Correio de Carajás

A cada 24 horas, 4 mulheres pedem medida protetiva em Marabá

Em 2023, 38 medidas já foram descumpridas, um número que corresponde a 68% dos dados de 2022, onde foram quebradas 56 ordens judiciais

Delegada Yasmin aponta que o núcleo de maior incidência de episódios de violência contra a mulher é a Nova Marabá/ Foto: Evangelista Rocha

Nos primeiros 181 dias de 2023, a cada 24 horas, quatro medidas protetivas foram solicitadas em Marabá. Essa média é calculada a partir dos dados colhidos pelo Correio de Carajás junto à Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM). Para falar sobre os registros, a reportagem conversou com Yasmin Santos Andrade Farias, delegada titular daquela especializada.

Em números totais, 720 pedidos de medidas protetivas foram registrados nos primeiros seis meses, em Marabá. Essa quantidade representa 69% do total requerido em 2022, que foi de 1.049. Medidas protetivas são um mecanismo utilizado para proteger a mulher vítima de violência doméstica e lhe garantir o direito a uma vida sem agressões, mas nem sempre isso é possível.

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Em 2023, os dados apurados revelam que 38 medidas já foram descumpridas, um número que corresponde a 68% dos dados de 2022, onde foram quebradas 56 ordens judiciais dessa categoria.

Ainda que reais, os números não representam a totalidade de medidas protetivas quebradas. A delegada Yasmin Farias explica que dentro do ciclo de violência que a mulher vivencia com o agressor, chega um determinado momento que ela pede que a medida seja retirada.

“Enquanto ela está com ele e há um novo episódio de agressão, a mulher está desprotegida porque ela mesma pediu para revogar (a ordem judicial). Por isso, quando ocorre um novo ato de violência não cabe o descumprimento. Então, a gente vai para aquelas estatísticas de novo pedido de medida. É como se o cara tivesse descumprido, mas não entra nessa categoria”.

DENÚNCIAS

Yasmin aponta que o núcleo de maior incidência de episódios de violência contra a mulher é a Nova Marabá. Além disso, a faixa etária que mais sofre essas agressões é entre 20 e 35 anos. “É a idade que elas se casam, tem filhos. Esse, geralmente, é o principal público aqui da DEAM”, detalha a delegada.

Os dados de 2023 (1º semestre), detalham que 133 prisões em flagrante já foram realizadas pela Delegacia da Mulher. Casos que o Correio de Carajás notícia com frequência, principalmente às segundas-feiras, pois é no final de semana que as situações de violência doméstica são registradas em maior número. Seja pelo fato de agressores e vítimas passarem mais tempo juntos, seja pela ingestão de bebida alcoólica por parte do homem, sábado e domingo são os dias mais propensos à violência doméstica.

Já em 2022, os flagrantes foram o dobro dos já registrados em 2023, representando um total de 261 ocorrências.

Flagrante delito é o termo jurídico utilizado quando o criminoso é pego no momento em que comete um crime. Essas situações são possíveis graças, principalmente, às denúncias de violência que são feitas pelas vítimas ou por terceiros.

A maior parte das apresentações de agressores realizadas pela Polícia Militar na DEAM foi realizada graças a denúncias de testemunhas, como explica a delegada. “A mulher está brigando com o marido dentro de casa, aí o vizinho ouve e chama a polícia e eles (vítima e agressor) são apresentados aqui na delegacia”, exemplifica.

O aumento nas delações pode indicar que mais mulheres estão sendo agredidas, entretanto, a delegada também acredita que esse indicativo é reflexo das ações de conscientização regularmente realizadas no município (e em todo o País).

Há ainda aquelas vítimas que procuram a polícia espontaneamente, seja através do canal telefônico ou presencialmente na DEAM, momento em que elas podem, além de denunciar a agressão, solicitar a medida protetiva e dar início ao inquérito policial.

APURAÇÃO

Conceitualmente, inquérito policial é definido como uma investigação realizada pela Polícia Civil (ou Federal), com o objetivo de averiguar as infrações penais e coletar elementos necessários para que seja possível propor a ação penal.

É possível conceituar inquérito policial como o conjunto de diligências (atos investigatórios) realizadas pela polícia judiciária (polícias civil e federal), com o objetivo de investigar as infrações penais e colher elementos necessários para que possa ser proposta a ação penal.

No 1º semestre de 2023, um total de 200 inquéritos policiais já foram abertos na DEAM. Número que já ultrapassa todo o ano de 2022, onde 199 foram registrados.

Ao comparar os dados de inquéritos com o de prisões em flagrante, de 2022, é possível perceber uma discrepância nos dados. Naquele ano, as prisões foram 131% a mais do que a quantidade de processos de investigação abertos.

Isso se explica pelo fato de que muitas vítimas decidem não prosseguir com a denúncia de violência doméstica, mesmo com o flagrante. Algumas chegam a desistir ainda na delegacia e acabam retornando para o companheiro e para o ciclo de violência vivenciado ao seu lado.

Já naqueles naqueles casos em que as mulheres não apresentam lesões aparentes e decidem não dar continuidade no processo, dependendo do caso, é aberto inquérito policial do agressor. Da mesma forma, pode haver a prisão em flagrante.

OUTROS DADOS

Ainda que em menor número, mas igualmente preocupante, os dados indicam 14 casos de mulheres maiores de 14 anos que foram estupradas em 2022 (chamado de estupro simples) em Marabá. E três situações envolvendo vulneráveis (menores de 14).

Em 2023, situações com vulneráveis já alcançam a mesma quantidade (três), enquanto os classificados como simples chegam a sete.

É relevante observar que os dados de estupro de vulneráveis referem-se apenas aos casos atendidos nos plantões da DEAM, pois há um ano as delegacias da mulher e da criança foram divididas.

ATENDIMENTO INTEGRADO

A Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher realiza atendimento integrado ao da Fundação Parápaz (programa do governo estadual), no atendimento às vítimas de violência doméstica.

“Temos o plantão 24 horas (apenas na DEAM), uma conquista que conseguimos agora, a mulher pode vir aqui todos os dias da semana, qualquer horário é feito o atendimento dela e ainda do Parápaz, que é o primeiro a recebê-la”, diz Yasmin.

Ela explica que quando a vítima chega até a unidade, ela é recebida e atendida por uma assistente social primeiro, que irá verificar qual a demanda, se o caso é policial ou se uma situação social.

Se houver necessidade, a mulher pode se consultar com uma psicóloga, que atua no Parápaz, e no caso de situação criminal, ela é direcionada para a DEAM. “Aí a gente vai fazer o procedimento policial, vê se a demanda dela é um caso de medida protetiva ou se é um caso de medida protetiva junto com inquérito policial. A gente inicia todo o atendimento para o agressor responder por aquele crime e daqui envia para o judiciário e lá dá início a uma ação penal”, detalha a delegada.

Além do acolhimento recebido no Parápaz e DEAM, se a vítima estiver muito abalada psicologicamente, ela é encaminhada para o Centro de Referência de Atendimento à Mulher (CRAM), localizado na Folha 32, Quadra 08, Lote 07, Nova Marabá. No local, a mulher recebe atendimento psicológico contínuo. “Quando elas não querem ir voluntariamente até lá, a gente pede para os profissionais realizarem busca ativa, para poder conscientizar que elas precisam buscar esse atendimento”, finaliza. (Luciana Araújo)

 

Matéria atualizada em 20/07/2023, às 17h20