Pesquisa Datafolha feita no início de dezembro mostra que 52% dos brasileiros avaliam que a inflação subirá nos próximos meses, maior percentual desde o levantamento de agosto de 2018 (54%).
A piora na expectativa de inflação dos entrevistados se dá em um momento em que o IPCA (índice de preços ao consumidor do IBGE) voltou a subir por conta de itens como carnes e combustíveis.
Na pesquisa anterior, feita no final de agosto deste ano, 46% afirmaram que a inflação iria subir. Em dezembro de 2018, 27% esperavam que os índices de preços aumentariam, patamar mais baixo já registrado em um levantamento Datafolha, considerando o período que tem início em dezembro de 1994.
Leia mais:O percentual de pessoas que avaliam que a inflação irá cair passou de 20% em agosto para 17% em dezembro. Para 27%, a inflação ficará estável. Eram 30%, em agosto.
No levantamento, as pessoas foram questionadas se, na opinião delas, a inflação vai aumentar, vai diminuir ou vai ficar como está daqui para frente. Foram realizadas 2.948 entrevistas, nos dias 5 e 6 de dezembro, em 176 municípios. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos, dentro do nível de confiança de 95%.
O comportamento da inflação é um dos argumentos usados pelo Banco Central para reduzir a taxa básica de juros. Nesta quarta (11), o Copom (Comitê de Política Monetária) deve reduzir a Selic de 5% para 4,5% ao ano e pode indicar se será o último corte do ciclo iniciado em julho deste ano.
Depois de seis meses de inflação de 0,10% ao mês, em média, o índice de preços subiu 0,51% em novembro. Cerca de 40% da alta foi reflexo do aumento da carne bovina. Para dezembro, as expectativas são de um IPCA de 0,70%.
A inflação acumulada em 12 meses continua em níveis historicamente baixos (3,27% até novembro) e deverá fechar 2019 e 2020 abaixo de 4%, algo que só aconteceu três vezes (2006, 2017 e 2018) desde que o país adotou o regime de metas de inflação, há 20 anos.
Apesar da queda na cotação da arroba do boi nas últimas semanas, o preço da carne bovina para o consumidor pode ter em dezembro alta maior do que a verificada em novembro e se manter elevado até o segundo trimestre de 2020, segundo estimativas de analistas do mercado financeiro.
Em novembro, o preço da carne bovina subiu 8%.
Essa alta, somada ao aumento de preços de outros alimentos e dos combustíveis, principalmente do etanol, deve manter a inflação medida pelo IPCA nos maiores níveis em quatro anos até fevereiro do próximo ano, segundo projeções dos analistas consultados pelo Banco Central na pesquisa semanal Focus.
Espera-se, no entanto, que o índice de preços volte a recuar e termine 2020 abaixo da meta perseguida pelo BC, de 4%, sem que haja necessidade de aumentar os juros.
Após a divulgação do IPCA de novembro, que veio acima do previsto, os analistas consultados pelo BC revisaram a projeção de inflação de dezembro de 0,48% para 0,70%. A estimativa para o fechamento do ano subiu de 3,52% para 3,84%. Não houve mudança na expectativa para o fechamento de 2020 (3,60%), o que reflete a avaliação de que o IPCA irá desacelerar ao longo do próximo ano.
Os analistas também mantiveram a perspectiva de que o Copom vai manter 4,5% no próximo ano.
O preço da carne tem sido influenciado por diversos fatores, como a seca que prejudicou o pasto e afetou a engorda de bovinos, a falta de investimentos por causa dos preços estáveis nos últimos anos, e, principalmente, o aumento da demanda da China.
“Esse efeito das carnes na inflação tende a perdurar no primeiro trimestre, talvez no segundo trimestre, com a manutenção dessa alta dos últimos tempos até que esses efeitos se encerrem”, diz Daniel Linger, estrategista da RB Investimentos.
“Em 2020, a pressão [de alta] vai se dissipar, vai estabilizar em um patamar alto, mas não vai devolver toda a alta que a gente viu nesse ano”, diz Luis Otavio Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil. Ele afirma que, dos componentes do tradicional PF (prato feito), só o arroz está mais barato, o que explica a alta do item alimentação fora de casa do IPCA.
Além da carne, houve forte alta do feijão no atacado, que já começou a chegar ao varejo, e reajustes de outras proteínas, por conta da substituição dos bovinos. Também se espera para janeiro e fevereiro, a depender das chuvas, aumento de hortifrutigranjeiros.
Outro item do campo que tem pressionado a inflação é o álcool usado como combustível. O preço do etanol hidratado nas usinas de São Paulo passou de R$ 2 por litro pela primeira vez na série histórica de preços do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada).
Embora as notícias sejam ruins para o consumidor, os números não são considerados um choque inflacionário, afirma Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset, que projeta um IPCA de 0,85% em dezembro, recuando praticamente à metade em janeiro.
Para ele, a alta dos preços é mais um fator que deve levar o BC a não reduzir mais a taxa básica (Selic) no próximo ano, quando o país irá conviver com patamares baixos inéditos de juros e inflação.
Luis Otavio Leal, do ABC Brasil, afirma que, por enquanto, a alta da inflação é um choque de oferta e que o BC só age, nesses casos, quando há efeitos colaterais que geram repasses para outros preços.
“Se o próprio mercado acha que é um choque concentrado, não vejo motivo para o BC se preocupar com isso no curto prazo. Apenas diminuiu a chance de os juros irem abaixo de 4,5%”, afirma Leal.
“Não vejo pressão inflacionária por questão de demanda”, afirma Daniel Linger, da RB Investimentos. (Folha de São Paulo)