece uma cachoeira de três quedas, pode comprometer todo o sistema e prejudicar os pacientes que já são assistidos e até mesmo os que venham a ser diagnosticados futuramente.

A coordenadora de doenças crônicas da SMS, Gisele Leite, esclareceu que no dia 24 de novembro de 2020, a Secretaria de Estado de Saúde Pública (SESPA) enviou um e-mail comunicando que o estoque estava zerado para medicamentos de tuberculose e que o Ministério realizaria um inventário para fazer o pedido, mas, isso iria demorar.

“Os pedidos são feitos trimestralmente por nós (Prefeitura) para a Sespa, porém, tivemos essa falha ocasionada pela situação do inventário. Em outubro houve o último abastecimento e em novembro já não houve mais. Entretanto, em dezembro a Sespa recebeu uma pequena quantia e realizou o repasse, mas só chegou a Marabá no dia 1º de janeiro, com 340 comprimidos”, explica Gisele.

As UBS já estão abastecidas com os remédios, porém, devido à pequena quantidade recebida, será suficiente apenas para uma semana, conforme estimou a servidora do Hiroshi Matsuda, que contatou João. Mas, há uma possibilidade de a situação ser normalizada.

“Eu entrei em contato com a Sespa e fui sinalizada que o Ministério já finalizou o inventário e os remédios se encontram em Belém. Só estamos aguardando o repasse. Estimo que até dia 10 de janeiro eles cheguem aqui”, acrescentou Gisele.

Ela também confirmou que o MP agiu diante da denúncia de João, tendo a Promotoria requerido informações sobre o cenário para a secretaria e obtendo como resposta a mesma informada para a Reportagem.

PACIENTES DE HANSENÍASE TAMBÉM AFETADOS

A coordenadora revelou que os pacientes que tratam a hanseníase também estão sem receber medicamentos para continuar ou iniciar o seu tratamento. Neste caso, a situação é outra, pois esses remédios são repassados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para o Ministério da Saúde.

Gisele conta que a Secretaria Municipal recebeu uma nota técnica da OMS comunicando que os medicamentos não foram enviados devido à falta de matéria prima para elaboração dos comprimidos.

Gisele segura a última cartela de medicamentos em estoque para tratar hanseníase

“Atualmente, os pacientes que já estão em tratamento possuem remédios suficientes para durar até o final de janeiro. Isso porque conseguimos enviar medicamentos para todos os assistidos, ainda no final de dezembro, então tivemos um ganho de 30 dias”, completa a coordenadora.

Infelizmente, se hoje, um paciente com diagnóstico de hanseníase procurar uma UBS para receber os medicamentos, ele não encontrará. Tudo depende da OMS.

Em relação à tuberculose, não houve, se quer, uma nota técnica esclarecendo o motivo da falta dos remédios, apenas um e-mail. (Zeus Bandeira)