O ano letivo de 2025 inicia hoje, segunda-feira (20) na maior parte das escolas municipais e privadas de Marabá. E elas estão com um novo desafio este ano: colocar em prática as restrições ao uso do celular. Mesmo que essa proibição – estabelecida por lei pelo presidente da República – esteja sendo vista por grande parte da sociedade e da comunidade escolar com “bons olhos’, os desafios serão enormes. Pelo menos é o que afirmam os gestores educacionais.
É bom ressaltar que os aparelhos seguem sendo permitidos para o uso pedagógico, ou seja, quando for autorizado pelos professores como instrumento de ensino para aula.
O CORREIO conversou com representantes de escolas públicas e privadas de Marabá que comemoram a sanção da lei. Contudo, alertam que não basta a escola seguir a lei e proibir o uso do aparelho de celular. É preciso a parceria e compreensão os pais, para entenderem que essa responsabilidade também perpassa por eles, através dos limites de uso em casa e apoio aos professores.
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“Não é nossa intenção proibir total e indiscriminadamente a vinda do celular para o ambiente escolar”, diz Raimundo Júnior, diretor do Grupo Futuro.
Vivenciando a rotina educacional há muitos anos, o diretor Raimundo Júnior, celebra a regulamentação do uso do celular no cotidiano das atividades escolares. Porém, ressalta que na sua instituição de ensino, localizada na Folha 26, os docentes não irão atuar de forma proibitiva, e sim de forma educacional.
“O Grupo Futuro ainda está estabelecendo os critérios de permissão da vinda do celular acompanhado do estudante para o dia a dia escolar. Não é nossa intenção proibir que o estudante traga o celular. Acredito que vamos, inclusive, estimular que eles tragam para que possamos, em forma de combinado e de educação, a partir do uso adequado da tecnologia do celular, fazermos com que as crianças e os jovens se eduquem ao processo de utilização. Então, não é nossa intenção proibir totalmente a presença do celular no ambiente escolar. Mas, sim, educar a utilização do mesmo dentro das rotinas escolares. A escola e o departamento pedagógico enxergam, em alguns momentos, o uso do celular com uma intencionalidade pedagógica. Toda vez que o corpo escolar entender que há a necessidade de realizar alguma atividade que precise do celular como plataforma de apoio, eles serão sim, estimulados a usarem”, pontua o gestor.
Para Júnior, a regulamentação era necessária, porque é a partir da legalidade que as escolas podem criar condições de convivência entre a rotina escolar saudável e o uso do celular como instrumento de tecnologia, que conversa com a educação como ferramenta e, também, como meio de entretenimento.
Outro ponto levantado pelo diretor educacional é o fato de que com o uso frequente do celular, os estudantes acabam se isolando no mundo virtual. “Vamos estudar medidas para que eles possam interagir melhor, fisicamente, no ambiente escolar, a partir da utilização de rodas de conversa, jogos, interação e diálogos em um ambiente coletivo”.
A nova lei determina que as escolas elaborem estratégias para tratar da saúde mental dos alunos da educação básica, apresentando a eles informações sobre riscos, sinais e prevenção do sofrimento psíquico, incluindo o uso imoderado dos celulares.
Júnior pontua que sua escola já possui um departamento psicológico que contribui na rotina escolar para que o discente possa ter um apoio no desenvolvimento socioemocional atrelado ao desenvolvimento intelectual.
“A escola já vem engajada nesse movimento. Mas, deverá receber um aumento de demanda e pressão nessa fase por conta daquelas crianças que tenham uma necessidade maior de estarem com o celular. Isso vai se tornando um vício, e quando você atua sobre um vício acaba gerando aqueles momentos de crise de abstinência. Então, pode ser que tenhamos um pico de necessidade de apoio psicológico, e nós vamos desenvolver esse trabalho em conjunto com as famílias. Nunca assumindo unicamente essa responsabilidade pela solução de eventuais conflitos dessa natureza”, conclui.
“Tem de haver um equilíbrio, senão estaremos formando um exército de pessoas fúteis e produtores de conteúdo sem conteúdo”, diz a diretora Conceição Holanda.
Há mais de 35 anos na educação, Conceição Holanda Santos, diretora da Escola ÉTICA, na Folha 28, afirma que a nova regulamentação vem para tornar o ambiente escolar uma zona livre de celular, permitindo assim que os alunos possam voltar a aprender em sala de aula. “Há muito tempo já recolhemos os celulares durante o horário de aula, tentamos monitorar de alguma forma o uso excessivo, mas sem apoio da maioria das famílias. A maior argumentação dos pais das crianças da educação infantil é que precisam manter contato com os filhos. Isso é extremamente desnecessário. A escola está aqui para dar apoio, confiança e zelar pelo bem-estar das crianças”, pondera.
Segundo Conceição, o horário do recreio nas escolas se tornou uma “zona morta”, já que a grande maioria dos alunos fica de cabeça baixa mexendo no celular. Ela acredita que o celular interrompe a vida e fragmenta a atenção.
Questionada pelo CORREIO sobre o apoio psicossocial da escola, ela afirma que desde 2023 dão esse apoio aos alunos, justamente para colaborar para um desenvolvimento emocional mais saudável.
“Com mais de três décadas na área da educação, consigo perceber de forma muito clara o impacto negativo dessa fácil acessibilidade que nossas crianças têm ao celular. Essa lei caiu como uma luva para acudir os professores. Agora estamos respaldados por uma lei. Não sou uma diretora a moda antiga. Pelo contrário, sou apaixonada pelo novo, pelas inúmeras maneiras de aprender. Mas, a verdade é que tem de haver um equilíbrio, senão estaremos formando um exército de pessoas fúteis e produtoras de conteúdo sem conteúdo. Eu quero de alguma forma fazer parte dessa diferença, e no momento a melhor forma é ensinando fora das telas”, finaliza.
“É preciso promover atividades que incentivem essa interação, tornando os intervalos mais dinâmicos e atrativos”, afirma Magno Barros.
Para Magno Barros, dirigente da Diretoria Regional de Ensino de Marabá, antiga 4ª URE (Unidade Regional de Educação), que abrange treze municípios da região, essa regulamentação é um avanço importante para o ambiente escolar, pois busca equilibrar o uso da tecnologia com a necessidade de foco e interação presencial. Ele ressalta ainda, que o celular, quando bem utilizado, pode ser uma ferramenta pedagógica incrível, mas o uso indiscriminado tem trazido desafios para a aprendizagem e para as relações interpessoais. Por isso, a lei dá a oportunidade de repensar a relação dos estudantes com a tecnologia dentro da escola, estabelecendo limites claros.
“A fiscalização será responsabilidade das escolas, que irão adaptar seus regimentos internos para alinhar as práticas à nova lei. Isso inclui orientar os professores e a equipe pedagógica sobre como lidar com situações específicas, como a comunicação com os pais. Sabemos que o celular virou parte da rotina das famílias, mas a escola também é um espaço de aprendizagem social, e a regulamentação ajudará a promover isso. Para emergências, é essencial que as escolas mantenham canais de comunicação ativos entre pais e direção, minimizando a necessidade de uso constante dos celulares pelas crianças”, argumenta.
Magno acredita que um dos benefícios da nova regulamentação é resgatar a interação entre os alunos, sem o celular como distração principal. Para ele, o intervalo será uma oportunidade para conversas, brincadeiras e formação de vínculos mais significativos, o que é fundamental para o desenvolvimento das habilidades socioemocionais dos estudantes.
“Mas, claro, isso depende de estratégias das escolas. É preciso promover atividades que incentivem essa interação, tornando os intervalos mais dinâmicos e atrativos”.
Em relação à saúde mental dos estudantes, o dirigente afirma que essa é uma responsabilidade compartilhada entre escola e família. Para ele, a escola tem o papel de criar um ambiente saudável e acolhedor, promovendo o uso consciente da tecnologia. Porém, os pais são fundamentais nesse processo, já que o uso do celular começa em casa.
“Essa parceria entre escola e família é essencial para que os jovens compreendam a importância de usar o celular de forma equilibrada, tanto para o bem-estar emocional quanto para o aprendizado. A saúde mental dos estudantes é uma responsabilidade compartilhada entre escola e família. A facilidade de acesso ao celular trouxe benefícios inegáveis, como a ampliação do acesso à informação e à comunicação, mas também trouxe desafios. Temos percebido dificuldades crescentes de concentração, maior exposição a distrações e, em alguns casos, a dependência tecnológica. Além disso, o uso inadequado do celular pode prejudicar o desenvolvimento de habilidades sociais e colaborativas”, avalia Magno.
(Ana Mangas)