Correio de Carajás

Cena de novela abre debate sobre pensão alimentícia

O Brasil tem 11 milhões de mães que criam sozinhas os filhos

“A gente tem que mudar isso aí, filho não é problema de mãe não!” Essa frase fez parte de um diálogo entre duas mulheres em uma cena de novela veiculada em horário nobre da televisão brasileira e colocou em pauta, no mês das mães, um tema que é muito delicado para muitas famílias, a pensão alimentícia.

Na novela, a personagem Lucimar, interpretada pela atriz Ingrid Gaigher, em Vale Tudo, desabafa sobre as dificuldades de criar uma criança sozinha por 8 anos e decide procurar a Defensoria Pública do estado onde vive para regularizar tanto a guarda, quanto a pensão, ou seja, propor o que a Justiça chama de ação de alimentos.

Lucimar fez as solicitações por meio de um aplicativo da Defensoria Pública para celular e ao seguir o passo a passo, estimulou muitas mulheres a fazerem o mesmo na vida real.

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No Rio de Janeiro, na noite em que a cena foi ao ar, o aplicativo do órgão público bateu recorde de uso, com 4,5 mil acessos por minuto, sendo o normal 1 mil. O aumento dos acessos no horário da novela foi de 300%, o que resultou em 1.148 atendimentos agendados.

Em São Paulo, também teve aumento. De um dia para o outro, foram quase 1 mil atendimentos a mais, chegando a 2,8 mil no dia posterior a veiculação ao capítulo.

Fora de um cenário fictício, também deveria ser fácil solicitar a pensão alimentícia por meio das defensorias nos estados, presencialmente ou por meio de aplicativo, no caso de o serviço estar disponível nessa modalidade, como é caso do estado do Rio de Janeiro. Em São Paulo, é possível agendar o atendimento pelo site.

Em geral, nas defensorias, o atendimento é de graça para quem ganha até três salários mínimos.

Para começar, é preciso apresentar documentos pessoais como CPF, identidade e comprovante de residência, certidão de nascimento do filho, comprovante de renda, se houver, além do endereço do pai ou da pessoa de quem será requerida a pensão.

Para estipular um valor, a defensoria pode pedir também notas de supermercado, comprovante de mensalidade, se tiver, gastos com material escolar, medicamentos, roupas e com lazer.

“Todos os gastos e notas fiscais de coisas que são para a criança, inclusive, aluguel, ajudam a estabelecer o valor”, explicou a coordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher da defensoria do Rio, Thais dos Santos Lima.

“Mas a obrigação existe independente de comprovar os gastos”, frisou.

Antes de abrir o processo, o primeiro passo da Justiça é tentar um acordo entre os pais. Caso não seja possível, o juiz estipula desde o início do processo um valor com base nas necessidades da criança e que varia de caso a caso.

A pensão considera a capacidade financeira dos pais e até a sobrecarga de trabalho doméstico das mulheres com a rotina familiar.

Benefícios

A pensão pode ser solicitada desde a gravidez, quando a família passa a ter gastos extras com exames de pré-natal e enxoval. No caso de a paternidade ser questionada, a defensoria faz uma investigação prévia, que será depois confirmada com o exame de DNA.

Já o pagamento da pensão vai até os 18 anos de idade dos filhos, em média, mas pode se estender aos 24 anos de idade, no caso de o jovem frequentar um curso, faculdade, ou mais anos, caso de pessoas com deficiência. Em situações em que o benefício foi estipulado pela Justiça, mesmo aos 18 ou 24 anos, o responsável não pode parar de pagar de um mês para o outro. Ele deve procurar a Justiça para cessar o pagamento.

Quando há atraso ou pagamento parcial, a legislação prevê vários instrumentos para garantir o pagamento. Entre eles, o bloqueio da conta corrente do genitor, da poupança, do salário ou da aposentadoria. Se não houver dinheiro, o juízo também pode solicitar os bens, como veículos e imóveis e convertê-los em pensão que irá direto para a mãe. Em casos mais graves, o pai pode ser preso temporariamente por até 3 meses. No período, o cálculo da pensão continua.

“A prisão é o instrumento mais forte que tem para pressionar o pai, mas o juiz também pode determinar que ele fique com o nome sujo, que é outra forma de constranger esse pai a efetuar o pagamento e arcar com as suas obrigações”, explicou a defensora.

O Brasil tem 11 milhões de mães que criam sozinhas filhos ou cuidam de dependentes, segundo a pesquisa mais recente da Fundação Getulio Vargas, de 2022. Diante do abandono do genitor, muitas famílias contam com uma rede de apoio formada geralmente por outras mulheres, como as avós.