“Uma flor no cabelo / Uma boca pintada / Uma saia rodada / E pé no chão / Faz lembrar o que? / Faz lembrar o que? / Carimbó de Lucindo, de Celé e de Verê”.
O figurino e a voz são de uma quase ‘oitentona’ que nos próximos dias vai levar o carimbó para Austrália, Tailândia e Estados Unidos. Dona Onete, cantora paraense de Cachoeira do Arari, cidadezinha no meio da Ilha do Marajó, ganhou fama e holofotes depois de ter passado uma vida inteira como professora de história.
“Quando eu completar 80 anos, tenho nove pra dez anos de história. Fui fisgada por um grupo de rock que andou atrás de mim até que eu concordei. E fiz a minha história aos 71, 72 anos com esse grupo de rock. [A sua vida começou de novo nesse momento?] Começou de novo. Eu já estava separada do marido, eu já tinha outro marido e esse fazia todas as vontades, gostava de me ver cantar. Ele me ajudou muito. Eu pensei que talvez como compositora tivesse alguma oportunidade, mas não como cantora”, conta.
Leia mais:Como a Dona Ionete da Silveira Gama, o Brasil tem outros 29 milhões de pessoas acima de sessenta anos. Em 2060, eles serão 73 milhões. Um crescimento de 152% em 40 anos nas projeções do IBGE. Se hoje 13 a cada 100 brasileiros têm 60 anos ou mais, no ano de 2060 eles serão 32 a cada 100. É justamente por isso que os especialistas dizem que a pirâmide brasileira está invertendo. Nos anos 1970, essa faixa etária não batia os 5 milhões de pessoas. Eles eram cinco a cada 100.
Mas será que estamos preparados para essa inversão? Para envelhecer como país?
Ao longo da semana você vai entender como os números provam as mudanças no país. Os universitários sessentões cresceram, os hospitais tiveram que se adaptar para receber pacientes mais velhos e com necessidades especiais, o Brasil depende como nunca do INSS e as senhoras e senhores têm a maior fatia dos papéis bilionários da bolsa de valores de São Paulo.
Mas mesmo quem entende do assunto, discorda sobre o futuro do nosso país. Na opinião do especialista em longevidade e professor da FESP, Jorge Félix, um erro do passado virou pedra no sapato.
“O Brasil cometeu nos últimos anos, quase um ‘haraquiri’ em termos de industrialização. Ele optou por um caminho da ‘desindustrialização’. E a economia da longevidade é uma estratégia de industrialização. Por que isso é importante? Porque as famílias vão consumir esses produtos e esses produtos tendem a ter um grande valor agregado, porque são produtos de alta tecnologia”, diz.
Jorge se refere à adaptação da indústria que olhe para o grande público consumidor de 60 ou mais que virá por aí. O Brasil está ficando mais velho por uma série de motivos, como a redução da mortalidade a partir da década de 40 com o uso de antibióticos e a melhora no saneamento básico da população, além dos avanços da medicina que prolongam a expectativa de viver mais. Também contribuiu a decisão dos casais que escolhem ter menos filhos ou simplesmente não tê-los aproveitando-se dos métodos anticoncepcionais, que também foram se aprimorando.
Mas é justamente na saúde que virá a fatura, como explica o diretor científico da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, Renato Bandeira de Mello.
“Há uma tendência de um grande número de indivíduos doentes necessitando de atenção mais complexa, cuidados mais complexos na assistência à saúde. Se nós não mudarmos o modelo, não mudarmos o pensamento pra um caráter mais preventivo, talvez tenhamos que enfrentar altas cargas de doença numa população mais vulnerável nessa época”, diz.
No segundo episódio da série, você ouvirá os exemplos bons e ruins, dos países que já estão mais velhos. (Fonte: CNB)