Após 2 anos, 6 meses e 14 dias da abordagem que matou Genivaldo Santos, de 38 anos, em Umbaúba (SE), os ex-policiais rodoviários federais William Noia, Kleber Freitas e Paulo Rodolpho foram condenados, nas primeiras horas deste sábado (7). As penas vão de 23 a 28 anos de prisão.
Genivaldo morreu asfixiado após ter sido trancada no porta-malas da viatura e ser submetida à inalação de gás lacrimogêneo, em maio de 2022. O caso repercutiu mundialmente.
A Justiça condenou:
Leia mais:
- William Noia, que abordou Genivaldo desde o início da ocorrência e segurou a porta da viatura após a bomba de gás lacrimogêneo ter sido jogada no porta-malas, recebeu pena de 23 anos, um mês e 9 dias;
- Kleber Freitas, que fez, por cinco vezes, uso de spray de pimenta contra Genivaldo, recebeu pena de 23 anos, um mês e 9 dias;
- Paulo Rodolpho, que chegou após a abordagem já iniciada, jogou a bomba e segurou a porta, recebeu pena de 28 anos.
As defesas dos réus ainda podem recorrer da decisão.
O trio era acusado por tortura e homicídio triplamente qualificado. No entanto, o Júri Popular desclassificou o crime de homicídio doloso para os réus William Noia e Kleber Freitas, que passaram a responder por tortura seguida de morte e homicídio culposo – quando não há intenção de matar. Os dois foram sentenciados diretamente pelo juiz federal Rafael Soares Souza, da 7ª Vara Federal em Sergipe. Já Paulo Rodolpho, foi sentenciado pelo Júri Popular que o absolveu pelo crime de tortura e o condenou pelo homicídio triplamente qualificado.
Após a sentença, a irmã de Genivaldo, Laura de Jesus Santos, falou que apesar da condenação o sentimento da família não é de felicidade.
“Foi um resultado satisfatório, embora a gente não fique feliz com a desgraça de ninguém. Acalma, mas felicidade não traz”, disse ,
Os ex-prfs estão presos desde 14 de outubro de 2022, e foram demitidos da PRF após determinação do Ministro da Justiça em agosto de 2023.
No final da manhã do dia 25 de maio de 2022, Genivaldo, que tinha esquizofrenia, foi parado por estar pilotando uma motocicleta sem capacete. A perícia feita pela Polícia Federal durante as investigações concluiu que a vítima passou 11 minutos e 27 segundos em meio a gases tóxicos, dentro de um lugar minúsculo e sem poder sair da viatura estacionada. Segundo alegação dos réus, ele teria resistindo à abordagem [saiba mais sobre os depoimentos dos ex-agentes].
O julgamento durou 12 dias e incluiu uma vistoria na viatura em que Genivaldo foi colocado. Durante mais de 100 horas, o júri, composto por quatro homens e três mulheres, ouviu 28 testemunhas, incluindo familiares da vítima, peritos e especialistas. Foram ouvidos:
- Wallysson de Jesus Santos, sobrinho da vítima;
- uma pessoa que presenciou a ação;
- a mãe de Genivaldo, Maria Vicente;
- a ex-esposa de Wallysson (com quem era casado à época);
- um químico especialista em gás, ex-funcionário da empresa fabricante da granada de gás lacrimogêneo acionada dentro da viatura da PRF;
- o corregedor regional da PRF, que atuou na apuração das denúncias e no procedimento administrativo disciplinar instaurado contra os réus;
- uma irmã de Genivaldo;
- a viúva, Maria Fabiana;
- a médica que fez o atendimento de Genivaldo quando ele foi levado ao hospital;
- mais uma pessoa que presenciou a ação;
- agricultor que passava pelo local;
- um mecânico que presenciou o começo do procedimento policial
- um amigo de infância de Genivaldo, que viu a situação a partir do momento em que ele estava imobilizado;
- um policial rodoviário federal (defesa – William Noia);
- outro policial rodoviário federal (defesa – William Noia);
- mais um policial rodoviário federal (defesa – Paulo Rodolpho);
- médico cardiologista (defesa – Paulo Rodolpho);
- um PRF aposentado (defesa – Paulo Rodolpho);
- testemunha de defesa de Kleber Nascimento;
- tabelião de cartório e amigo que trabalhou na PRF (defesa – Kleber Nascimento);
- ex-diretor do IML à época;
- perito que fez o exame toxicológico em Genivaldo;
- médico legista que fez a necropsia no corpo de Genivaldo;
- um perito da Polícia Federal;
- uma perita da Polícia Federal;
- farmacêutico toxicologista que falou sobre a parte técnico-científica do processo (defesa – Paulo Rodolpho);
- um assistente técnico, perito criminal aposentado da PF (defesa – Kleber Nascimento);
- psiquiatra forense (defesa de Paulo Rodolpho).
Quem era a vítima
Genivaldo de Jesus Santos tinha 38 anos e era aposentado em virtude do diagnóstico de esquizofrenia. Ele era casado com Maria Fabiana dos Santos, com quem tinha um filho de sete anos e um enteado de 18.
De uma família de 11 irmãos, ele é lembrado como uma pessoa de personalidade tranquila, bom pai e muito prestativo com as pessoas próximas.
Em setembro de 2023, a Justiça Federal em Sergipe determinou que a União pague uma indenização por danos morais no valor de R$ 1 milhão para o filho de Genivaldo. Além de pagamento de indenização de R$ 405 mil para a mãe da vítima.
Abordagem foi gravada
Nas imagens da abordagem, gravadas por testemunhas, a perícia observou que o policial William de Barros Noia aparece pedindo para que Genivaldo colocasse as mãos na cabeça. Genivaldo obedece, mas mesmo assim, recebe um jato de spray de pimenta no rosto.
Segundo os peritos, o policial Kleber Nascimento Freitas jogou spray de pimenta pelo menos cinco vezes em Genivaldo, que alegou que não estava fazendo nada. A ação continuou no chão, quando policiais pressionaram o pescoço e o peito de Genivaldo com os joelhos.
Após Genivaldo ser colocado no porta-malas da viatura, o policial Paulo Rodolpho Lima Nascimento jogou uma granada de gás lacrimogêneo no compartimento. Paulo Rodolpho e William seguraram a porta, impedindo que a fumaça se dissipasse mais rapidamente.
A perícia feita pela Polícia Federal durante as investigações concluiu que a vítima passou 11 minutos e 27 segundos em meio a gases tóxicos, dentro de um lugar minúsculo e sem poder sair da viatura estacionada.
Com a detonação do gás lacrimogêneo, houve a liberação de gases tóxicos, como monóxido de carbono e ácido sulfídrico. Os peritos atestaram que a concentração de monóxido de carbono foi pequena, mas a de ácido sulfídrico foi bem maior, e pode ter causado convulsões e incapacidade de respirar.
Segundo a perícia, o esforço físico intenso e o estresse da abordagem aceleraram a respiração de Genivaldo, e isso pode ter potencializado ainda mais os efeitos tóxicos dos gases. A perícia constatou que os gases causaram um colapso nos pulmões.
(Fonte:G1)