Lar do idoso é um lugar para abrigar velhos cansados e que não produzem mais nada. É isso mesmo, produção? Claro que não. E uma das pessoas que quebram esse preconceito é Manoel Pereira dos Santos, ou, simplesmente, Seu Manoel.
De voz suave, mas com uma biografia sempre ligada à agricultura, ele narra uma trajetória de vida azeitada pelo trabalho pesado na roça, mas se orgulha de tudo que já viveu. Desde meados do ano passado ele está no Cipiar (Centro Integrado da Pessoa Idosa Antônio Rodrigues), onde foi entrevistado pela equipe do CORREIO.
Tão logo chegou ao Cipiar, Seu Manoel passou a cuidar da horta existente, que foi crescendo tanto que agora ajuda na alimentação de todos no lar e é motivo de orgulho para ele e os amigos. Além disso, esse senhor de 73 anos ainda sonha. Pediu e conseguiu voltar a estudar.
Leia mais:Seu Manoel é filho de Marabá, nascido e criado no Bairro Francisco Coelho, o Cabelo Seco, porém, sua história de vida o levou a percorrer diversos estados do Brasil, até parar no Cipiar, onde está fazendo algo que não teve a oportunidade durante a juventude: estudar. Mas o que chama a atenção, é que Seu Manoel está bastante avançado nos estudos quando comparado aos demais idosos do Centro. Ele cursa, atualmente, módulos de disciplinas do ensino médio.
Ele conta que é filho de um mineiro e uma baiana que vieram para o Pará subindo os caminhos do Rio Araguaia, atraídos pelas oportunidades que surgiam no sudeste do Estado nas décadas de 1930 e 1940, até chegar a Marabá. O pai era agricultor e também atuou como seringueiro, o famoso soldado da borracha. Já a sua mãe era dona de casa, e também plantava no quintal do lar.
Durante a infância, Manoel não teve muitas oportunidades de estudar, pois precisava trabalhar para ajudar a família, auxiliando nas plantações e também como canoeiro, já que naquela época não existia estrada de chão para chegar até Marabá. As águas dos rios Tocantins e Itacaiunas e os céus eram os únicos caminhos até o município.
Conforme foi crescendo, ele ganhou o mundo, tendo passado por diversos estados, onde foi aprendendo várias habilidades novas, mas a maioria no âmbito da agropecuária. “Fui criado como cigano, nunca parei em um lugar só”, admite o idoso, que percorreu o Mato Grosso, Paraná, São Paulo, Espirito Santo, Rio de Janeiro, Bahia, entre outros estados, onde atuou como caseiro, peão e até mesmo com montaria no circo.
“Em todos esses lugares eu trabalhei como caseiro, vaqueiro, sempre na zona rural, nas fazendas e chácaras. Lembro que em Barretos, em São Paulo, fui peão nos rodeios. Foram anos maravilhosos que nunca esqueço. Depois resolvi segui viagem com um circo, e por entender bastante de cavalos e bois, me colocaram para fazer números de montaria. Ah! E na baiana eu aprendi a plantar uma coisa que nunca havia plantado antes, o cacau”, relembra Manoel.
O idoso possui 12 irmãos, sendo que cinco deles são apenas por parte de pai, porém, atualmente, não mantém mais contato com nenhum deles, apesar de alguns até residirem em Marabá. Quando questionado se tem filhos, houve um hiato e ele ficou duvidoso: “são seis que tenho certeza”, respondeu, tirando alguns sorrisos das pedagogas que acompanhavam a entrevista e lhe auxiliam nos estudos. Os filhos, segundo ele, não o visitam desde 2011.
Manoel foi deixado no Lar São Vicente de Paulo em dezembro de 2010, onde permaneceu por nove anos. Lá, ele tomou a frente da horta do abrigo, graças aos seus conhecimentos em agricultura, mas não por obrigação, e sim, pelo gosto em plantar.
Em dezembro de 2019 foi transferido para o Cipiar, onde teve oportunidade de reiniciar os estudos com ajuda das pedagogas Jamirna Zoraida Olímpio e Adriana Ferreira. E, para ele, isso é um sonho antigo. Porém, destaca que há alguns perigos, como “arrumar uma namorada”, exemplifica, tirando novos risos das pedagogas.
As aulas são ofertadas em módulos pelo CEEJA (Centro Estadual de Educação de Jovens e Adultos), já tendo estudado português, matemática, artes, inglês, educação física e, no momento, segue com os módulos remotos, por conta da pandemia do novo coronavírus e fazer parte do grupo de risco. “Mas vou continuar, pois meu sonho é chegar a fazer uma faculdade para ser advogado, detetive ou engenheiro agrônomo, para continuar a ‘mexer’ com plantação”, almeja Manoel.
Como estudante antenado com as questões do presente, o idoso sonha em ter um computador para realizar pesquisas relacionadas aos temas que está estudando. “Uso na escola, mas aqui no Cipiar não está disponível. Tenho muita vontade de aprender informática”, clama.
UP NA HORTA
E no Cipiar, Manoel deu continuidade às atividades de agricultura, ampliando a horta do Centro, onde planta alface, couve, cebola, coentro, almeirão, melancia, quiabo, feijão, milho, banana, girassóis, flor do deserto, limão, entre outros. Ele levou a Reportagem do Correio para conhecer a plantação, e no pé de limão foi avistada uma casa de marimbondos, e ele tranquilamente disse “são os guardas da nossa horta”, e sorriu.
Seu Manoel é apenas um, dos vários idosos do Cipiar, que possuem histórias incríveis, algumas das quais serão contadas na série de reportagens do Correio de Carajás em alusão à Semana do Idoso, cuja data é comemorada no dia 1º de outubro.
Atividades da Semana do Idoso no Cipiar
Atualmente, o Cipiar atende 26 idosos. Nesta segunda-feira, 28, iniciaram as atividades em comemoração à Semana do Idoso, que segue até quinta, dia 1º de outubro.
Na segunda, os idosos participaram de uma celebração religiosa, com participação do pastor Kléber Félix, da Igreja Adventista do Sétimo Dia, além de cuidados da beleza, com a diretora nacional da Mary Kay, Mônica Oliveira.
Na terça, 29, a partir de 8h30, haverá novo momento religioso, com participação do pastor Paiva, da Igreja Assembleia de Deus Missão. Em seguida, haverá contribuição das fisioterapeutas da Clínica Fisioforma.
Na Quarta-feira ,30, a equipe da Biblioteca Orlando Lima Lobo fará uma apresentação lúdica para os idosos. À tarde, a partir de 17 horas, ocorre Bingo Dançante, seguido de Luau da Terceira Idade, com a participação do Dj Souza.
Na quinta-feira, dia 1º, os idosos vão participar de um dia de lazer no Clube da AABB.
(Zeus Bandeira)