“É preciso conhecer para preservar. Sem conhecer a fauna e a flora, não há como pensar em como salvar o planeta”, afirma Alexandre Bonaldo, pesquisador do Museu Paraense Emílio Goeldi, em Belém. Ele é o décimo cientista que mais descobriu espécies de aranhas no mundo, de acordo com ranking do World Spider Catalog (WSCA) – plataforma que é referência na aracnologia, mantida pelo Museu de História Natural de Berna, na Suíça.
São 24 anos de trabalho dedicados ao Museu Emílio Goeldi pesquisando as aranhas que, nesta época de Halloween, estão sempre presentes nas decorações festivas.
O doutor em zoologia já descobriu 472 novas espécies desses animais. E, somente em 2023, foram 50 novas espécies de diferentes continentes. Entre os achados, até um novo gênero descoberto.
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Bonaldo afirma que o trabalho de desvendar os seres ainda não descobertos pela ciência é importante para salvar o planeta.
“A biodiversidade que resta é só uma fração da original, porque o impacto do homem é muito grande e está vai aumentando cada vez mais, com as queimadas e o desmatamento. O papel da ciência é fundamental para a preservação, porque é ela que dá os parâmetros para que a conservação seja realmente efetiva”.
E ainda há muito descobrir, segundo ele.
“Para se ter uma ideia, temos 52 mil aranhas descobertas no mundo. A estimativa é que o número total chegue a 200 mil. Então, no ritmo atual, ainda vamos precisar de mais 500 anos para descrever todas essas espécies existentes”.
Vida de pesquisador
O cientista investiga as aranhas da família coronídeos. No campo que ele atua, a zoologia, são milhares de espécies descritas por cientistas a cada ano. Só no grupo dos invertebrados, por exemplo, são cerca de 97% do total de espécies existentes no mundo, e entre elas estão as aranhas, com mais de 52 mil espécies.
“O resultado desse trabalho pode ser resumido em: colaboração. Eu não conseguiria fazer isso sozinho, descrever tantas espécies se eu não tivesse colaboração tanto dos meus colegas quanto dos meus alunos”, ele comenta.
Natural do Rio Grande do Sul, onde desenvolveu o interesse pela aracnologia, o cientista conta que desde a infância era apaixonado por biologia e já pretendia seguir carreira na área.
“Percebi a grande diversidade de formas que elas apresentam, me entusiasmei pelo grupo e fiz do estudo destes bichos a minha profissão”.
Método
O doutor Alexandre é o primeiro aracnólogo da história do “Museu Goeldi” e curador da coleção de aracnídeos com mis de 40 mil lotes de animais preservados. São animais principalmente da América do Sul, na região amazônica no acerto, que serve de base para outros pesquisadores.
“Eu trabalho com cinco famílias de aranhas. Tem uma das subfamílias que é neotropical, ou seja, mais restrita à América do Sul e central, e outra subfamília que ocorre nas Américas, na África e na Ásia e a gente estuda esses bichos também. Claro que tem uma diversidade muito grande na Amazônia, então a gente acaba descrevendo muitos bichos da Amazônia”.
Desenho científico
Ao se encontrar uma espécie de aranha na natureza, ela é cuidadosamente documentada por meio de ilustrações, que são feitas pelo próprio pesquisador, adotando a tecnologia como aliada do método tradicional.
O doutor Alexandre explica que são diferentes abordagens para se descrever uma espécie. Essas técnicas são aprimoradas com equipamentos e recursos tecnológicos nas pesquisas para analisar a estrutura do corpo dos animais, como o microscópio eletrônico de varredura, por exemplo.
“O desenho científico é interpretativo, ou seja, em um desenho, é possível destacar as estruturas mais importantes, a partir de observações que permitem entender as complexidades. Além disso, alguns bichos são, digamos, pouco fotogênicos, e só podem ser adequadamente documentados através de desenhos científicos”.
No Museu onde ele trabalha, uma das principais instituições de pesquisa do Brasil, há também um micro-tomógrafo computadorizado. Com esse equipamento é possível produzir reconstruções em 3D, abrindo novas possibilidades para a documentação e descrição das espécies.
Ainda faltam mais investimentos
O pesquisador defende que, além da estruturação e atualização de laboratórios, a ciência no Brasil precisa de ampliação e mais investimentos para formação e fixação de mais profissionais qualificados nas instituições de pesquisa.
“É preciso incentivar a formação e dar condições para que esses cientistas produzam ciência e possam descrever as muitas espécies que ainda não foram descritas. Então, é preciso acelerar a descrição dessas espécies para disponibilizar, inclusive, informações para políticas públicas, para definição de áreas de preservação e para estudos de ecologia – tudo isso vão ajudar a manter a diversidade no planeta”.
(Fonte:G1)