Um dia sem comer carne: esta é a proposta do “MeatOut Day” ou Dia Mundial sem Carne, datado nesta quinta-feira (20). Mas não só isso. Trazer luz ao debate sobre o sofrimento animal, prejuízos ambientais e sociais da indústria da carne e a adoção de hábitos mais saudáveis e sustentáveis também são objetivos do movimento que surgiu na década de 1980, nos Estados Unidos (saiba mais abaixo).
No Brasil, cerca de 30 milhões de brasileiros são vegetarianos, segundo pesquisa de 2018 do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope). Já no Distrito Federal, 38,3% da população tenta evitar ou reduzir o consumo de carne, aponta pesquisa de 2023 do Observatório de Políticas Públicas da Universidade de Brasília (UnB).
Neste Dia Mundial sem Carne, o g1 mostra o que dizem uma vegetariana e um vegano sobre o cotidiano e a motivação da escolha, além de um economista e um nutricionista.
Leia mais:Vegetariana desde os 12 anos
Uma das 30 milhões de pessoas que optou por não comer carne no Brasil é a psicóloga Clarisse Costa, de 25 anos, moradora do Sudoeste, no Distrito Federal. Há 13 anos, a jovem é vegetariana, muito por influência da família – mãe, tio e avós não consomem carne – mas também por uma escolha individual.
“!Eu nunca fui obrigada a ser vegetariana. Vegetarianismo foi uma escolha quando eu comecei a minha adolescência, e foi gradual. Então, eu primeiro deixei de comer carne vermelha, depois carne branca, até me tornar vegetariana totalmente”, diz Clarisse.
A jovem, que está há mais de uma década sem ingerir carne, afirma que houve avanços nos últimos anos em relação ao mercado de alimentação vegana e vegetariana, no entanto, muitos restaurantes ainda colocam como opção sem carne no cardápio somente a salada.
De acordo com pesquisa de 2024 da consultoria SkyQuest, o mercado global de alimentos veganos foi avaliado em US$ 20,77 bilhões em 2021 e, até 2030, deve alcançar os US$ 36,3 bilhões.
Para Clarisse, o prato preferido é o hambúrguer vegetariano feito de feijão ou lentilha ou grão de bico. “Sendo vegetariana, eu aprendi que não é só tirar a carne, mas é estar sempre atento não só às proteínas, mas a todos os nutrientes necessários que seu corpo exige”, conta a psicóloga que não dispensa um prato com muitos grãos, proteína de soja, batatinha, macarrão e salada.
O vegetarianismo, para Clarisse, foi uma escolha perpassada por dois movimentos: de afeto e político, e uma das consequências da opção foi entender melhor a intenção por trás do seu próprio consumo, seja de alimentos ou não.
“Sou muito feliz em ser vegetariana, é um movimento de afeto comigo mesma, com as minhas relações e com a relação que eu tenho com o mundo. […] O vegetarianismo é também uma escolha política, entendendo que pode até ser uma opção individual, mas eu acredito que tem motivações coletivas e comunitárias”, diz a jovem.
‘Não existe planeta B’
O guatemalteco e morador da Asa Sul, no DF, Fernando Hernández, explica que a decisão pelo veganismo, feita há 4 anos, foi motivada por perceber os impactos que a indústria da carne tem no meio ambiente e na sociedade.
“No primeiro momento, iniciei esse processo por perceber a grande quantidade de água utilizada pelas grandes indústrias para produzir somente 1kg de carne, logo também por observar como várias comunidades indígenas e quilombolas são expulsas das suas terras para que no lugar seja colocado gado e/ou soja. Além disso, e principalmente, a causa da libertação animal e a contaminação ambiental, inclusive dos oceanos”, diz Fernando.
Para produzir 1kg de carne de boi, são gastos cerca de 15,5 mil litros de água, de acordo com a Embrapa. Com essa informação em mente, o jovem, de 27 anos, que é analista de redes, conta que o maior desafio no início da adaptação foi reaprender a cozinhar, além de verificar quais produtos de higiene e limpeza não são testados em animais.
Fernando conta que adora almoçar um prato com arroz, feijão, strogonoff de grão de bico com batata palha, abóbora e folha de mostarda refogada, mas suas comidas preferidas são moqueca de banana da terra e cuscuz. Além de contribuir com o bem-estar físico e mental, o jovem acredita que optar por uma vida sem carne é uma das formas de garantir um mundo sem exploração.
“Eu acredito que o veganismo é um movimento político que luta pela libertação animal, pelo fim da exploração de todos os animais, contra a destruição da natureza e também a favor da soberania alimentar, pois é importante que todas as pessoas possam escolher e ter o que comer. […] É preciso ir além, pois o veganismo é uma das pautas urgentes da atualidade, e não existe planeta B”, afirma o jovem.
De acordo com o Mapa Veg – iniciativa online que realiza um censo de vegetarianos e veganos no país por meio do cadastro no site – o DF ocupa a 7ª posição no Brasil com o mais pessoas que não consomem carne:
- 1º São Paulo🥦
- 2º Rio de Janeiro 🥬
- 3º Rio Grande do Sul 🌽
- 4º Minas Gerais 🫑
- 5º Paraná 🥕
- 6º Santa Catarina 🫛
- 7º Distrito Federal 🌱
O que é o Dia Mundial sem Carne
O “MeatOut Day” ou Dia Mundial sem Carne foi criado em 1985, nos Estados Unidos, por movimentos ambientalistas e de proteção animal e em protesto à proclamação da Semana Nacional da Carne por uma resolução do Senado dos EUA.
A data busca promover uma conversa questionando o consumo de produtos de origem animal em todo o mundo. O dia 20 de março, primeiro dia da primavera do hemisfério norte, foi escolhido como um símbolo de renovação e de virar uma nova página, como incentivo para as pessoas iniciarem a jornada pelo vegetarianismo.
Consumo de carne no Brasil
De acordo com dados de 2020 da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), o Brasil era o quinto país com maior consumo de carne per capita anual no mundo:
- 5º Brasil: 107 kg por ano por pessoa🍖
- 4º Argentina: 117 kg por ano por pessoa 🍖
- 3º Espanha: 141 kg por ano por pessoa 🍖
- 2º Portugal: 149 kg por ano por pessoa 🍖
- 1º Estados Unidos: 149 kg por ano por pessoa 🍖
Já a The Good Food Institute Brasil (GFI Brasil), aponta que 67% dos brasileiros diminuíram o seu consumo de carne (bovina, suína, aves e peixes) em 2022.
O professor da Pós-Graduação de Economia da Universidade Católica de Brasília, Rafael Ferraz, afirma que o consumo de carne no Brasil caiu de 2020 a 2022 por conta do aumento dos preços do alimento.
“No período da pandemia e pós, houve um aumento muito grande no preço da carne em relação ao poder de compra do brasileiro, ou seja, os salários não aumentaram, mas os preços sim”, diz o economista.
De acordo com a pesquisa da GFI Brasil, a redução do consumo de carne ocorreu por dois motivos:
- Aumento do preço da carne: 45%
- Escolha própria – por motivos de saúde, preocupação com animais ou com o meio ambiente, motivos religiosos ou influência de familiares: 52%
Veganismo e Vegetarianismo
A Sociedade Vegetariana Brasileira diferencia os dois conceitos por conta de um ser um estilo de vida e o outro exercer mais influência na alimentação, no entano, o veganismo é um tipo de vegetarianismo:
- Veganismo: movimento que busca, na medida do possível e do praticável, excluir todas as formas de exploração e crueldade contra os animais – seja na alimentação, no vestuário ou outras esferas do consumo.
- Vegetarianismo: escolha alimentar na qual se tira os produtos de origem animal do prato.
No entanto, de acordo com a Sociedade Vegetariana Brasileira, há alguns tipos de vegetarianismo:
- Ovolactovegetarianismo: alimentação que não inclui nenhum tipo de carne e pode incluir ovos, leite e laticínios.
- Lactovegetarianismo: alimentação que não inclui nenhum tipo de carne e pode incluir leite e laticínios.
- Ovovegetarianismo: alimentação que não inclui nenhum tipo de carne e pode incluir ovos.
- Vegetarianismo estrito: alimentação que não inclui nenhum produto de origem animal.
- Alimentação vegana: alimentação que não inclui nenhum tipo de produto/insumo de origem animal e nenhum deles poderá ter sido testado em animais.
- Alimentação Plant Based: alimentação que não utiliza nenhum produto de origem animal (é 100% vegetal) e prioriza os alimentos mais naturais e íntegros (também conhecida como whole food plant based dieta) evitando o consumo de alimentos refinados e processados.
- Flexitarianismo: Alimentação que propõe a redução do consumo de alimentos de origem animal priorizando os vegetais na rotina alimentar.
Quer começar?
O professor de Nutrição da Universidade Católica de Brasília, Guilherme Falcão, explica que o consumo exagerado de carne pode trazer complicações para a saúde por conta da alta ingestão de gordura saturada e também da forma de preparo, que pode expor a carne a altas temperaturas e gerar uma crosta queimada, com substâncias cancerígenas.
Uma dieta vegetariana planejada, rica em nutrientes, vitaminas e proteínas pode reduzir a incidência de doenças crônicas, hipertensão, infarto, diabetes, tipos de câncer e obesidade, destaca o nutricionista. Para quem quer aproveitar o embalo do Dia Mundial sem Carne, o professor dá algumas dicas:
- Procure um nutricionista para conduzir esse cardápio pensando na nova realidade
- Procure um médico para ver níveis de hormônios, nutrientes no sangue, ter um ponto de partida
- Inicie a suplementação de vitamina B12, após consulta com profissionais de saúde
- Monitore constantemente exames de saúde
- Faça uma transição gradual: tire a carne por um dia na semana e, depois, vá aumentando, ou seja, reduza a carga semanal de consumo de carne aos poucos.
(Fonte:G1)