Correio de Carajás

“Comecei a enxergar mulheres invisíveis”, diz juiz Alexandre Arakaki

Durante conversa nos estúdios da Rádio CORREIO, o magistrado afirma que ainda existe muita desigualdade entre homens e mulheres

Alexandre Arakaki, magistrado que julga casos de violência doméstica em Marabá

Com uma programação especial ao longo do dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, a Rádio CORREIO 92,1 FM recebeu, durante o programa Sintonizado em Você, sob o comando da locutora Patrícia de Paula, o juiz da 3ª Vara Criminal de Marabá, Alexandre Arakaki; Maria Helena, a servidora pública do Fórum da Comarca e Cláudia Cilene, coordenadora do Centro de Integração Social dos Moradores do Bairro Liberdade. A jornalista Ana Mangas, do Jornal CORREIO, mediou a conversa.

Durante o bate-papo no estúdio, o magistrado declarou que é preciso discutir sobre o feminismo e políticas públicas voltadas para as mulheres.

Segundo Arakaki, ainda existe muita desigualdade e diferença no tratamento entre homens e mulheres. Desde que começou a atuar nos crimes de violência doméstica e familiar, o juiz mudou sua visão em relação às mulheres.

Leia mais:

“Comecei a enxergar mulheres invisíveis, que são aquelas mulheres que estão ao nosso redor todos os dias e a gente não vê. É aquela mulher que acorda mais cedo que o marido e os filhos, faz o café, deixa tudo pronto, arruma a roupa, cuida da casa, trabalha fora, estuda, tem tripla jornada e muitas vezes não são reconhecidas. São mulheres que trabalham com uma enxada na rua arduamente, ao lado de homens, e não são vistas. São as mulheres que precisam falar uma três vezes para serem ouvidas quando estão ao lado de homens. Por isso falamos de feminismo, racismo e preconceito. Porque ele existe e precisamos levantar essa voz”, fala Arakaki.

Durante sua participação na CORREIO FM, o juiz ainda ressaltou alguns exemplos velados de violência e que são muito comuns na sociedade atual, como interromper a fala de uma mulher.

“Não deixar uma mulher concluir seu raciocínio muitas vezes é inconsciente. Porém, o homem que faz não percebe o quão mal educado e desrespeitoso ele está sendo, porque no fundo ele simplesmente está dizendo que não respeita o que a mulher está falando”.

A frente do Centro de Integração Social dos Moradores do Bairro Liberdade, Claudia Cilene já coordenou o Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Mulher em Marabá (Condim), e sabe bem as lutas que as mulheres travam todos os dias em busca de respeito.

“Graças a Deus, em Marabá, temos vários grupos de mulheres, todos muito fortes. Às vezes, cada um atua de forma isolada, da sua forma. Mas, no dia 8 de março todos se juntam, porque todos tem um só objetivo que é a dignidade das mulheres. E é através desses movimentos, desses atos, dessas marchas, que conseguimos avançar muito no município”, relembra Cláudia.

Os convidados e a equipe do Grupo Correio que os recepcionou

Paralelo a isso aumentou a conscientização das mulheres para reivindicarem por seus direitos, garantindo que possam estar cientes da luta pela total igualdade entre os gêneros em diversos cenários sociais.

Cláudia afirma que foi por conta das lutas, brigas e gritos de pedido de socorro que as coisas avançaram em Marabá, como a descentralização da Delegacia da Criança e da Mulher, que foi uma conquista do movimento.

“Não tínhamos o plantão 24 horas, hoje temos quatro equipes em Marabá. Não tínhamos uma vara criminal especializada, passamos muitos anos sem promotora de violência doméstica. Temos a coordenadoria de políticas públicas para as mulheres, que há nove anos não tinha. Então, tudo isso foi através da nossa luta. Muita coisa ainda tem de melhorar, mas já avançamos muito”, pontua Cláudia.

Para Maria Helena, servidora pública desde 2009 e que atua diretamente na Vara Criminal junto com Alexandre Arakaki, avalia como importantíssimo o trabalho de conscientização que tem sido feito com as mulheres nos últimos anos.

Ela relembra que existiam pouquíssimos processos e, hoje, o número é altíssimo. “Tivemos cerca de 550 procedimentos de medidas protetivas de urgência no último ano. Quando começou esse trabalho de conscientização e palestras, começamos a observar um número muito maior de mulheres indo à delegacia e procurando a Justiça. Nós da Vara Criminal, assim que chega um pedido de medida protetiva, imediatamente fazemos a conclusão e a equipe aprecia, decide e manda para a central de mandados para que possar dar prosseguimento. Tudo isso dentro de 48 horas”, explica Maria Helena.

Por fim, Arakaki afirma que o trabalho de conscientização é feito nas duas vias, tanto para as mulheres como para os homens.

“Começamos um grupo de reflexão com alguns homens, em parceria com a Secretaria de Assistência Social do município. E todos os homens que atendemos, nenhum voltou a reincidir e praticar violência doméstica. Então, o trabalho tem que ser em conjunto”, finaliza.

No final de 2022, a 3ª Vara Criminal de Marabá foi transformada pelo Tribunal de Justiça do Pará em vara exclusiva de crimes relacionados à violência doméstica. (Ana Mangas)