Correio de Carajás

Há 30 anos, Marabá fazia o maior ato público na ferrovia da Vale

Ato público com cerca de 10 mil pessoas fechou o comércio, mobilizou lideranças políticas, empresariais e comunitárias para pressionar a toda poderosa Vale a implantar o Projeto Salobo

O ato público de 12 de agosto de 1994 foi o maior já realizado para protestar contra a mineradora Vale ao longo da Estrada de Ferro Carajás

Em 12 de agosto de 1994, a comunidade de Marabá realizava um ato público contra a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), como forma de pressionar a empresa a implantar, no Distrito Industrial de Marabá, a usina do Projeto Salobo, projeto que estava programado para ser executado em Carajás, embora a mina esteja dentro do território de Marabá até hoje. Até aquele momento, a companhia levava o caso em banho-maria.

O ato era tão organizado, que o prefeito da época, Haroldo Bezerra, se colocava à frente do movimento, denominado de “Desperta Marabá”. Mas a liderança maior era mesmo da Câmara Municipal e da Associação Comercial e Industrial de Marabá (ACIM), que se uniram para realizar um movimento previamente organizado.

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O Jornal CORREIO DO TOCANTINS fez ampla cobertura, não apenas do evento, mas também dos preparativos nas semanas anteriores, mostrando o posicionamento das autoridades e até mesmo como a Vale tentava enfraquecê-lo com campanha publicitária na grande mídia do Pará.

Os trens ficaram parados e a Vale passou a ouvir o clamor popular a partir daquela data

O ato público se concentrou na região do Km 6, culminando com a paralisação da Estrada de Ferro Carajás, com a “invasão de milhares de pessoas, mas também havia protesto com faixas na PA-150. Os organizadores providenciaram transporte público e até alimentos para os manifestantes. Os servidores públicos foram liberados e o comércio da cidade fechou naquele dia.

O movimento se concentrou no Km 6, e o prefeito chegou a determinar que era proibida a venda de bebidas alcóolica tanto por ambulantes quanto pelos comerciantes das imediações. A Polícia Militar mobilizou um batalhão com 130 homens e a Civil com 10 policiais. Os organizadores estimaram em cerca de 10 mil pessoas participando do movimento.

Um palanque foi levantado no local do ato público e dezenas de autoridades locais, regionais e até federais se pronunciaram. À época, a vereadora Vanda Américo, conhecida por ser “Mulher Coragem”, disse que o que a Vale está fazendo é como se retirasse o coração de uma pessoa ainda viva. Não vamos permitir uma violência dessas”, sustentou.

Esta semana, procurada pela Reportagem do CORREIO para relembrar aquele ato de 30 anos atrás, ela ficou assustada quando informada pela reportagem do CORREIO que já se passaram três décadas. “Nesse período aconteceram muitas coisas em nossa cidade. Lá atrás, a gente sonhou e lutou por verticalização da mineração, com grandes empreendimentos em nosso município, com distribuição de renda. Miguelito e eu estivemos fortemente à frente desse movimento e nos orgulhamos disso. Fomos à Brasília, percorremos o sul e sudeste do Pará e também lutamos para que o governo do Estado viesse a nossa cidade, discutir os problemas de Marabá aqui”, recorda.

O último discurso daquele dia foi do prefeito Haroldo Bezerra: Com essa multidão aqui, com cerca de 10 mil pessoas do nosso lado, temos respaldo para brigar com a Vale. Vamos continuar lutando pelos interesses de Marabá, de nosso povo, do futuro dos jovens”, alardeou.

RESULTADOS DO MOVIMENTO

Após o ato público, a Vale decidiu manter uma mesa de diálogo com os representantes do município de Marabá, temendo que novas invasões à ferrovia ocorressem, inclusive com retirada dos trilhos da Estrada de Ferro Carajás, conforme estava sendo prometido por alguns líderes mais exaltados.

Vale acabou cedendo e chamado líderes do movimento para negociação

O superintendente das Minas de Carajás (SUMIC), Marconi Viana, entrou em contato com o prefeito no dia seguinte ao ato e pediu reunião urgente para discutir as demandas do município.

Aquele era um ano eleitoral e vários candidatos ao governo do Estado se manifestaram favoráveis à manifestação em Marabá, entre eles Valdir Ganzer (PT) e o médico Fernando Moraes (PL).

Após o evento, organizadores analisaram os impactos do movimento popular

Apesar dos esforços de todos os segmentos, a mineradora Vale não atendeu ao clamor popular. Acabou instalando a planta do Projeto Salobo ao lado da mina, com estrada apenas para Parauapebas. A grande maioria dos empregos, inclusive, ficou para aquela cidade, assim como a massa salarial é gasta na chamada Capital do Minério, ficando para Marabá apenas as migalhas dos royalties.

Prefeito Haroldo Bezerra, em pé, era um dos que estavam à frente do ato público

(Ulisses Pompeu)