Correio de Carajás

Desafio crescente: número de crianças e jovens com ansiedade aumenta em Marabá

Situações vivenciadas principalmente no núcleo familiar, com ambiente conflituoso e laços afetivos fragilizados, acabam desencadeando um transtorno de ansiedade

Número de crianças e adolescentes com sinais de ansiedade cresceu muito em Marabá nos últimos anos/ Foto: Freepik

Nos últimos anos, os casos de transtorno de ansiedade em crianças e adolescentes aumentou consideravelmente nas clínicas de psicologia. Em Marabá, essa é uma realidade concreta e que exige atenção e cuidado, porque quando não tratada de forma adequada, pode impactar significativamente no desenvolvimento emocional e social dessas crianças e jovens.

Para Mayara Silva, psicoterapeuta cognitivo-comportamental e pós-graduanda em Análise do Comportamento Aplicada ao TEA e DI, com foco no público infantojuvenil, o ponto principal e inicial que se deve ter diante desse cenário é a educação emocional.

De acordo com a psicóloga, quando a criança e o adolescente aprendem a identificar e expressar suas emoções de forma saudável, elas desenvolvem ferramentas essenciais para lidar com o estresse e a ansiedade, que são sentimentos comuns e normais em todo ser humano.

Leia mais:

“Atendo crianças a partir dos seis anos e tem sido frequente, até entre jovens, relatos dos sintomas característicos da ansiedade. São situações vivenciadas principalmente no núcleo familiar. Quando esse ambiente é conflituoso, com falta de suporte e laços afetivos fragilizados, acaba desencadeando essas crises de ansiedade”, explica.

Ao CORREIO, Mayara enfatiza que a maioria dos transtornos é multifatorial, não sendo possível apontar um único fator. No entanto, quando se trata de ansiedade em crianças e jovens é necessário que sejam aplicados testes para identificar e desenvolver, nesse público em específico, habilidades para identificar, nomear e gerenciar essas emoções.

Número de crianças e adolescentes com ansiedade cresceu entre 40% a 50%, segundo a psicoterapeuta Mayara

“Nos últimos anos, temos percebido, na área da psicologia clínica, um aumento nos níveis de ansiedade na infância e adolescência. Nos casos que eu atendo, cresceram cerca de 40% a 50% os pacientes que relatam crises de ansiedade. E aí, junto com eles, vou conversando e tentando identificar se isso se configura mesmo ou é uma falta de habilidade para lidar com situações e emoções de forma assertiva”, contemporiza.

A psicóloga afirma que a sociedade, em geral, negligencia as emoções dessas crianças e jovens e, quando isso ocorre no ambiente familiar, onde a criança passa a maior parte do tempo, isso piora. De acordo com Mayara, as crianças e adolescentes não se sentem acolhidos dentro da própria casa, porque não são ouvidas, pois os próprios pais não tiveram essa educação.

“Não é um hábito nosso falar sobre isso. Muitos pais acabam pedindo para que as crianças controlem suas emoções, porque foi a forma como aprenderam. Eles foram ensinados que não devem expor aquilo que estão sentindo e aí não há o gerenciamento dessas emoções. Em diversas situações, as crianças não encontram no ambiente familiar esse suporte necessário para que elas sejam autênticas. Então, diante de uma situação conflituosa, quando vivenciada, elas não têm um repertório para identificar o que está sentindo”.

Para a psicoterapeuta, a ansiedade é um sentimento comum e natural, e que acompanha o ser humano durante toda sua evolução. No entanto, o que foge disso é o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), que é uma ansiedade vivenciada em um nível mais intenso e numa frequência muito maior. Caracterizada por sintomas fisiológicos e psicológicos, como: taquicardia, angústia, sudorese, aperto no coração e sensação de ‘quase morte’, essa crise gera uma preocupação excessiva por algo que ainda nem aconteceu.

“São perspectivas que se contrapõem diante determinadas situações. A gente tem falado muito sobre isso, para que se discuta sobre os transtornos de ansiedade, porque eles têm sido frequentes na nossa realidade, tanto no atendimento clínico como no ambiente escolar e familiar”.

Segundo Mayara Silva, o transtorno de ansiedade não é tão comum na fase da infância, porém, na adolescência, o jovem sente a necessidade de vivenciar experiências em grupos e, em alguns casos, não se sente aceito e enfrenta desafios. Sem habilidades para lidar com situações, acaba adoecendo emocionalmente.

Educação socioemocional x parental

“Sempre começo meus atendimentos com o registro das emoções, aonde eu vou psicoeducando minha criança e meu adolescente a identificar quais são as emoções que ele está sentindo. Conforme a gente vai avançando no processo psicoterapêutico, essas identificações vão sendo feitas com mais naturalidade, de forma espontânea. E para trabalhar a questão socioemocional, utilizo várias técnicas e materiais para diversificar essa identificação e controle das emoções. Recebo relatos frequentes ‘eu estava na escola e de repente eu não consegui lidar com determinada situação, meu coração começou a acelerar, minha mão ficou suada e a sensação que tinha era que eu ia morrer’. Então, na terapia a gente trabalha essa demanda, que é uma demanda crescente, para criar habilidades para que a criança e o adolescente consigam lidar, e consequentemente a gente acaba tratando os sintomas de ansiedade, para que eles evitem adoecer”, diz.

Na visão de Mayara, é preciso trabalhar a orientação parental, para sensibilizar os pais e tranquilizá-los diante de algumas situações que eles relatam. “Assim, conseguimos fortalecer o vínculo desse pai com essa criança. Porque, é a partir daí que o pai se torna esse suporte. Mas, para isso, os pais precisam desconstruir algumas questões sobre saúde mental, sabendo que muito do que é vivenciado no nosso dia a dia interfere na nossa saúde emocional”, finaliza.

(Ana Mangas)