O Ministério Público Federal (MPF) acionou nesta quinta-feira, 20, a Comissão de Ética Pública do governo federal a se manifestar sobre o direito de servidores de participarem e emitirem opiniões em debates públicos. Na recomendação, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) pede ao órgão público que alerte sobre “condutas abusivas a partir de noção equivocada de hierarquia”. No documento assinado por um grupo de nove procuradores é cobrada que a divulgação seja de forma mais ampla possível e que, em dez dias, a Comissão de Ética responda se acatará, ou não, o pedido.
O texto é embasado na reportagem publicada pelo Estadão (mas em primeira mão pelo Correio de Carajás) sobre a discussão entre o secretário especial de regularização fundiária do Ministério da Agricultura, Luiz Antônio Nabhan Garcia e a geógrafa do órgão Ivone Rigo, durante audiência pública realizada no último dia 10, em Marabá.
Ao ser indagado por Ivone sobre a paralisação de processos de regularização fundiária e a falta de estrutura para fiscalização de agentes da estatal, Nabhan classificou-a como uma “servidora simples” e pediu pra ela “se colocar no seu devido lugar”.
Leia mais:Além das críticas, o secretário ordenou a abertura de um processo contra Ivone para “apuração do comportamento nada de ético”, de acordo com ofício encaminhado à Superintendência Regional do Sul do Pará. No documento enviado hoje pela PFDC, os procuradores recomendam que a Comissão de Ética Pública impeça “que procedimentos administrativos sejam instaurados só pelo fato da participação de servidores públicos em debates e reuniões públicas”.
Ao fundamentar o pedido feito à Comissão de Ética, os procuradores citam que os servidores públicos não estão impedidos, nem pela Constituição, nem pela Lei 8.112 (regime jurídico dos funcionários públicos federais), de participar de discussões públicas e de informar ao público questões fundamentais pertinentes ao assunto em debate.
“Atitudes como a do secretário especial Nabhan Garcia, tanto no momento da audiência, como pela determinação de instauração de procedimento administrativo, têm o potencial de inibir outros servidores a participar, com o conhecimento acumulado no cargo, de debates que envolvam matéria pertinente aos seus órgãos ou instituições, com grave prejuízo para a democracia e para a República”, citam os procuradores.
Além disso, citam os procuradores, o código de ética do servidor federal diz que “toda pessoa tem direito à verdade. O servidor não pode omiti-la ou falseá-la, ainda que contrária aos interesses da própria pessoa interessada ou da Administração Pública”. O código também veta o uso de cargos públicos a “permitir que perseguições, simpatias, antipatias, caprichos, paixões ou interesses de ordem pessoal interfiram no trato com o público, com os jurisdicionados administrativos ou com colegas hierarquicamente superiores ou inferiores”, relata a PFDC.
Entidades emitem nota de repúdio contra Nabhan
O assédio sofrido pela servidora do Incra no Sul do Pará, Ivone Rigo, levou à junção de entidades representativas de trabalhadores para emitirem nota de repúdio e convocar os trabalhadores do órgão para se mobilizarem, no dia 16 de março de 2020, contra agressões praticadas por gestores.
De acordo com a nota de repúdio emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Federal no Estado do Pará (Sintsep-PA), Associação dos Servidores do Incra no Pará (Assincra-PA) e Associação Nacional dos Servidores Públicos Federais Agrários (Cnasi-AN) os trabalhadores e trabalhadoras do Instituto, bem como suas entidades associadas regionais, devem realizar “um dia de mobilização CONTRA O ASSÉDIO MORAL INSTITUCIONAL NO SERVIÇO PÚBLICO – por meio da realização de paralisações, atos, assembleias, rodas de conversa, dentre outras atividades. Este ato deve ser uma preparação para a paralisação geral dos trabalhadores do Serviço Público, contra os ataques e retirada de direitos, marcada para dia 18 de março de 2020”.
De acordo com as diretorias das entidades, a nota de repúdio e a convocação dos atos são uma resposta à dupla agressão sofrida pela servidora, uma execração, ocorrida durante audiência pública – realizada no dia 10 de fevereiro de 2020, na Câmara Municipal de Marabá (PA) -, e protagonizada pelo secretário Especial de Assuntos Fundiários, Luiz Antônio Nabhan Garcia. O “vice-ministro” ficou visivelmente irritado no evento pelo fato da geógrafa Ivone Rigo ter feito questionamentos e cobranças sobre melhoria das condições de trabalho na autarquia.
A irritação legou Nabhan a determinar abertura de investigação da conduta da servidora – o que foi prontamente atendido pelo superintendente substituto do Incra no Sul do Pará, João Itaguary Milhomem Costa. Este, ainda emitiu nota justificando o ato.
O caso de assédio ganhou destaque nacional entre os servidores do Incra, pois houve indignação imediata à agressão. A imprensa paraense até noticiou a audiência e a investigação pela comissão de ética do Incra.