Deflagrada nesta terça-feira (10), a Operação Mapa da Mina tem como objetivo aprofundar as investigações sobre o pagamento de despesas da família do ex-presidente Lula (2003-2010) com recursos das empresas de telefonia Oi e da Vivo.
A Polícia Federal suspeita que o dinheiro tenha sido repassado de 2004 a 2016 por meio das empresas de Jonas Suassuna, dono do Grupo Gol (que atua nas áreas editorial e de tecnologia e não tem relação com a companhia aérea de mesmo nome). Ele foi sócio do filho de Lula, Fábio Luís, em diversas empresas.
Os principais indícios em apuração pela PF foram revelados numa série de reportagens publicadas pela Folha em outubro de 2017.
Leia mais:Elas mostravam indícios de acordos superfaturados entre a Oi e o Grupo Gol, bem como acordos envolvendo a prefeitura e o governo do Rio de Janeiro que beneficiaram empresas de Suassuna. Em entrevista à Folha, um ex-executivo das firmas afirmou que o conglomerado era usado como fachada para repassar dinheiro ao filho do ex-presidente.
A PF solicitou a prisão de Lulinha, citando a necessidade de impedir “nova ação imediata” dos envolvidos. Argumentou que os investigados tiveram possibilidade de atuar contra a 24ª fase da Lava Jato, deflagrada em 2016, e apontou que a prisão poderia servir como forma de “minimizar o risco de prévio de acerto de versões e pressões por influência política”.
Em manifestação, o MPF se posicionou contrariamente à prisão, que foi negada pela juíza Gabriela Hardt.
Em que se baseia a operação da PF?
A ação envolveu 47 mandados de busca e apreensão, com nove pessoas físicas e 21 empresas como alvos. O objetivo foi aprofundar as investigações sobre o uso de firmas de Fábio Luís, o Lulinha, e do empresário Jonas Suassuna para o pagamento de despesas pessoais da família do ex-presidente Lula. A origem desses recursos, aponta a investigação, foram as empresas de telefonia Oi e Vivo.
Outros mandados de busca dessa fase da investigação têm como objetivo apurar possíveis irregularidades no relacionamento entre o Grupo Gol, de Suassuna, com a Vivo/Telefônica.
Qual a suspeita dos investigadores?
A Polícia Federal e a Procuradoria suspeitam que diversos repasses feitos pela Oi e pela Vivo a empresas ligadas a Lulinha foram realizados sem lógica econômica, apenas para beneficiar familiares de Lula. Contratos comerciais de fachada teriam sido firmados para dar aparência legal às transferências.
Quais as evidências que sustentam essa versão?
Os investigadores apontam como evidência o fato de que vários produtos não obtiveram resultado comercial relevante. Um dos exemplos é a “Bíblia na Voz de Cid Moreira”. A Oi teve uma receita de R$ 21 mil com a comercialização do produto, mas repassou R$ 16 milhões à Goal Discos, de João Suassuna, pelo serviço.
Quanto foi repassado e qual o período investigado?
De 2004 a 2014, a Oi repassou a empresas de Lulinha e Suassuna R$ 198 milhões, e a Vivo, cerca R$ 40 milhões. Lula foi presidente de 2003 a 2010.
Lula ou sua família foram alvos diretos da operação desta terça?
Não houve mandado de busca em endereços de Fábio Luís, apenas em empresas que seriam ligadas a ele, segundo o Ministério Público Federal.
Quem é Jonas Suassuna e qual é sua ligação com Lula e seu filho?
Suassuna se tornou sócio de Lulinha em 2006 na Gamecorp, empresa de games que já havia recebido aporte da Oi considerado suspeito pela PF.
O Grupo Gol (que atua nas áreas editorial e de tecnologia e não tem relação com a companhia aérea de mesmo nome), criado por ele, também recebeu R$ 66 milhões da Oi entre 2008 e 2014, grande parte por serviços considerados superfaturados.
E com o sítio de Atibaia?
Suassuna é dono de um dos dois terrenos que compõem o sítio em Atibaia (SP) frequentado por Lula.
Por que Lula foi condenado no caso do sítio e por quais crimes?
Para a Justiça, Lula recebeu vantagens indevidas das empreiteiras Odebrecht e OAS em troca de favorecimento em contratos da Petrobras.
Segundo a acusação, reformas e benfeitorias realizadas pelas construtoras no sítio configuraram a prática dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Em novembro, a condenação foi confirmada em segunda instância, e a pena fixada em 17 anos e 1 mês de prisão. A defesa recorre.
Essa ação penal refere-se apenas à reforma do sítio, que foi realizada na área que não pertence a Suassuna. Por isso, ele não foi denunciado nesse caso.
Quanto Suassuna pagou pelo sítio?
Ele pagou R$ 1 milhão pelo terreno sem benfeitorias. O outro imóvel, adquirido por Fernando Bittar (filho de Jacó Bittar, amigo de Lula que atuou na fundação do PT), foi adquirido por R$ 500 mil. Os dois terrenos foram comprados porque o vendedor só aceitava se desfazer dos dois juntos.
Qual a relação entre o sítio e o esquema com a Oi?
O MPF aponta que Jonas Suassuna e Fernando Bittar adquiriram a propriedade usando parte de recursos injustificados das empresas que administravam em conjunto com Fábio. Kalil Bittar, irmão de Fernando, também é alvo das investigações.
Há suspeitas sobre operações envolvendo outros imóveis?
Suassuna pagou por um período um aluguel de R$ 7.000 por um imóvel ocupado por Lulinha. Depois gastou R$ 4,2 milhões na compra e reforma de um apartamento de luxo em São Paulo para, em seguida, alugá-lo para Fábio Luís.
Ele disse ter cobrado R$ 15 mil por esse imóvel. A PF afirma que o valor da operação no mercado é de R$ 40 mil por mês e diz que identificou apenas 13 dos 28 depósitos referente ao período em que Lulinha lá esteve.
Por que a Oi repassou todo esse valor, segundo a PF?
A PF e a Procuradoria vinculam o período em que os repasses às empresas de Suassuna são feitos (2008 a 2014) com mudanças societárias na empresa de telefonia que, de uma forma ou de outra, dependiam de decisões políticas ao alcance de Lula.
Quais foram as decisões que beneficiaram a empresa?
A legislação proibia que uma empresa de telefonia fixa comprasse outra em área diferente, o que impedia a compra da Oi pela Brasil Telecom. A alteração na norma era discutida pela Anatel e se tornou viável após Lula assinar um decreto que pôs fim à proibição.
Entre 2011 e 2013, também foi discutida a expansão internacional da Oi nos países de língua portuguesa a partir da fusão e incorporação da dívida da Portugal Telecom. Essa operação dependia de aprovação de fundos de pensão de empresas estatais, controlados por pessoas ligadas ao governo petista, que tinham participação societária na Oi.
E a Vivo?
A Vivo contratou o serviço chamado Nuvem de Livros —uma espécie de streaming de livros— garantindo um repasse de R$ 40 milhões entre 2011 e 2016. O Ministério Público Federal afirma haver indícios de que o repasse não é condizente com o resultado comercial do produto para a Vivo. O negócio saiu do papel cinco meses após encontro de Lula com executivos espanhóis da Telefônica, dona da operadora brasileira, como revelou a Folha há dois anos.
O que dizem as defesas de Lula, Lulinha e Suassuna?
O ex-presidente Lula afirmou, pelo Twitter, que a operação desta terça é uma “demonstração pirotécnica de procuradores viciados em holofotes”. O petista diz ainda que o Ministério Público Federal recorre a “malabarismos” para o atingir, perseguindo sua família.
Lulinha ainda não constituiu advogado no processo desta fase da Lava Jato. A assessoria da defesa de Lula foi questionada pela Folha, mas não soube informar quem seria defensor do filho dele. A Folha não conseguiu contato com o empresário Jonas Suassuna.
Há outros petistas envolvidos?
Os procuradores também suspeitam da atuação do petista José Dirceu, enquanto ministro da Casa Civil de Lula, em favor da empresa. Eles indicam que, de 2009 a 2014, a Oi transferiu cerca de R$ 10 milhões para uma empresa e um escritório de advocacia ligados ao petista, sem contrapartida. Além disso, teria arcado com despesas pessoais de Dirceu e seus familiares no período.
A defesa do ex-ministro afirmou que todos os recebimentos dele já foram alvos de investigação, “portanto qualquer nova acusação é pura invencionice”.
Quando surgiram suspeitas sobre Lulinha?
Reportagens da Folha de outubro de 2017 mostravam indícios de acordos superfaturados entre a Oi e o Grupo Gol, bem como acordos envolvendo a prefeitura e o governo do Rio de Janeiro que beneficiaram empresas de Suassuna. Em entrevista à Folha, um ex-executivo das firmas afirmou que o conglomerado era usado como fachada para repassar dinheiro ao filho do ex-presidente.
Por que a investigação ficou com a Lava Jato de Curitiba?
O fato de Suassuna supostamente ter usado dinheiro repassado pela Oi na compra do sítio usado por Lula fez com que o processo permanecesse sob responsabilidade da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Os procuradores argumentam que, como a ação penal sobre as reformas do sítio tramitou em Curitiba, as duas investigações devem caminhar juntas. As provas dos dois casos também são conexas, o que impediria uma divisão.
A defesa do ex-presidente questiona na Justiça o vínculo feito pelo ex-juiz Sergio Moro do caso do sítio com as propinas da Petrobras, que fez com que a ação tramitasse na Justiça Federal do Paraná.
Por que essa operação acontece agora?
Os procuradores disseram que as provas foram coletadas em diferentes fases da Lava Jato e que o esquema investigado é complexo, demandando tempo para sua construção.
A Polícia Federal pediu as buscas e a prisão de Lulinha em junho de 2018. A Procuradoria solicitou novos prazos sucessivos, tendo apresentado sua posição apenas em agosto deste ano. A autorização para a operação foi dada pela juíza Gabriela Hardt em setembro, mas ajustes nos endereços alvos foram feitos até o fim de novembro.
O pedido de prisão, porém, foi negado.
Qual a situação do sítio atualmente?
Os dois imóveis foram comprados por R$ 1,5 milhão em outubro de 2010, sendo que a parte de Suassuna custou R$ 1 milhão.
Até setembro deste ano, parte do imóvel estava bloqueada no cartório por um processo de execução fiscal contra Suassuna no RJ. Ele conseguiu reverter a decisão.
Quanto à outra parte, a Justiça autorizou a venda, mas determinou que parte do valor eventualmente obtido seja depositado em uma conta judicial e fique bloqueado até o fim do caso.
Quais são os principais pontos da defesa de Lula para alegar inocência no caso do sítio?
A defesa de Lula alega que ele não teve direito a um processo justo pois a maior parte da causa foi conduzida pelo ex-juiz e atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, que, para os advogados, não agiu com imparcialidade durante a investigação e a ação penal do caso.
Outra alegação é que não há provas de que Lula atuou para beneficiar a Odebrecht e a OAS em contratos da Petrobras, ou seja, não estaria comprovada qualquer contrapartida do líder petista em favor das companhias.
Quais as evidências contra o ex-presidente?
As empresas Odebrecht e OAS realizaram reformas e benfeitorias no sítio que foi frequentado pelo ex-presidente e sua família. O executivo da OAS Léo Pinheiro disse em juízo que as obras bancadas pela construtora no local constituíram uma retribuição a Lula após favorecimento em contratos da Petrobras.
Por que o caso do sítio ficou com a Lava Jato de Curitiba?
Todos os casos da Lava Jato ligados a contratos da Petrobras tramitam na 13ª Vara Federal de Curitiba, segundo decisão do STF. Como a Procuradoria alegou que as reformas no sítio ocorreram após beneficiamento ilegal em licitações da estatal , o caso ficou na capital paranaense. (Folha de São Paulo)