Correio de Carajás

É falso tuíte afirmando que Pazuello viajou para os EUA com passaporte diplomático

Falso
É falso o tuíte que afirma que o general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, tenha recebido um passaporte diplomático do governo federal e viajado para os Estados Unidos, sem data para voltar. O post usava o nome e o logotipo do site de notícias G1 e foi criado por um perfil já verificado por outras agências de checagem. Logo após tentativa de contato do Comprova, o perfil bloqueou os conteúdos. O Exército confirmou que Pazuello não tem viagem programada.
Conteúdo verificado: Post no Twitter, usando logotipo e nome do G1, afirma que o Itamaraty teria concedido passaporte diplomático para Pazuello viajar aos EUA e que o ex-ministro não teria data definida para retorno.

É falso o tuíte do dia 10 de maio que afirma que o general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, teria recebido um passaporte diplomático do governo federal e viajado para os Estados Unidos, sem data para voltar.

A publicação afirmava, erroneamente “#URGENTE – Itamaraty concede passaporte diplomático e Pazuello viaja para os EUA. Assessoria do ex-ministro informa que ‘não há data definida para retorno’”. Nela, havia um link para uma reportagem, de fato, do G1, mas que nada tinha a ver com uma possível saída do país do ex-ministro da Saúde – era sobre o vice-presidente, Hamilton Mourão, dizendo que ter Pazuello como ministro foi “uma decisão de risco”.

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Outro indício de que a informação era falsa é que o perfil usava o nome e o logotipo do site de notícias G1, da Globo, no post. Contudo, o nome de usuário, precedido pela @, evidenciava não se tratar do perfil oficial do portal de notícias da Globo, que no Twitter tem G1 tanto no nome do perfil, quanto no de usuário, além do selo de conta verificada.

Contatado pelo Comprova, o Exército confirmou que “não solicitou passaporte diplomático e não recebeu qualquer comunicação de viagem do militar citado na matéria” e informou também que “não há previsão de viagem oficial do militar”.

O Comprova tentou contatar o autor do post, mas não recebeu resposta até a publicação deste texto.

Como verificamos?

Para verificar o conteúdo, o Comprova clicou no link colocado no post e logo percebeu que era um conteúdo suspeito, pois ele levava a uma matéria que tratava de outro assunto. Também percebeu que, embora o nome e o logotipo fossem do site G1, a “@” usada pelo perfil não era a do portal e, na definição no campo da biografia, havia apenas a palavra “paródia”.

Mesmo assim, a equipe tentou contato no dia 10, com o perfil, enviando uma mensagem direta via Twitter. A página bloqueou o conteúdo minutos depois. O dono do perfil não respondeu à reportagem até a publicação deste texto.

O Comprova conversou, por telefone e e-mail, com o Ministério da Saúde, que respondeu que a equipe deveria contatar o Exército. Por e-mail, a instituição respondeu confirmando que não há previsão de Pazuello viajar.

Também verificamos informações sobre como funciona a emissão do passaporte diplomático, com base no que diz o decreto federal número 5.978, de 4 de dezembro de 2006. O dispositivo versa sobre a emissão de cinco tipos de passaporte, entre eles o diplomático.

Ex-ministros de Estado não estão entre os possíveis contemplados com o documento especial de viagem. Pazuello pode receber o passaporte diplomático desde que o Itamaraty considere que ele representa algum interesse do país. A pasta não respondeu às tentativas de contato do Projeto Comprova.

Verificação

O post

Embora utilize o logo e o nome do G1, o perfil do Twitter que fez a publicação não tem ligação oficial com o veículo. Além disso, o link para o qual o post leva, do portal do grupo Globo, é sobre outro assunto, uma reportagem intitulada “‘Pazuello como ministro da Saúde foi uma decisão de risco’, diz Mourão”, que nada aborda sobre o ex-ministro da Saúde ter recebido passaporte diplomático.

Ao afirmar que “Itamaraty concede passaporte diplomático e Pazuello viaja para os EUA” e que “assessoria do ex-ministro informa que ‘não há data definida para retorno’”, o post poderia estar insinuando que Pazuello iria deixar o Brasil para não depor na CPI da Covid, uma vez que, na semana passada, ele alegou contato com servidores infectados pelo coronavírus para adiar seu comparecimento. A nova convocação está marcada para 19 de maio.

O Comprova contatou, por e-mail, o Exército, que afirmou não ter solicitado a emissão de passaporte diplomático para o general, ou recebido “qualquer comunicação de viagem do militar citado na matéria”. Acrescentou ainda que “não há previsão de viagem oficial do militar”.

A página

O perfil @cotore entrou no Twitter em agosto de 2018 e, na tarde desta segunda-feira (10), no campo de descrição sobre a página havia apenas a palavra “paródia”.

Além de se identificar com o logotipo e o nome do site de notícias G1, o perfil colocou um símbolo ao lado do nome para parecer um perfil verificado pelo Twitter, mas, já em uma análise superficial, é possível perceber que é um símbolo diferente – inclusive, com a cor, preta, e não azul, como é a oficial dessa rede social.

Às 17h30 de segunda, o Comprova enviou uma mensagem pessoal para o perfil, pedindo entrevista. Oito minutos depois, a página tuitou “Imagina os verificandinhos p* da vida no grupo do zap mandando o amigo da agência de checagem vir encher meu saco”, referindo-se aos jornalistas que trabalham em agências de verificação.

Por volta das 18h, o perfil mudou a foto para uma imagem de um palhaço e, o nome, para hmm. Também fechou o perfil, permitindo a visualização dos posts apenas para seguidores aprovados.

Em junho do ano passado, o mesmo perfil se passou por Donald Trump, usando a foto e o nome do então presidente dos Estados Unidos. No post, o falso Trump chamava o presidente do Brasil de Javier Bolsonaro e criticava-o em relação à gestão da pandemia. O post foi verificado como falso pela agência Lupa e o Boatos.org

Passaporte diplomático

Ele é um dos cinco tipos de documentos de viagem oferecidos pelo Governo Federal. Os outros são o comum, o oficial, para estrangeiros e de emergência. Segundo o decreto número 5.978, de 4 de dezembro de 2006, passaportes diplomáticos são emitidos pelo Ministério das Relações Exteriores.

A Seção I do decreto indica que esta modalidade de passaporte é concedida ao presidente da República, ao vice-presidente e aos ex-presidentes da República. Ministros de Estado, ocupantes de cargos de “natureza especial” e titulares de secretarias vinculadas à Presidência da República, além de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), também estão entre os contemplados.

Ex-ministros não são citados nos incisos do decreto. Em 20 de junho de 2020, por exemplo, Abraham Weintraub entrou nos Estados Unidos durante período de restrições ao ingresso de brasileiros naquela nação, uma das formas de combate à disseminação da covid-19.

A entrada foi possível porque Weintraub ainda estava na condição de titular da Educação. A exoneração dele foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) somente quando o governo brasileiro recebeu a informação de que havia aterrissado no país.

Além do passaporte diplomático, Weintraub não apresentou problemas de saúde, condição que favoreceu sua permanência no país.

Há no decreto 5.978 uma brecha por meio da qual é possível inserir pessoas que não ocupam cargos na administração pública, contida no inciso terceiro do artigo 6º. O trecho diz: “Mediante autorização do Ministro de Estado das Relações Exteriores, conceder-se-á passaporte diplomático às pessoas que, embora não relacionadas nos incisos deste artigo, devam portá-lo em função do interesse do País.”

Diferentemente dos critérios objetivos relacionados à ocupação de cargos públicos, “interesse do País” é subjetivo. Ou seja, uma pessoa pode ganhar o passaporte diplomático a partir do que o chanceler do momento considere relevante para o País.

Com base neste trecho, líderes religiosos já obtiveram passaportes diplomáticos. A prática vem desde o governo Lula (PT) e permanece sob a administração de Jair Bolsonaro (sem partido).

O Projeto Comprova entrou em contato com o Itamaraty às 18h28min de segunda-feira, 10. Por e-mail, a reportagem indagou a pasta sobre veracidade do post da conta intitulada “@cotore”. Também foi questionado se Pazuello já teve passaporte diplomático e se ainda o possui. O Comprova obteve somente um retorno automático informando que a mensagem foi recebida e que seria respondida com a “brevidade possível”.

O Projeto Comprova ainda enviou outro e-mail, no sentido de reforçar o que havia sido enviado inicialmente e cobrar uma resposta. A reportagem não obteve retorno efetivo até a tarde desta terça-feira, 11.

Por que investigamos?

Em sua 4ª fase, o Comprova verifica conteúdos de redes sociais ligados à pandemia e a ações do governo federal. Priorizamos informações suspeitas que têm grande alcance, caso do post analisado nesta checagem.

Em um período em que Eduardo Pazuello é foco de notícias por não ter comparecido à primeira audiência da CPI da Covid a que foi convocado e ser esperado para o dia 19 de maio, o tuíte, tentando se passar por um veículo de jornalismo, tenta enganar usuários do Twitter inventando que o ex-ministro estaria nos Estados Unidos –e, como tenta insinuar, faltaria à nova convocação da CPI.

Apesar de o perfil ter a palavra “paródia” no espaço da biografia no Twitter, o post não pode ser categorizado como “sátira” – uma das etiquetas do Comprova – uma vez que a página se apropriou do nome e do logo do G1, tentando se passar pelo veículo. Dessa forma, o post, que foi compartilhado ao menos 1,2 mil vezes na rede, é falso.

A mesma categorização foi usada pela agência Lupa e pelo Boatos.org em verificações do ano passado que envolviam o mesmo perfil, como escrito anteriormente.

Falso, para o Comprova, é qualquer conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Desde 2020 o Correio de Carajás integra o Projeto Comprova, que reúne jornalistas de 28 diferentes veículos de comunicação brasileiros para descobrir e investigar informações enganosas, inventadas e deliberadamente falsas sobre políticas públicas e a pandemia de covid-19 compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.