A Coluna de hoje traz de volta a personagem feminina mais famosa da Literatura Francesa, a mais polêmica, a precursora do adultério feminino na Literatura: Emma Bovary, e o clássico dos clássicos Madame Bovary (1857), de Gustave Flaubert. A obra literária já teve mais de quinze adaptações para cinema mundial.
EMMA foi a fonte de inspiração para musas do adultério como Anna Karenina no romance homônimo, de Liev Tolstói (1875-1877); Luísa em O Primo Basílio (1878), de Eça de Queirós; e a ambígua Capitu em Dom Casmurro (1899), de Machado de Assis. As referidas obras não compartilham apenas a temática, mas também o protagonismo feminino e o fato de todas terem sido escritas no fim do século XIX, após o avassalador sucesso do livro de Gustave Flaubert.
Apesar Madame Bovary ter sido publicado no fim do século XIX, a personagem de Flaubert poderia ser uma mulher do século XXI, pois EMMA deu vazão ao desejo feminino. Aquela jovem leitora romântica, residente no interior da França, entediada com a rotina do casamento, “A mediocridade doméstica arrojava-a a fantasias custosas, a ternura matrimonial a desejos adúlteros”, buscou satisfazer os seus anseios por meio de casos extraconjugais, se endividou para custear seus pequenos prazeres e agradar seus amantes. EMMA, embora vivendo numa sociedade católica, moralista e patriarcal, vai em busca de aventura e paixão, da vida que ela via nos romances românticos, dos quais era ávida leitora. Eis a sua visão idealizada do amor: “O amor, no seu entender, devia surgir de repente, com ruídos e fulgurações, tempestade dos céus que cai sobre a vida e resolve, arranca a vontade como folhas e arrebata para o abismo o coração inteiro.”
Leia mais:Uma jovem intensa que quer mais do que aquilo que a sua vida burguesa tinha para lhe proporcionar, mais do que lhe fora destinado: um casamento com um homem inexpressivo, de temperamento simples; uma casa na província sem ostentação e luxo. É em busca do que ela não tem que ela contrai dívidas e arruma amantes. Emma não considera sua condição de mulher um obstáculo para satisfação de seus desejos.
A composição desta mulher demorou cinco longos anos. Flaubert a cria de forma singular e original. EMMA foge dos modelos de heroínas românticas que se tinha até então. Flaubert revoluciona a Literatura; sua protagonista é a mulher caçadora, ela busca seus amantes, os escolhe, ainda que depois seja abandonada por eles e ainda cheia de dívidas.
Uma mulher ousada que elevou o seu desejo a um nível somente visto nos personagens masculinos. Por isso, Emma é vanguardista; ela está realmente além de seu tempo. Imagine uma moça educada em um convento, sob uma moral católica, que ao casar não se satisfaz com o marido, com a casa, nem mesmo a maternidade preenche sua insatisfação. Ouso dizer que a maternidade se torna um obstáculo aos desejos de EMMA.
Quanto à maternidade, ela queria um menino e esse desejo era o reflexo de seu anseio por liberdade: “Desejava que fosse um menino; havia de ser forte e moreno e chamar-se Jorge, esta ideia de ter um filho varão era como que uma desforra, em esperança, de todas as suas impotências passadas. Um homem, ao menos, é livre, pode percorrer as paixões e os países, saltar obstáculos e gozar de prazeres mais raros. Uma mulher anda continuamente rodeada de empecilhos de empecilhos”. A partir deste pequeno relato, fruto do narrador onisciente que conhece os pensamentos, os sentimentos e intenções mais íntimas de Emma, tem-se revelado uma eloquente voz feminina que, ainda no século XIX, vê que o mundo é mais difícil para nós mulheres. Ela queria ser livre para mudar seu destino.
Mais uma vez convido você a ler Madame Bovary, a mulher que escandalizou a sociedade francesa da segunda metade do século XIX. A personagem que representa uma crítica aos leitores e ao estilo romântico; o livro que é o marco inicial da Literatura Realista. A mulher responsável pelo julgamento do seu criador e editor, acusados por atentado contra a moral e aos bons costumes. Encerro deixando a seguinte pergunta: qual sua adúltera da Literatura preferida? Até a próxima!
* A autora é graduada em Letras pela UFPA; bacharela em Direito pela Unifesspa e leitora voraz, por amor e vocação.
Observação: As opiniões contidas nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do CORREIO DE CARAJÁS.
