Logo nas primeiras horas desta sexta-feira, 20, o povo indígena Gavião da Montanha perdeu uma de suas figuras mais emblemáticas: Ronöre Akrãtikatêjê, carinhosamente conhecida como “Mamãe Grande”.
Aos 105 anos, a anciã foi uma testemunha viva e atuante da resiliência de seu povo frente aos desafios impostos por grandes empreendimentos em seu território, especialmente no sudeste do Pará.
O professor Gerônimo Rodrigues, da Unifesspa, lamentou nas redes sociais: “Não vou repetir o que é de conhecimento público: o protagonismo de Ronöre na defesa do povo Gavião em seus 105 anos de vida e sua referência para as novas gerações! Lamento também que a universidade tenha perdido a oportunidade de homenagear a Mamãe Grande em vida. Infelizmente, a burocracia e a falta de urgência para com os vivos frequentemente saem derrotadas. Não poucas vezes, a universidade se torna um ‘lugar de estudo dos mortos’, e esquece dos vivos”, disse ele, referindo-se à promessa da universidade de conceder a Ronöre o título de Doutora Honoris Causa em vida.
Leia mais:Wyratan Sompré, secretário adjunto dos Povos Indígenas do Pará, também prestou uma homenagem em sua rede social. “É com uma imensa tristeza que nos despedimos hoje da vovó Ronöre, a Mamãe Grande, essa guerreira que foi e sempre será um símbolo de força, de sabedoria e resistência. T.I. Mãe Maria mais uma vez se encontra de luto.”
A partida de Mamãe Grande deixa um vazio imenso, mas seu legado de coragem e sabedoria continuará a inspirar as futuras gerações do povo Gavião. Ela sempre gosta de falar sobre a luta, cosmologia e costumes do povo Akrãtikatêjê, apontando para os jovens a escuta das histórias de seu povo.
O perfil Mídia Gavião, no Instagram, também se manifestou sobre a perda da indígena centenária com o seguinte texto reflexivo: “Hoje o Território Indígena Mãe Maria se despede de uma de suas mais importantes referências. Com mais de 100 anos de vida, Ronöre — carinhosamente chamada de Mamãe Grande — nos deixou, deixando também um legado imensurável de coragem, resistência e sabedoria.
Ronöre pertenceu à geração do grupo Akrätikatejê (Turma da Montanha), que enfrentou duras provações durante o período da ditadura militar. Foi forçada a abandonar sua aldeia por conta da construção da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, que ameaçava alagar todo o território ancestral.
Em meio a esse cenário de violência e perda, Ronöre acolheu e criou muitas das crianças que ficaram órfãs durante o período de contato com a sociedade envolvente. Mais tarde, somou sua força às comunidades Parkatejê e Kyikatêjê, onde seguiu firme na luta contra a presença de grandes empresas invasoras e pela preservação de nossa cultura, nossos rituais e nosso modo de vida.
Ronöre foi símbolo de amor, luta e sabedoria para muitas gerações do nosso povo.
Que sua força siga nos inspirando a continuar resistindo, existindo e honrando nossa ancestralidade.
Descanse em paz, Mamãe Grande. Sua história é eterna”.
O CORREIO entrou em contato com a cacique Kátia Silene para analisar a grande perda do povo Gavião, mas até o momento não obteve retorno.