Correio de Carajás

Escassez gera futuro incerto aos pescadores de Marabá

Com a redução de peixes nos rios, pescadores de Marabá enfrentam dificuldades financeiras; piscicultura surge como alternativa ainda distante

Edvaldo Cruz, presidente da Colônia de Pescadores, falou sobre a escassez de peixes, mas não condenou as novas tecnologias do mercado, os criatórios

A redução de espécies de peixes nos rios Tocantins e Itacaiunas, em Marabá e região, tem impactado diretamente a pesca, preocupando milhares de pescadores e fomentando discussões sobre alternativas sustentáveis, como a produção de peixes em criatórios estanques.

Um ponto em comum entre os feirantes é a predominância de peixes de criatório nos mercados locais. Essa opção, além de ser mais barata, garante uma oferta estável ao longo do ano, enquanto os peixes de rio apresentam preços mais elevados e disponibilidade limitada em certas épocas.

O preço acessível e a variedade são os principais atrativos para os consumidores das feiras de Marabá. Seja na Folha 28 ou na Laranjeiras, o tambaqui, a tilápia e o tucunaré disparam como os preferidos, refletindo a relação entre custo, qualidade e sabor.

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Com a crescente demanda, o mercado do peixe em Marabá tende a prosperar, mantendo as feiras locais como um espaço de geração de renda, e crescimento à economia e a cultura alimentar da região.

Em entrevista ao CORREIO, Edvaldo Cruz, presidente da Colônia de Pescadores Z-30, com sede em Marabá, reconhece que o tema vem aglutinando discussões calorosas.

Segundo ele, espécies como o jaraqui, o “pão com manteiga”, a piabanha, o piau “cabeça gorda” e o surubim, no passado abundantes, agora estão cada vez mais raras. “Esses que citei estão praticamente extintos nos rios. A situação é crítica”, alerta Edvaldo.

De acordo o presidente, a falta de fiscalização efetiva ajuda a acentuar o problema ao longo do tempo. “Assim que acaba a Piracema, vai todo mundo para o rio, não só pescadores, mas também clandestinos. Isso está acabando com o nosso peixe”, adverte, cobrando uma fiscalização mais rígida por parte dos órgãos públicos responsáveis.

Apesar da escassez, os pescadores contam com o auxílio financeiro do governo federal por meio do seguro-defeso, que oferece um salário-mínimo mensal durante o período do Defeso (1º de novembro a 28 de fevereiro). No entanto, muitos enfrentam dificuldades para acessar o benefício.

O presidente destaca que o número de pescadores cadastrados na Colônia Z-30 chega a cerca de 700 pessoas, mas somente 300 atuam nos rios, devido à aposentadoria e irregularidades.

XÔ, MEXILHÃO DOURADO!

Outro ponto crítico, colocado em questão e mais temido pelos pescadores, é a presença do mexilhão-dourado, uma espécie invasora que vem se multiplicando desde o Lago de Tucuruí até a região de Marabá. O molusco já prejudica pescadores da região e preocupa o setor pesqueiro. “Já fizemos reuniões e solicitamos estudos para entender o impacto dessa espécie, mas ainda aguardamos resultados concretos”, relata Edvaldo.

ALTERNATIVA CHEIA DE CUSTOS

Enquanto a pesca enfrenta desafios, a piscicultura poderia ser uma alternativa viável. Contudo, o alto custo da ração e a falta de políticas públicas dificultam a implantação de mais criatórios.

“O pescador, muitas vezes, mora na cidade e não tem condições suficientes para criar peixes. Quem tem criatórios enfrenta dificuldades para mantê-los”, analisa Edvaldo Cruz. Ele também ressalta que os custos de produção inviabilizam a estabilidade financeira com a produção de peixes. “É algo bem longe da nossa realidade. O pescador pesca para viver”.

 

Feirantes atestam: maior parte do peixe vem de fora

O Correio de Carajás esteve na Feira Laranjeiras, no Núcleo Cidade Nova, e conversou com Lucídio Viana, peixeiro há vários anos. Ele comenta sobre os preços e a origem do pescado que comercializa. “O tambaqui nós vendemos a uma média de R$ 22 o quilo, limpo. O tucunaré, quando pode ser comercializado, sai a R$ 28 o pequeno e R$ 30 o grande. Já a tilápia é vendida pelo preço médio de R$ 25”, detalha.

Vendedor veterano, Lucídio Viana, destaca que por falta de algumas espécies de peixes na cidade, ele adquire de outros estados

O peixeiro relata que a escassez na região o obriga a comprar peixes de outras cidades ou estados. “Normalmente, eu compro os peixes aqui da região, dos próprios pescadores. Entretanto, há a escassez de tambaqui, porque aqui o que mais tem é tucunaré e pescada”, explica.

No município, as feiras locais se consolidam como o principal ponto de comercialização de pescado, com variedade de espécies e preços que diversificam conforme a procedência e o tipo de produção. Conversamos com feirantes da Feira Paulo Firmino de Souza (Folha 28, Nova Marabá) e Feira Dionor Maranhão (Laranjeiras), para entender como funciona esse mercado e o que atrai os consumidores.

Laudemir Oliveira, feirante da Folha 28, destaca as opções que oferece: caranha, tambaqui, tilápia e piabanha. A maioria deles vem de criatórios em Marabá e cidades vizinhas, como Dom Eliseu e Rondon do Pará”, explica.

Laudemir Oliveira diz que a Piracema o obriga a comprar peixes só de criatórios

Segundo ele, a preferência é comprar peixes de criatórios, pois em muita quantidade os preços ficam mais acessíveis. Ele ainda destaca o fator negativo dos rios: a piracema que impossibilita de comercializar espécies de peixes entre novembro e fevereiro.

Já Cleiton Gomes, também da Folha 28, revela uma dinâmica diferente: ele compra diretamente de fornecedores fixos. “Vendo tanto peixes de criatórios, quanto de rios, que vêm de Tucuruí. No caso do tambaqui, o preço varia de R$ 18,00 a R$ 22,00. Tenho também dourado, surubim, tilápia, pirarucu, salmão e tucunaré, que é um dos mais procurados depois do tambaqui”, detalha Gomes.

Cleiton Gomes revela que o peixe mais vendido é o tambaqui

Na Feira da Laranjeiras, Raimunda Rodrigues é quem conduz as vendas em sua barraca. Entre os produtos que oferece estão o surubim, o tucunaré e a piabanha. “Atualmente, o campeão de vendas aqui na minha barraca é o tucunaré”.  Ela diz que uma parte dos peixes vendidos é de Marabá, mas também há espécies de outros estados, como Mato Grosso e Maranhão.

Raimunda Rodrigues conta que compra peixes de criatórios do Mato Grosso e Maranhão
Queda na produção e futuro incerto da pesca

 

Por outro lado, se destaca a produção de peixes nos rios da região, que nitidamente, não é a mesma das décadas de 1980 e 1990. Segundo Edvaldo Cruz, presidente da Colônia de Pescadores Z-30, antigamente dois a três caminhões de peixes dos rios da região eram carregados diariamente. Hoje, é difícil encher um caminhão pequeno. “A maioria dos peixes vem de criatórios ou de outras cidades, como Santarém e Belém”, compara.

Apesar da redução na pesca, ele garante que não vê problema na comercialização de criatórios, o que segundo Edvaldo, faz a economia da cidade circular.

A redução de determinadas espécies nos rios faz os pescadores enfrentarem dificuldades financeiras, além de lidarem com ameaças de espécies invasoras, em contrapartida a psicultura surge como uma alternativa

O presidente da Z-30 cobra ações concretas para a preservação das espécies e melhorias nas condições de trabalho dos pescadores, enfatizando que é necessária mais fiscalização e incentivos econômicos para a criação de criatórios e agilidade no pagamento do seguro-defeso. Sem isso, a pesca em Marabá corre o risco de desaparecer.

A redução da atividade no município é reflexo de inúmeros fatores, entretanto, a falta de pescado ameaça à subsistência de centenas de famílias que dependem do rio e da venda de peixes para sobreviver.

(Milla Andrade)