Irresponsabilidade da Prefeitura de Marabá e do Estado do Pará custou um rim a Lineia de Almeida Campos, que ao final de 2017 moveu ação indenizatória por danos materiais e morais após ter sido encaminhada três vezes para uma cirurgia que nunca ocorreu. Em decorrência da demora de quase seis meses no tratamento o quadro se agravou e o órgão sofreu obstrução irreversível.
Ao analisar o caso, a juíza Maria Aldecy de Souza Pissolati, titular da 3ª Vara Cível e Empresarial, condenou as administrações municipal e estadual a pagarem R$ 50 mil a título de indenização à paciente. Segundo Lineia apresentou na ação, ela foi diagnosticada com cálculo renal bilateral, tendo sido recomendada uma intervenção cirúrgica em um dos rins.
Em decorrência disso, foi encaminhada para realizar o tratamento em Belém. Na primeira vez que esteve na cidade a intervenção não foi realizada devido a falta de material. Ela retornou uma segunda vez, mas uma falha comunicativa entre estado e município e na observância do protocolo administrativo impediu a cirurgia. Na terceira vez que ela foi a Belém o médico responsável entendeu não dispor de meios para realizar o procedimento e a encaminhou para outra clínica.
Leia mais:A demora acabou piorando o estado de saúde da paciente, que perdeu o rim. Na ação, ela juntou inúmeros documentos médicos, demonstrando a necessidade do procedimento e a demora relatada. Ao se defender, o estado afirmou que não se omitiu e que prestou o serviço de modo adequado, “sendo que não foi demonstrada negligencia médica pelos agentes estatais”.
Mencionou, ainda, que a paciente é leiga e que não teria apresentado documento com cientificidade que comprove inadequação dos procedimentos adotados pelos agentes do estado e que não há elementos que evidenciem falha atribuída ao Estado.
Já o município mencionou o contexto da saúde municipal, alegando que esta funciona como polo regional para outras cidades e outros estados. Afirmou, ainda, que não contribuiu para o evento, tendo agido conforme os preceitos do Sistema Único de Saúde (SUS), não podendo ser responsabilizado por intercorrências médicas que não se deram em órgão integrante de sua estrutura. Juntou, ainda, documentos de atendimentos da paciente nas unidades municipais de saúde e outros documentos administrativos e médicos relacionados ao caso.
DECISÃO
Em sentença, a juíza ressaltou que a inutilização de órgão ou função em razão da demora na realização de intervenção cirúrgica pelo Poder Público, inclusive no caso de cálculo renal, caracteriza omissão específica, ensejando a responsabilização com base na teoria do risco administrativo.
No caso em questão, ressalta, a paciente foi diagnosticada com cálculo renal e diversos documentos médicos demonstram que havia a necessidade de realização do procedimento para extração do cálculo renal, mas por falha administrativa, por mais de uma vez, o ato foi adiado. Conforme a decisão, Lineia passou cerca de um e seis meses aguardando a realização do procedimento até que recebeu o diagnóstico de que órgão teria deixado de funcionar.
Destacou que a falha na comunicação entre os órgãos municipais e estaduais foi o que provocou o embaraço na realização do procedimento, de modo que ambos devem responder pela omissão. A juíza afirma que a responsabilidade é solidária, uma vez que é impossível separar a conduta dos entes – estadual e municipal – que concorreram para a falha igualmente.
“Um deixou de seguir o protocolo administrativo indicando os exames necessários e outros documentos médicos para serem apresentados no ato de realização do procedimento e o outro não poderia ter deixado faltar material para realização de procedimentos ou pior, não poderia deixar de realizar o procedimento em virtude do impasse com os profissionais e hospitais conveniados com relação a valores”, diz a sentença.
Por fim, entendeu que nesta situação, além da perda do rim, deve ser levado em conta o martírio de todas idas e vindas para hospitais públicos para realizar a intervenção que não ocorreu. As duas partes foram condenadas ao pagamento de R$ 50 mil, corrigidos pelo IPCA-E, desde o arbitramento, e juros de mora de 0,5% ao mês, da data do evento danoso. (Luciana Marschall)
SAIBA MAIS
Procurada, a assessoria de comunicação da Prefeitura Municipal de Marabá informou que a Procuradoria Geral do Município (Progem) vai apurar o caso junto aos órgãos de controle da saúde para depois se posicionar. A assessoria do Governo do Estado não retornou resposta até o fechamento desta edição.