Correio de Carajás

Homens lideram entre católicos em Marabá; mulheres, entre evangélicos

Enquanto o catolicismo mantém sua presença histórica e majoritária, o crescimento evangélico e o surgimento de outras crenças apontam para a transformação religiosa do município

Em Marabá, os homens formam a maioria entre os católicos: tradição e certa liberdade da doutrina católica dialogam com a vivência masculina/Fotos: Arquivo CORREIO

Até o início do século XVI, a religião católica imperava no Ocidente, até que Martinho Lutero, com suas teses que contestavam a doutrina católica, iniciou a Reforma Protestante. Com o movimento, a ideia da “libertação religiosa” ganhou força — ou seja, o direito de escolher, praticar ou mudar de religião sem coerção do Estado ou da Igreja. Já no Brasil, a Constituição Federal, em seu artigo 5º, assegura a liberdade de crença, consciência e culto. Um direito que é fruto do legado histórico de Lutero.

Apesar de não ser a única religião praticada em Marabá, o catolicismo é a fé escolhida pela maior proporção de moradores do município. Dados do Censo 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados na sexta-feira (6), mostram que 103.384 (46,28%) marabaenses se declaram católicos. O município, conhecido por ter o segundo maior Círio de Nossa Senhora de Nazaré no Pará, possui 29 paróquias e mais de 600 comunidades, somando as zonas urbanas e rurais. Os números traduzem não apenas o legado da Igreja Católica, mas confirmam que essa religião ainda tem força e poder entre a população.

Por outro lado, a comunidade evangélica, dos cristãos protestantes, está em crescimento no município. No Censo de 2010, o IBGE apurou que 70.264 moradores declaravam pertencer à vertente evangélica. Na edição de 2022, esse número cresceu 16,46%, fazendo Marabá saltar de 70.264 para 81.830 protestantes. Em contrapartida, o catolicismo regrediu 21,50%, indo de 131.711 para 103.384.

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Ainda que não seja possível afirmar que houve troca de uma religião para outra ao longo desses 12 anos, é inegável que a Igreja Católica Apostólica Romana tem perdido espaço, não apenas para o protestantismo, mas também para outras religiões.

Se excluirmos essas duas grandes crenças da equação, temos destaque para 8.347 pessoas que declaram pertencer ao espiritismo, umbanda, candomblé e outras religiões não especificadas. Outras 39 afirmam que seguem tradições indígenas. Em paralelo, 28.841 moradores do município não sabem o que declarar ou não possuem religião.

A análise dos números divulgados pelo Censo 2022 expõe que o cenário religioso de Marabá reflete a diversidade e a liberdade de crença garantidas pela Constituição. E, enquanto o catolicismo mantém sua presença histórica e majoritária, o crescimento evangélico e o surgimento de outras crenças apontam para a transformação religiosa do município, onde diferentes formas de fé coexistem e se renovam.

HOMENS SÃO MAIORIA, MAS DEPENDE

Dos 103.384 católicos declarados em Marabá, 50,67% (52.384) são homens. Eles também são maioria entre aqueles que não possuem religião, representando 58,96% dos 28.256 que declararam essa opção. Em contraste, entre as pessoas evangélicas, 54,95% (44.965) são mulheres.

Esse fenômeno pode ser explicado a partir da doutrina entre as religiões. No geral, mulheres tendem a ser mais religiosas e migram para grupos que ofereçam presença ativa e acolhimento, características que muitas igrejas evangélicas possuem. Elas realizam cultos, alguns específicos para mulheres, ofertam mais atividades semanais e em grupos, além de encontros e ações comunitárias.

Por outro lado, o catolicismo possui uma cultura mais inclusiva para homens, principalmente por, ao contrário do protestantismo, não proibir o consumo de bebidas alcoólicas quando ingeridas com moderação. Por isso, homens católicos acabam tendo mais facilidade na interação social comum, frequentando bares, eventos e confraternizações sem quebrar regras religiosas ou serem punidos por isso.

Enquanto a Igreja Católica reforça a identidade masculina com uma certa flexibilidade, o ideal moral e acolhedor das igrejas evangélicas atrai o público feminino.

RELIGIOSIDADE EM MARABÁ

103.384 marabaenses se declaram católicos

81.830 marabaenses se dizem protestantes

28.841 argumentam não possuir religião

8.347 pertencem ao espiritismo, umbanda e candomblé

Raça e cor e o abrigo do candomblé e umbanda

Ainda que representem uma minoria quando comparadas com as religiões católica e evangélica, as de matrizes africanas são mais frequentadas por pessoas pretas e pardas, em comparação a pessoas de outras cores e raças.

Em Marabá, proporcionalmente em relação às outras duas religiões, umbanda e candomblé possuem 0,68% de adeptos que se declaram pretos ou pardos. Já entre pessoas brancas, esse dado é de 0,28%.

A literatura acadêmica e a sociologia das religiões no Brasil ajudam a explicar esse fenômeno. Pessoas pretas e pardas, com frequência, veem nas religiões de matrizes africanas uma conexão com sua ancestralidade, assim como um ato de resistência cultural e de valorização das raízes coloniais que foram historicamente negadas. Há também um ato de resistência contra o racismo sofrido em outras religiões, além do sentimento de pertencimento e acolhimento nos espaços onde essas religiões são praticadas.

Os demais dados apontam que 47,32% das pessoas brancas são católicas e 35,98% delas são evangélicas. Já entre pretos e pardos, em média 45,46% frequentam a Igreja Católica e 37,41% a evangélica.

Curiosamente, entre pessoas indígenas, 45,95% seguem o catolicismo e 42,76% o protestantismo. Não há informações sobre qual a porcentagem deles que seguem as tradições dos povos originários.

Umbanda e candomblé são frequentados majoritariamente por pessoas pretas e pardas

COMUNIDADE E PERTENCIMENTO

Independente da escolha, adeptos das religiões buscam espaços que ofereçam acolhimento e senso de identidade coletiva, para além do apoio emocional e da devoção espiritual. Os fiéis encontram as representações divinas nas casas de oração, uma forma de conexão com suas crenças e de atender às necessidades e desejos do coração. (Luciana Araújo)