A Promotoria de Justiça de Santarém, por meio de promotores de Justiça designados para atuar conjuntamente no processo relacionado às queimadas em Alter do Chão, ocorridas em setembro de 2019 e que resultou na prisão de quatro brigadistas, manifestou-se nesta sexta-feira (13 de dezembro), perante ao Juízo da 1ª Vara Criminal, pelo não acolhimento do pedido de declínio de competência do feito para a Justiça Federal, Subseção Judiciária de Santarém, postulado pelo Ministério Público Federal. O juiz acatou e já divulgou na tarde desta sexta-feira, decisão pela manutenção da competência na esfera estadual.Em relação ao pedido de acesso aos autos feito pelo MPF, o MPPA não se opôs, em respeito ao livre exercício da independência funcional dos seus membros, sem prejuízo da continuidade da regular tramitação do feito perante o Juízo Estadual.
Na manifestação o MPPA justifica seu posicionamento, e destaca que o MPF pretende que seja reconhecida a incompetência do juízo estadual para a causa, sob fundamento exclusivo na dominialidade da União em relação ao bem imóvel atingido pelo incêndio, acrescentando que há inquérito policial instaurado pela Polícia Federal para apurar o mesmo fato, bem como que existem processos na Justiça Federal sobre outros supostos crimes ambientais, também ocorridos na APA Alter-do-Chão.
De acordo com o MPPA, embora a APA Alter-do-Chão esteja inserida na Gleba Federal Mojuí dos Campos, e em parte, também no Projeto de Assentamento Agroextrativista Eixo-Forte administrado pelo Incra, a APA foi criada pelo Município de Santarém, por meio da Lei nº 17.771/2003, e está inserida no Cadastro Nacional de Unidades de Conservação, do Ministério do Meio Ambiente.
Leia mais:A própria União, portanto, por meio do Ministério do Meio Ambiente, reconhece que o órgão gestor, ou seja, aquele que administra a APA Alter-do-Chão, no que diz respeito à conservação, concessão de autorizações/licenças, fiscalização primária e outros, é o Município de Santarém, responsável direto pela proteção ao meio ambiente na APA, cuja atuação não se confunde com a defesa do patrimônio, ou seja, do domínio da União em relação à área. “Pode-se afirmar, portanto, que a União reconhece, como de fato e de direito declara em seu Cadastro Nacional, que o Município é quem possui a “competência” ambiental para gerir a APA Alter-do-Chão”, ressalta.
Em questionamento ao Ibama em relação à fiscalização de atividades e empreendimentos localizados dentro da APA Alter-do-Chão, foi informado que compete à Secretaria de Meio Ambiente Municipal de Santarém, pois a APA não está em país limítrofe, mar territorial brasileiro ou entre dois ou mais Estados. Afirmou ainda que a gestão da Unidade de conservação compete ao ente federativo que a criou, competindo ao Município de Santarém a concessão de licenciamento ambiental dentro da APA.
Para reafirmar a ausência de interesse direto da União do que diz respeito à proteção ao meio ambiente da APA de Alter-do-Chão, o Ibama afirmou que o município de Santarém é o “ente principal responsável pela fiscalização”, podendo solicitar apoio ao Ibama (União) ou à Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado do Pará. Nos últimos cinco anos, o Ibama somente lavrou um auto de infração decorrente de sua fiscalização na APA de Alter-do-Chão, no ano de 2016.
A Secretaria de Meio Ambiente de Santarém, por sua vez, confirmou que a municipalidade é a responsável pela concessão de licenciamento ambiental da APA Alter-do-Chão e encaminhou relação de empreendimentos licenciados pela Secretaria. Quanto à fiscalização, esclareceu que a competência é comum, e forneceu cópias de autos de infração referentes a infrações ocorridas na APA.
Como consequência da atuação do Município de Santarém na proteção ao meio ambiente na APA Alter-do-Chão, os encaminhamentos de autos de infração ambiental ao Ministério Público Estadual resultaram, em vários casos, na deflagração de processos criminais ambientais contra os infratores perante a Justiça Estadual em Santarém.
Assim, entende o MPPA, a Justiça Estadual em Santarém firmou sua competência para julgar crimes ambientais ocorridos na APA Alter-do-Chão em vários processos judiciais, sem que tenha havido qualquer pedido voluntário de declínio de competência por parte do Parquet federal. O MPPA juntou na manifestação cópias de autos de infração e jurisprudência de casos assemelhados.
Em relação ao argumento da dominialidade, em que pese a área atingida pelo incêndio integrar patrimônio da União, as regras legais que definem a atuação para proteção ao meio ambiente não se restringem a esse conceito, o que é justificado na manifestação. Para o MPPA, retirar completamente a possibilidade de trabalho investigativo das instituições que advogam em prol do interesse local ambiental, fragiliza qualquer tentativa de proteção plena do meio ambiente.
O interesse territorial, como justificativa apresentada pelo MPF para motivar o encaminhamento de todo o trabalho investigativo para o âmbito federal de forma exclusiva, “é microscópico diante da importância das funções sócio-ambientais que informam a necessidade de atuação das instituições que velam pela proteção dos interesses locais”, argumenta.
O MPPA ressalta que não está sob discussão o direito patrimonial da União sobre a área objeto de apuração, pois não é caso de invasão ou ocupação de terras, de alteração de limites, ou de reinvindicação de domínio, em relação a área atingida pelo incêndio. “O crime ambiental em apuração ofendeu diretamente interesse local – Município de Santarém. A eventual ofensa à União em decorrência desse fato à afeta apenas indiretamente, o que não faz atrair a competência da Justiça Federal”, conclui. (Ascom/MPPA)