Correio de Carajás

Empreendedor digital aposta no mercado marabaense para emplacar negócios

Proprietários de pequenos negócios revelam estratégias que fizeram seus negócios dispararem a partir da pandemia da covid-19

Em Marabá, empreendedores locais ganham protagonismo no universo digital e desafiam o tradicional com criatividade e estratégia/Foto: Evangelista Rocha, editada com IA

Se o mundo dos negócios for uma rede Wi-Fi, há muito tempo o sinal deixou de ser exclusivo das grandes empresas. Em Marabá, cidade às margens dos rios Tocantins e Itacaiunas, no coração da Amazônia paraense, essa conexão alcança novas mãos: as de uma geração de empreendedores que vêm reconfigurando suas vidas a partir do código-fonte da internet.

Na era da conectividade, o Brasil se posiciona como um terreno fértil para o empreendedorismo digital, por isso, dados do Statista podem ser o start para quem quer apostar no comércio eletrônico até 2027. A pesquisa prevê um crescimento anual estimado em 14,6%.

Esse cenário vibrante é impulsionado por uma combinação de fatores que remonta à popularização da internet móvel nos anos 2000. De acordo com o IBGE, em 2023 esse tipo de conexão era utilizado em 92,5% dos domicílios brasileiros. Além disso, foi durante a pandemia de covid-19, quando a população ficou em casa, que houve uma acelerada digitalização dos negócios.

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Naquele período, muitos dos estabelecimentos que precisaram fechar as portas para o atendimento ao público, passaram a realizar vendas pelas redes sociais. O resultado disso foi um boom no segmento e-commerce, movimentando mais de R$ 196 bilhões em 2023. Quem aponta esses dados é o Observatório do Comércio Eletrônico Nacional, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).

Em meio a essa onda de “revolução econômica digital”, histórias como a de Aenos Nascimento, de 37 anos, em Marabá, ilustram o sucesso de empreendimentos que nasceram e prosperam no ambiente virtual. Simpático, sorridente e esbanjando disposição, há cerca de um ano ele decidiu largar o emprego CLT e deu start na “Bravo Store”, sua loja online de importados, eletrônicos e acessórios.

 

“Na hora e no lugar mais conveniente para você”

 

Sem loja física, sem vitrine de vidro, o ponto de vendas de Aenos é móvel e cabe no bolso. Ele opera sob um princípio simples: a conexão feita no digital cria raízes no mundo real.

“Eu acredito que as pessoas gostam de um atendimento personalizado. E ir até o cliente, ter aquele contato mais corpo a corpo é importante. Às vezes a pessoa não pode se deslocar até uma loja, mas gosta de um tratamento sob medida e é isso que nós fazemos”, afirma com vigor.

Para ele, a força que move a Bravo está enraizada em um conceito autêntico: “É na hora e no lugar mais conveniente para você”. Isso porque o modelo de vendas adotado por Aenos não é convencional em Marabá.

Aenos Nascimento leva seu estoque até o cliente, unindo a praticidade digital à proximidade do atendimento pessoal/ Foto: Evangelista Rocha

Ainda que muitas empresas realizem a venda pelas redes sociais, as entregas são realizadas por motoboys ou mototaxistas parceiros. Mas na Bravo o sistema operacional é diferente. É o próprio Aenos quem vai até o cliente não apenas para entregar seu pedido, mas levando consigo uma parte do estoque, para que o comprador possa analisar e escolher seu produto com maior segurança e comodidade.

É o próprio Aenos quem observa que a correria do dia a dia do marabaense gerou uma necessidade que o comércio digital consegue suprir com eficiência. “É por isso que temos crescido muito, porque hoje, em Marabá, a gente chegou em um nível que as pessoas estão muito corridas, então, há uma necessidade (de atendimento) que precisa ser suprida”, explica o fundador da Bravo Store, deixando subentendido que o digital ainda tem fôlego de sobra para expansão.

Quem corrobora a visão de Aenos é William Cavalcante, de 25 anos, sócio-fundador da AnonMedia, agência de marketing digital. Para ele, a presença online é indispensável para empresas. Esse pensamento está alinhado com o serviço desenvolvido e oferecido pela AnonMedia e ele explica por que esse caminho funciona.

“A exploração de estratégias digitais de marketing faz com que as pessoas se relacionem com a marca, se conscientizem sobre ela e decidam consumi-la. No final, elas se tornam clientes fiéis àqueles negócios”, observa William.

William Cavalcante e Mikaellen Gonçalves, da AnonMedia, combinam estratégia online e constante presença para fortalecer marcas locais/ Foto: Evangelista Rocha

A pandemia foi um divisor de águas para o mercado, confirma ele, ao destacar como o momento acelerou a conscientização das marcas sobre a necessidade de posicionamento digital. Foi nesse cenário que surgiu a AnonMedia. A agência foi fundada por ele, com atuação 100% online no início. Hoje, ao lado da sócia Mikaellen Gonçalves, William administra um espaço físico da agência, localizado na Folha 16, no Núcleo Nova Marabá.

“Durante a pandemia, a gente teve uma evolução. Conseguimos mostrar para as marcas o quanto é importante estar presente no digital”, conta Mikaellen.

As observações de William e Mikaellen deixam claro que no coração do empreendedorismo digital está a necessidade de ser visto, lembrado e escolhido. Principalmente no ambiente das redes sociais, onde a atenção é disputada a cada segundo. Por causa disso, para empresas que estão apenas no mundo físico, construir uma presença online deixou de ser um diferencial e passou a ser questão de sobrevivência para marcas e negócios.

É aí que entra o marketing digital, como ferramenta estratégica que aproxima empresas de pessoas, constrói relações de confiança e impulsiona resultados reais. Do contrário, cada vez mais empreendimentos digitais irão aparecer e captar clientes de quem ainda não embarcou nessa “nova revolução industrial”.

  

Inovação, capacitação e presença  digital: pilares dos negócios digitais

 

Para Aenos Nascimento, o pontapé inicial de seu negócio digital veio de um investimento estratégico do seu acerto ao sair de uma empresa de telefonia. Consequentemente, ele ressalta a importância de observar as necessidades do público e a pesquisa de distribuidores de mercadoria antes de fazer o aporte financeiro.

“Comecei a observar os fornecedores, a ir em alguns lugares, conversar com outros amigos (do mesmo ramo). E só então, peguei esse valor que eu tinha guardado e investi nos produtos”, relembra.

Além disso, a busca por capacitação também foi fundamental para Aenos. Ao perceber essa carência, ele fez a inscrição e participou de cursos no Sebrae. O destaque é para uma formação sobre empreendedorismo, que o ajudou a entender a importância de saber injetar recursos e a observar o cliente para não apostar em algo sem saída.

Nádia Rodrigues e o José Airton, facilitadores do Sebrae em Marabá, reforçam a importância do apoio a empreendedores em meio à era da digitalização. Eles destacam que o Sebrae trabalhou intensamente durante a pandemia para suprir as necessidades de vendas dos empreendedores, oferecendo lives e rodadas de negócios digitais.

Nádia Rodrigues e José Airton, do Sebrae, destacam o apoio ao empreendedorismo digital em Marabá como força para expandir negócios/ Foto: Evangelista Rocha

“Naquele período de isolamento, nós percebemos que o mundo digital inundou o mundo presencial. Hoje, o empreendedorismo digital é uma forma das empresas se diferenciarem”, afirma Nádia. Para José Airton, o mercado online é “um caminho sem volta”, onde a inovação é essencial.

O digital, portanto, não é apenas uma vitrine, é uma engrenagem de crescimento sustentável para quem souber usá-la. Esse avanço constante cria um novo ritmo para quem empreende: mais dinâmico, mais conectado e, sobretudo, mais desafiador. Nesse cenário, compreender as engrenagens do ambiente digital não é apenas uma vantagem competitiva, é parte da estrutura que sustenta os novos modelos de negócio e os impulsiona a escalar com agilidade.

 

 Caminhos que separam (e aproximam) o empreendedorismo digital do tradicional

 

Ao mudar o rumo da sua carreira profissional com a Bravo Store, Aenos Nascimento reflete que o empreendedorismo digital o tem ensinado a ser persistente. Ele observa que o cliente digital é diferente do cliente presencial, pois “ele vai muito pelo que visualiza”. Isso exige uma constância nas postagens de novidades e a criação de stories criativos, pois “hoje o digital é aquilo que você vê”. Nesse contexto, inovar é também se reinventar diariamente.

Para percorrer esse labirinto desconhecido, a estratégia comercial de Aenos entrelaça a facilidade do digital com o calor humano do atendimento presencial. “Eu acho que é essa é a raiz do meu diferencial”, afirma, ao explicar que ele mesmo faz a entrega e o atendimento, adaptando-se ao horário e local mais conveniente para o cliente, seja no trabalho ou em casa.

A manutenção dessas duas vias é o que Rogério Machado, professor do curso de Administração da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), destaca que as empresas digitais se distinguem por suas estratégias multicanal (redes sociais, e-mail, chatbots) e a priorização da automação e ferramentas on-line. E assim é criado um contraste com as operações mais manuais das empresas tradicionais.

Rogério Machado, da Unifesspa, analisa o papel da escalabilidade e inovação que o modelo digital oferece /Foto: Ulisses Pompeu

Contudo, empreendedores digitais acabam se sobressaindo. Rogério ressalta que eles são mais abertos a mudanças e testes de novas tecnologias, como a inteligência artificial e a realidade virtual.

“Nos negócios tradicionais existe uma tendência mais conservadora. É interessante a gente falar, quando comparamos as duas coisas que, pelo menos no meu ponto de vista, não existe o melhor ou pior. Acho que é interessante observarmos quais as vantagens e as desvantagens e, também, a natureza de cada negócio”, analisa.

No entanto, ele reforça que o empreendedorismo digital é uma realidade crescente, facilitado por plataformas como Hotmart e lojas virtuais, que impulsionam pequenos empreendedores. E o empreendedorismo digital, quando bem-feito, pode ser o que faltava para quem quer ter seu próprio negócio.

 

Empreendedorismo digital: poderoso, escalável e cheio de possibilidades

 

Conscientes sobre a revolução digital, mas ancorados nas raízes do marketing, William Cavalcante e Mikaellen Gonçalves, da AnonMedia, aconselham que, mesmo para negócios que nascem on-line, é crucial não negligenciar as estratégias tradicionais.

William sugere que os empreendedores comecem com aquilo que têm segurança para fazer sozinhos. Ao crescerem, eles devem procurar um time capacitado para delegar funções. “Você foca naquilo que é importante para sua empresa expandir: a administração financeira, as estratégias. Assim, você tem esse olhar mais voltado para esse lado, enquanto possui um time gerenciando as outras demandas (marketing) para você”, aconselha William.

A AnonMedia também adverte que as redes sociais, originalmente feitas para pessoas físicas, exigem um esforço redobrado das empresas para chamar a atenção. Por isso, é fundamental estar presente com estratégia para colher resultados consistentes. “Quem não está no digital, corra, porque o próximo passo do digital já começou, que são as inteligências artificiais”, alerta William. Em paralelo, Mikaellen ressalta a importância da constância, dedicação e esperteza para construir um negócio digital lucrativo e em crescimento.

Já o Sebrae e Rogério Machado, da Unifesspa, apontam a escalabilidade como um dos grandes atrativos do empreendedorismo digital, tanto para consumidores, quanto para investidores. A capacidade de alcançar um público maior e gerar resultados expressivos com menor custo de acesso torna o digital um campo fértil para novas oportunidades, especialmente em um cenário onde os empregos tradicionais e os salários estão em declínio.

Em Marabá, e em tantas outras cidades amazônicas fora dos grandes centros, onde não há loja de shopping vendendo acessórios por direct, Aenos Nascimento vê a sua estratégia como uma janela aberta.

 “Hoje as pessoas não têm tempo. E essa necessidade precisa ser suprida. A venda on-line vai crescer muito. O atendimento personalizado é o que faz a diferença. É isso que eu faço: vou até o cliente”, reafirma.

E, talvez, seja essa a senha da nova era: empreender com humanidade, mesmo em meio a cabos, pixels e automações. Porque, no fim, o digital só vale a pena quando aproxima e transforma.

(Luciana Araújo)

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