Na data escolhida para ser um dia de luta contra a homofobia, organizações LGBT+ chamam atenção para a necessidade de maior representatividade dessa população nos espaços de poder, especialmente diante do cenário das eleições deste ano, quando serão renovados os parlamentos e os executivos estaduais e federal. A avaliação é que, apesar de as candidaturas terem ganhado força no último pleito, em 2020 elas ainda enfrentam obstáculos, deixando de fora dos espaços de decisão um segmento representativo da sociedade brasileira.
A data de 17 de maio de 1990 foi quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) retirou a homossexualidade da lista internacional de doenças, segundo a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde. Com isso, essa data tornou-se o Dia Internacional de Combate à Homofobia.
Para o integrante do grupo #VoteLGBT, Guilherme Mohallem, a data marca a união internacional em lutas de conscientização de questões ligadas à comunidade LGBT+. A organização busca aumentar a representatividade de pessoas LGBT+ em todos os espaços, principalmente na política. “Uma população que está, assim como pessoas negras e mulheres, alienada da participação política porque as regras são feitas para que a gente não consiga participar. Existe o problema de financiamento pelos partidos. E existe o problema de violência política, quando a pessoa é eleita”, disse Mohallem à Agência Brasil.
Leia mais:Representatividade nas eleições
Um levantamento realizado pela organização mostra que, nas eleições de 2020, foram identificadas 556 candidaturas LGBT+ na campanha, das quais 97 foram eleitas, 17% do total. Vale lembrar que a Justiça Eleitoral não coleta dados sobre a orientação sexual dos candidatos, dificultando um levantamento mais aprofundado.
O levantamento mostra ainda que as candidaturas de pessoas LGBTs recebem, em média, apenas 2% do teto de gastos de partidos políticos brasileiros, nas candidaturas em cidades com mais de 500 mil habitantes. Nas menores, os partidos destinam, em média, 6% da verba para essas candidaturas. O levantamento aponta para as inovações políticas apresentadas por representantes LGBT+ e, ao mesmo tempo, para os obstáculos enfrentados na sociedade e dentro das legendas.
“Nas últimas eleições, observamos o sucesso eleitoral das candidaturas LGBTs. Tivemos números recordes de candidaturas e de eleitos, mas todas essas vitórias estão sendo construídas em um contexto de muita luta e, muitas vezes, a despeito dos partidos políticos. As candidaturas ainda são subfinanciadas. Sem apoio financeiro, elas ainda sofrem com as suas reais chances de disputa em muitas cidades do país. Estamos em todos os lugares, mas estamos isolados”, afirmou a pesquisadora e integrante do #VoteLGBT Evorah Cardoso.
Para estas eleições, o #VoteLGBT montou uma plataforma para mapear as candidaturas da população.
A opinião é compartilhada pelo coordenador de comunicação da Aliança LGBTI, Gregory Rodrigues que também atua na promoção e na defesa dos direitos humanos e da cidadania da comunidade LGBTI+. Entre as ações, a Aliança também inclui uma para incentivar a ampliação do número de candidatos LGBTI nos espaços de decisão política.
“A população LGBTI não pode ser apenas uma população utilizada como palanque de candidaturas aliadas. Além das pessoas aliadas precisamos ocupar esses espaços. Precisamos ser vistos por nossas qualidades”, afirmou.
A Aliança coordena o programa Voto Com Orgulho, lançado em parceria com o Grupo Arco-Íris de Cidadania LGBTI+, do Rio de Janeiro e o Grupo Dignidade, do Paraná e que além da plataforma para mapear essas candidaturas também quer oferecer formação para os possíveis candidatos.
Até o momento, foram registradas 74 pessoas pré-candidatas de pessoas LGBTI+ e aliadas. A maior parte, no estado de São Paulo, com 11. Em seguida vêm Minas, com 10. Os estados de Rio de Janeiro e Santa Catarina aparecem com nove. A seguir vêm o estado de Goiás com sete pré-candidaturas e Bahia com quatro. Das 74 pré-candidaturas, 52 são para deputada/o federal e 21 para estadual e uma para deputado distrital.
“Precisamos saber quantos nós somos e, como somos poucos, essas formações prática servem para incentivar essas pessoas, buscar formas de apoio para que essas pré-candidaturas, para se tornarem candidaturas efetivas e tenham apoio dos partidos de forma efetiva. Tudo isso para haver a possibilidade do aumento de representatividade dessa classe invisibilizada no nosso cenário político”, opinou.
Justiça
Na avaliação do Rodrigues, os poucos avanços na pauta LGBTI foram conquistados por meio de ações judiciais, tendo o Parlamento quase nenhum protagonismo na questão. A decisão recente mais significativa foi tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 13 de junho de 2019, quando reconheceu a LGBTfobia como crime de racismo.
LGBTfobia é a terminologia usada para abarcar todas as formas de violência contra pessoas LGBTI+ em que a motivação principal é sua identidade de gênero e/ou orientação sexual. Na ocasião, a corte apontou ainda a demora do Congresso Nacional em elaborar uma lei sobre o tema.
“Neste cenário atual, a gente não pode falar de avanços, estamos lutando para não haver retrocessos. O Judiciário brasileiro é o responsável pela garantia dos direitos que temos hoje. A adoção, a doação de sangue, o casamento homoafetivo, a criminalização da LGBTfobia. E isso graças à inércia do Parlamento”, afirmou Rodrigues.
Mohallem lembra que, como boa parte dos direitos foram conseguidos no Judiciário, eles ficam sujeitos à possibilidade de retrocesso com mudanças no entendimento firmado pelas cortes e que a presença de pessoas LGBTI+ na política assegura ainda mais a diversidade de representação no Parlamento para conseguir a criação de leis voltadas para esse público.
“Se nós estivermos presentes nos debates das construções dessas leis, a gente pode não só criar leis para necessidades específicas dessa população, como incluir em leis que já estão sendo feitas, mas que simplesmente ignoram nossa existência”, afirmou.
(Agência Brasil)