Aos 90 anos de idade, Maria Spinazze faz parte do grupo de pessoas que possui sua própria plantação de hortaliças no quintal de casa. Quiabo, rúcula, couve, coentro, pimentão, cebolinha, macaxeira, jiló, banana, urucum, jambu, laranja, jabuticaba, boldo, alecrim, arruda, limão e carambola são alguns dos itens presentes na extensa área verde e bem cuidada da aposentada.
O cultivo de hortas urbanas ganha grande importância com as crescentes crises econômicas que se aflora em vários países, principalmente no Brasil.
Além de Maria Spinazze, centenas de outras pessoas anônimas produzem hortaliças e frutas em seus quintais em Marabá para diminuir o impacto financeiro no bolso.
Leia mais:No resultado da inflação de abril, divulgado pelo IBGE, dos 20 itens que mais subiram este ano, nada menos do que 18 são legumes, tubérculos, hortaliças e frutas. O morango com 17.66%, maracujá com 15.99%, couve-flor 13.25%, tomate 10.18%, abobrinha 9.31%, repolho 54.72%, pimentão 51.33%, mamão 45.62%, alface 45.04%, pepino 38.26% e brócolis 35.7%.
No caso da horticultura, os consumidores se depararam com preços elevados de frutas e hortaliças ao fazer compras nos supermercados. Como alternativa econômica surge a ideia de cultivar os próprios legumes, verduras e frutas, já que hoje em dia ter a sua horta fica mais barato do que ir ao mercado ou à feira.
Moradora de Marabá há 50 anos, e há mais de 30 do bairro Liberdade, ela veio com apenas 43 para Marabá, diretamente de João Neiva, no Espírito Santo. Ao CORREIO, a senhora conta que no começo, seu lote era basicamente todo composto por mato, mas que enquanto construía a casa dos filhos ao redor da sua foram cultivando as primeiras plantas: “Fomos enchendo caixas e baldes para plantar, depois começamos a usar geladeiras velhas”, relata.
Muitos dos pequenos cultivos na área urbana são reflexos da cultura e dos costumes das pessoas da área rural que chegam à cidade e se adaptam às novas condições de moradia. Essa pequena produção contribui para a renda familiar através da diminuição de gastos com alimentação e até da comercialização de pequenos excedentes. Essa margem permite que as pessoas não tenham mais a necessidade de comprar todos os alimentos consumidos.
Viúva há 19 anos, Maria narra que só estudou entre os sete e nove anos de idade, então durante toda sua vida trabalhou na roça plantando e colhendo café, milho e arroz: “A gente cresceu muito pobre e quando melhoramos um pouquinho, meu marido quis vir para cá, e aqui nossos filhos conseguiram prosperar e construir uma vida bem melhor’, avalia.
Mantendo os bons e velhos costumes mesmo com idade tão avançada, a aposentada ainda possui disposição para pegar a inchada e capinar o lote, plantar mudas, colher sementes, frutos e aguar as plantas quase que diariamente. Trata-se de seu passatempo: “Se não fosse os joelhos, eu estaria 100%. Minha cabeça está boa e o resto também, ainda me sinto apta para cuidar das plantas.”
Sobre as sementes e as mudas, Maria costuma compartilhar com a família e os conhecidos. Algumas pessoas vêm até ela para pedir e a nonagenária faz muita questão de dar, pois entende que se trata de uma boa ação, já que incentiva outros a dar continuidade na proliferação de hortas urbanas e proporciona uma alternativa econômica em meio a um momento de grandes inflações no bolso do brasileiro.
Além das hortaliças, Maria também cria galinhas em uma parte separada de seu grande lote e se sente bastante satisfeita com tantas alternativas disponíveis, que te livram de precisar pagar por alimento: “Se eu preciso de uma cebolinha para dar gosto na refeição, eu vou lá e apanho, se quero fazer uma saladinha de couve, tiro três, quatro folhas e faço, se eu precisar fazer um frango ou ovo, de qualquer forma, também consigo no meu quintal”, conta.
Produzir o próprio alimento é uma forma de resistência e o começo da revolução de baixo para cima. Permite que os habitantes cultivem alimentos de qualidade, dentro das suas preferências e possibilidades, sem depender dos produtos e preços estabelecidos pelo mercado.
Nesse sentido, favorece a uma maior diversidade alimentar e ecológica, fortalece a comunidade, aos poucos, ante as crises econômico/alimentares e proporciona autonomia e individualmente as hortas urbanas permitem economizar gastos financeiros com a compra de vegetais em feiras e supermercados; fornecem alimentos muito mais saudáveis do que os colhidos em plantações convencionais, já que geralmente não levam agrotóxicos e nem organismos geneticamente modificados; e aproximam as pessoas do contato direto com a natureza e diminuem a sensação de viver numa cidade demasiadamente concretada, saturada e poluída.
(Thays Araujo)