O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, assinou, na última sexta-feira, 16, um documento que cede uma área da cidade para a construção do primeiro hospital do mundo voltado totalmente ao tratamento de doenças raras. Equipamento será implantado pela Casa Hunter, Organização não Governamental (ONG).
Momento ocorreu durante a realização da 8ª Edição Cenário das Doenças Raras no Brasil, que aconteceu no município paulistano e reuniu especialistas e representantes de entidades públicas para debater o tema.
Na ocasião, o prefeito da capital aproveitou o momento e assinou um acordo que libera uma área de 1,8 mil m² na Vila Mariana para que seja construído um centro de referência especializado no local.
Leia mais:Projeto é uma idealização da Casa Hunter, instituição sem fins lucrativos que busca, dentre outras coisas, acolher pacientes com doenças raras e seus familiares. Conforme Antoine Daher, presidente da ONG, o hospital funcionará 60% pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e cerca de 40% pelo setor privado.
Desde fevereiro deste ano o Brasil já sedia, em Porto Alegre, a Casa dos Raros — Centro de Atenção Integral e Treinamento em Doenças Raras, que possui laboratórios e diversas outras funcionalidades na área de pesquisa. No entanto, conforme explica Daher, o equipamento novo será ainda mais integrado.
“O (hospital) que será construído aqui em São Paulo será o primeiro hospital do mundo totalmente integrado para o tratamento de doenças raras. Vai tratar, diagnosticar, fazer cirurgias, fazer pesquisa. Tudo em um local só”, explica o presidente e fundador da Casa Hunter.
Patologias afetam 13 milhões de pessoas no Brasil
O Cenário das Doenças Raras no Brasil é um evento que ocorre anualmente e tem dentre as finalidades conscientizar o Governo, empresas e a sociedade sobre o tema. Na 8° edição, foram discutidas diversas questões sobre essas patologias e apresentado dados específicos a respeito do assunto.
Dentre eles está o da Organização Mundial da Saúde (OMS), que estima que as doenças raras afetam 65 a cada 100 mil indivíduos no mundo. Só no Brasil, é estimado que cerca de 13 milhões de pessoas convivam com alguma dessas condições.
Para repercutir os índices e seus desdobramentos, foram convidados nomes como: Marco Krieger, vice-presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Camile Giaretta, assessora da presidência da Fiocruz e Gustavo Mendes, diretor de Assuntos Regulatórios, Qualidade e Ensaios Clínicos na Fundação Butantan.
Representando a Fiocruz, Marco Krieger falou sobre os desafios do País quanto a busca pelo desenvolvimento tecnológico necessário para produzir produtos de terapias avançadas, destacando a importância de se buscar trabalhar com parcerias público-público ou público-privada nessa área.
“O Brasil tem uma política muito sólida que voltou a ser valorizada, que é ver a saúde não como um gasto, mas como um investimento. Então esse investimento pode permitir que a gente tenha um desenvolvimento tecnológico muito importante no Brasil, que nós estamos buscando também. Então eu acho que esses desafios que nós temos são gigantescos, mas nós temos grandes oportunidades”, disse o vice-presidente.
Evento teve ainda como proposta elencar pontos que precisam ser melhorados no País sobre o tema, como: coordenação das políticas relacionadas a doenças raras, incorporação de novas tecnologias e o desenvolvimento de novos medicamentos. Aspectos devem ser levados ao Ministério da Saúde (MS).
Confira lista com algumas das doenças consideradas raras:
Acromegalia;
Anemia aplástica, mielodisplasia e neutropenias constitucionais;
Angioedema;
Aplasia pura adquirida crônica da série vermelha;
Artrite reativa;
Biotinidase;
Deficiência de hormônio do crescimento – hipopituitarismo;
Dermatomiosite e polimiosite;
Diabetes insípido;
Distonias e espasmo hemifacial;
Doença de Crohn;
Doença falciforme;
Doença de Gaucher;
Doença de Huntington;
Doença de Machado-Joseph;
Esclerose lateral amiotrófica;
Esclerose múltipla;
Espondilite ancilosante;
Filariose linfática;
Fonte: Biblioteca Virtual de Saúde, do Ministério da Saúde (MS)
Diagnóstico, terapias avançadas e o desafio do SUS
Especialistas e representantes presentes no evento debateram ainda sobre a importância do diagnóstico das doenças raras, por meios como o teste do pezinho e o sequenciamento genético.
“A gente sabe que o diagnóstico é fundamental. Tudo começa no diagnóstico”, destacou na ocasião Antônio Silva, diretor executivo da Roche, companhia pioneira em produtos farmacêuticos.
Além disso, também foi trazido para discussão as terapias avançadas, produtos biológicos utilizados como “promessa terapêutica para enfermidades complexas e sem alternativas médicas disponíveis”.
De acordo com Marco Krieger, nos últimos três anos a Fiocruz já registrou 15 produtos na Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa). Ainda assim, há desafios como levar essas tecnologias para o SUS.
“Nós temos que levar essas tecnologias para a capilaridade do Sistema Único de Saúde, e esse é o desafio que nós estamos dividindo com nossos parceiros (…) As tecnologias existem, elas já estão em um preço que nós podemos utilizar no sistema público, mas nós não temos a maneira de fazer isso”, disse o gestor.
Já Gustavo Mendes, diretor de Assuntos Regulatórios, Qualidade e Ensaios Clínicos na Fundação Butantan, mostrou uma visão mais otimista sobre o assunto, pelo menos no que diz respeito ao futuro.
“Nós construímos um cenário, um ambiente favorável tanto para ter os produtos incorporados no nosso sistema quanto também para desenvolver desde da pesquisa básica (a outras etapas)”, afirmou na ocasião.
Importância das farmas e a construção de um ecossistema
Enquanto o sistema público de saúde enfrenta desafios quanto ao avanço e ao uso dessas tecnologias, as farmacêuticas se destacam como promissoras no ramo da pesquisa e do desenvolvimento de medicamentos voltados para o tratamento de doenças raras no País.
A companhia suíça Roche, pioneira em produtos farmacêuticos, é uma das empresas dessa área que têm atuação no Brasil. Além de já ter registrado medicamentos específicos para essas condições raras, a empresa tem aberto centros de tratamento e atuado para levar informação aos pacientes.
Segundo Antônio Silva, diretor executivo da Roche, a empresa busca expandir o olhar e “enxergar as necessidades que não são atendidas no mundo”, usando a “revolução tecnológica a favor dos pacientes”.
“(Temos) O pioneirismo da tecnologia, mas a gente vê que a indústria farmacêutica é pioneira em trazer inovações. Você não precisa ser o primeiro. Você precisa ajudar o ecossistema a avançar mais rápido”, diz ainda o representante.
O ecossistema ao qual o diretor fala se refere ao conjunto de esforços realizados, por entidades e órgãos públicos, em pró do tema. Durante o evento, Marco Krieger, vice-presidente da Fiocruz, chegou a dizer que o Brasil ainda não tem “a mesma musculatura” que os Estados Unidos quanto ao tema doenças raras, mas que o envolvimento de instituições nesse cenário deve seguir avançando as discussões.
“Eu acho que o SUS tem interesse de participar dessa solução, porque ele sabe o desafio que tá vindo pela frente. Só no ano passado foram gastos mais de R$ 1 milhão nos primeiros tratamentos que chegaram. E vai chegar mais”, completou.
(Fonte: O Povo)