A véspera do Dia de Finados em Marabá revelou – mais uma vez – o cenário de falta de cuidados com cemitérios públicos da cidade, principalmente o Cemitério da Saudade, o maior deles, localizado na Folha 29, na Nova Marabá. O local expõe a fragilidade do cuidado com a memória dos entes queridos de mais de 50 mil pessoas que ali estão enterradas.
Maria do Rosário, 57 anos, e o marido Assis, 82 anos, são um exemplo de indignação dos visitantes, ao chegarem ao local para limpar o túmulo dos filhos e se depararam com a falta de água e com o mato alto.
“Vim para fazer a limpeza do túmulo dos meus dois filhos, como faço há 36 anos. Mas, aqui a prefeitura só limpa na véspera do Dia de Finados. Passa o ano todinho sujo. Hoje que eles começaram a vir aqui, mas isso era para estar limpo todo tempo. É um descaso”, lamenta.
Leia mais:Além disso, Maria denuncia o perigo de visitar o cemitério nos outros dias do ano. A falta de manutenção constante acaba tornando o local inseguro. Segundo ela, um coveiro já lhe atentou sobre o perigo de ir ao local sozinha. “A gente não pode nem vir aqui porque é perigoso. O coveiro falou que não era pra eu vir sozinha aqui, porque era perigoso. As pessoas entram pra usar drogas”, lamenta.
Para o idoso, o poder público só lembra de limpar o cemitério nesse período. “Só cuidam dos túmulos dos ricos, os pobres ficam abandonados. Eles estão com um caminhão pipa aqui lavando, mas não tem água para os mortos. Estamos voltando com os baldes secos, porque não tem água pra nada, e não conseguimos limpar o túmulo dos nossos filhos”.
O CORREIO esteve no Cemitério da Saudade na manhã desta sexta-feira, 1, e confirmou que a limpeza estava sendo feita por uma equipe do Serviço de Saneamento Ambiental (SSAM).
Antônio Ferreira, responsável pelo cemitério há 10 anos, confirmou que a limpeza é feita somente nas proximidades do dia 2 de novembro. “É verdade, a gente não pode tampar o sol com a peneira. Mas, o cemitério fica limpo, temos uma equipe que tira todas as folhas e limpa os jazigos das pessoas. Mas, o ser humano deixa tudo pra última hora pra vir aqui limpar”.
Porém, a reportagem questionou o administrator do local, já que existem reclamações de que o cemitério é perigoso, pois muitos usuários de droga utilizam o espaço. “Isso não é de agora, desde antes de eu vir trabalhar aqui já acontecia isso. Já teve até assassinato aqui dentro. A gente fala para as pessoas virem durante o dia, cedo. Horário de meio dia e depois das 17 horas, não é aconselhável vir, porque não tem funcionário nesses horários. Os agentes patrimoniais ficavam aqui, mas foram retirados e eu não sei por quê”.
30 anos na porta do cemitério
A vendedora ambulante Nair Silva, 58 anos, iniciou nesta sexta-feira, 1º de novembro, o trabalho de venda de velas, flores e coroas. Ela conta que há 30 anos fica na porta do Cemitério da Saudade comercializando seus produtos e tentando tirar um ‘extra’, como ela mesma diz. “Hoje o movimento ainda está fraco. Mas, amanhã quero vender dez vezes mais. Cinco horas da manhã tô aqui. Já me acostumei”.
Para a Reportagem, Nair relata que começou a vender vela em frente ao cemitério quando a mãe faleceu e acabou virando uma tradição. “Eu vinha pra cá vender vela, e aprendi a fazer essas flores e comecei a vender. É um dia que eu fico mais perto dos entes queridos. Antes de começar a vender vou lá no túmulo da minha mãe, e depois, antes de terminar as vendas, vou lá me despedir. É um sentimento que não sai do coração”.
Mausoléu
Criado em 2021 para comportar a grande quantidade de vítimas da covid-19, o novo cemitério de Marabá, nomeado provisoriamente de Parque de Marabá, localizado próximo a uma universidade particular, parece ser mais um exemplo de falta de planejamento da gestão municipal.
Sem estrutura física adequada e a falta de arborização causam um ar de desmazelo para com as famílias que frequentam o ambiente no descanso final de seus entes.
As estacas de madeira, que seriam temporárias, com números das covas pintados de vermelho soam como uma falta de cuidado no planejamento e execução do projeto. Essa solução levanta dúvidas sobre o comprometimento com a dignidade dos falecidos e a experiência dos visitantes.
“As lápides futuras serão todas padronizadas, com as informações do inumado, como nome, data de nascimento e falecimento”, afirmou Mancipor Lopes, superintendente da SDU ainda em 2023. No entanto, o futuro não parece ter pressa e a demora na implementação espelha a falta de prioridade dada ao cemitério”, reconheceu Mancipor Lopes à época. O CORREIO esteve no cemitério e o local continua a mesma coisa.
(Da Redação)