A união de forças entre órgãos públicos e a sociedade civil marcou a audiência pública realizada pelo programa Ministério Público pela Educação (MPEduc) nesta quinta-feira (27) em Itupiranga (PA). O evento consolidou um importante compromisso colaborativo entre o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), a gestão municipal e a população para diagnosticar desafios e construir soluções conjuntas pela melhoria da qualidade do ensino no município.
O encontro, que contou com cerca de 250 participantes, destacou-se pelo diálogo aberto na busca por caminhos para a educação básica, com foco na resolução consensual de problemas. A mesa do evento refletiu essa integração institucional: o MPF foi representado pelas procuradoras da República Bruna Menezes Gomes da Silva, Gabriela Puggi Aguiar e Isadora Chaves Carvalho; o MPPA contou com a presença do promotor de Justiça Aleixo Nunes Gonçalves Neto; e, pelo município, participaram a secretária de Educação, Rosânia do Nascimento de Lucena, e a procuradora-geral do município, Paula Carolina dos Santos Corrêa.
Diagnóstico e planejamento pedagógico
Leia mais:A audiência serviu para alinhar expectativas sobre o calendário escolar e o aprendizado. A escolha de Itupiranga para o MPEduc deveu-se, segundo a procuradora da República Bruna Menezes, ao baixo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) registrado pelo município e às complexidades rurais da região.
Houve avanços e metas apresentados: a secretária de Educação destacou um aumento na alfabetização na idade certa, que subiu de 42% para 60%. Para o futuro, a gestão firmou o compromisso de iniciar o ano letivo de 2026 em fevereiro, garantindo 200 dias letivos sem a necessidade de aulas aos sábados.
O debate também abordou as dificuldades do calendário de 2025, que se iniciou tardiamente em março e tem encerramento previsto para 19 de dezembro. Pais e educadores, como o vereador Mateus Barros e o professor Jordão Martins, expressaram preocupação com possíveis perdas pedagógicas. A Secretaria Municipal de Educação (Semed) explicou que o atraso ocorreu devido à necessidade de reparos emergenciais em 80% das escolas e na frota de ônibus, mas assegurou que o calendário foi aprovado pelo Conselho Municipal de Educação.
Gestão de recursos e obras
Um dos pontos centrais da cooperação foi a análise de obras paralisadas e o uso de recursos de gestões anteriores, visando destravar investimentos. A atual gestão busca orientação do Ministério Público para utilizar legalmente cerca de R$ 900 mil recebidos em 2025 para finalizar uma Escola de Tempo Integral. A obra, licitada por R$ 1,3 milhão, teria recebido pagamentos superiores a R$ 1,5 milhão em 2024, mas foi encontrada inacabada e com a conta zerada.
Outras frentes de trabalho envolvem a regularização de creches financiadas pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Foram citados os casos do distrito de Cruzeiro do Sul, onde 15% da medição foi paga embora existisse apenas o terreno, e de Cajazeiras, onde a prefeitura precisou usar recursos próprios para refazer a estrutura de uma obra que constava como 70% concluída, mas estava em ruínas.
Infraestrutura, merenda e segurança
A parceria visa também qualificar o ambiente escolar. A secretária Rosânia Lucena informou a compra de cem novas centrais de ar-condicionado, enfrentando o desafio sistêmico de adequar a rede elétrica das escolas, que muitas vezes não suporta a carga dos equipamentos. Demandas por melhorias no abastecimento de água, como a troca de caixa d’água na Vila Beija-Flor e a instalação de filtros na Escola Canaã, foram registradas.
Sobre a alimentação escolar, a meta estabelecida é aumentar a compra da agricultura familiar para 40% em 2026, visando diversificar o cardápio que, segundo a presidente do Conselho de Alimentação Escolar (CAE), Jurani Lisboa, e relatos da comunidade, ainda carece de variedade em alguns locais.
A segurança e o respeito aos profissionais da educação também entraram na pauta de colaboração. Gestores escolares como Acácio Gomes Neto e Antônio Mauro relataram situações graves, incluindo ameaças, e solicitaram apoio do Ministério Público para ‘moralizar’ o ambiente escolar e conter a agressividade.
Inclusão e educação escolar indígena
O fortalecimento da educação escolar indígena e da educação inclusiva foi outra prioridade debatida. Wero Parakanã, coordenador de Educação Indígena, cobrou a construção de prédios próprios, poços artesianos e alojamentos na Terra Indígena Parakanã, onde as escolas funcionam majoritariamente em anexos. O MPF também exigiu garantia de atendimento especializado e monitores para alunos com deficiência.
Comunidade Diamante
Como parte fundamental deste pacto pela educação, as instituições voltaram atenção especial para a situação crítica da comunidade ribeirinha do território Diamante, no Igarapé Vermelho. O caso foi tratado como prioridade para resolução urgente por meio da articulação entre os órgãos.
Os moradores trouxeram à audiência as dificuldades extremas enfrentadas: a escola funciona em um barracão de madeira, sem ventiladores ou poço artesiano, e com um banheiro instalado apenas após protestos da comunidade na BR-230. Foi relatado o caso de uma criança com autismo sem suporte adequado e a dificuldade de acesso, com alunos caminhando até cinco quilômetros em vias perigosas por falta de transporte e estradas.
Para resolver o impasse jurídico que impede a prefeitura de realizar obras no local devido a uma disputa de terras, o MPF, por meio da procuradora da República Gabriela Puggi Aguiar, esclareceu que a área é terreno de marinha e os moradores possuem Termos de Autorização de Uso Sustentável (Taus).
Como encaminhamento prático e imediato dessa nova parceria, o MPF propôs uma reunião entre o município, o MPPA e a Superintendência do Patrimônio da União (SPU). O objetivo é solucionar a questão fundiária e viabilizar a construção de uma escola digna.
Próximos passos
O MPF, que pelo MPEduc também está fazendo visitas a escolas de Itupiranga nesta quinta e sexta-feira, expedirá recomendações formais baseadas no diagnóstico conjunto da situação da educação no município. Uma segunda audiência pública já ficou agendada para junho de 2026, momento em que a gestão municipal prestará contas das ações realizadas, consolidando o ciclo de melhoria contínua proposto pelo projeto.
MPEduc
O Ministério Público pela Educação (MPEduc) é um programa coordenado pela Câmara de Direitos Sociais e Fiscalização de Atos Administrativos do MPF (1CCR). O principal objetivo da iniciativa é verificar se as políticas públicas voltadas para a educação básica estão sendo cumpridas pela rede escolar. Para isso, o Ministério Público realiza audiências com a comunidade, aplica questionários, promove reuniões e visita pessoalmente as escolas. Com base nessas informações, são feitas recomendações para que as prefeituras e gestores locais melhorem o que for necessário. Tudo é acompanhado de perto pelo Ministério Público, que depois presta contas à sociedade sobre o que foi feito e os resultados alcançados. Saiba mais pelo site https://mpeduc.mp.br.
