Dan Baron, coordenador internacional do Instituto Transformance, esteve presente na mesa de abertura do Festival d’Avignon, na França, no último dia 30, onde discutiu o tema “Cultura em Tempos Neo-Fascistas”, junto a outros renomados participantes do cenário cultural internacional. Na ocasião, citou a ansiedade climática relatada nas escolas de Marabá e globalmente, entre outros traumas, associados à pandemia.
A mesa contou com Cláudio Longhi, diretor do Teatro Piccolo de Milão, Itália; Emília de la Iglesia, presidente da Cultura Viva Comunitária, na Argentina; e Mariano Pensotti, cineasta argentino. A moderação foi realizada por Maxime Sechaud, diretor do Setor de Teatro do Sindicato da Confederação Geral do Trabalho (CGT).
Dan abordou o tema “Cultura em Tempos Neo-Fascistas” com uma leitura do poema “Marabá Bem Viver”, do projeto Rios de Encontro, que reflete os 12 anos de aprendizado enraizado na comunidade afro-descendente de Cabelo Seco:
Leia mais:“Quando nossas canoas retornam famintas
transformamos nossa fome em dança
quando nossas florestas viram pó
transformamos nossa asma em canto
para que quando os usineiros da paz
oferecem reciclar nossos bisnetos
asfixiados por sua ganância ecocida
Marabá já estará revivendo
Porque na cura de cada cicatriz
aprendemos a arte de cuidar
no silêncio de cada agrado
aprendemos a coragem de ousar
e na pergunta de cada criança
nasce um pulso ancestral do bem viver.”
“Valorizamos as artes como metodologias de aprendizado ancestrais e visionárias numa educação reimaginada como viveiro comunitário numa Eco-Pedagogia que estamos evoluindo com a diretoria de Educação Popular na Presidência da República”, explicou Dan.
ASSUNTOS TRATADOS
Em resposta à pergunta de Maxime Sechaud sobre as ações durante os quatro anos após a extinção do Ministério da Cultura em 2019 pelo Governo Bolsonaro, Dan mencionou a solidariedade financeira da Alemanha, que permitiu a criação do espetáculo “Rio Voador” e sua turnê europeia. Durante a pandemia, a produção de vídeos e exposições visuais serviram como recursos eco-pedagógicos para explicar as metodologias coletivas e comunitárias dos Rios de Encontro.
“O público se mostrou encantado com as rodas de leitura na biblioteca Folhas da Vida, a distribuição de livros e mudas, e as bicicletadas e festivais de pipa, que visam cultivar liderança e solidariedade em crianças e adolescentes”, relata. Segundo ele, houve também destaque para a valorização da leitura cotidiana do Rio Tocantins como ciência tradicional.
Sobre os desafios atuais, Dan mencionou a ansiedade climática relatada nas escolas de Marabá e globalmente, além de crises de vômito, desmaio, choro, agressividade e automutilação, associadas ao trauma existencial da pandemia.
Durante a semana de debates com os setores da dança, música, teatro, artes visuais e administração no CGT, Dan alertou sobre a aliança do Governo Lula com mineradores e petroleiros, considerando-a um grande perigo. “O financiamento de projetos culturais e educacionais por empresas como Vale e Petrobras está determinando as narrativas da memória e imaginação populares, com projetos industriais na Amazônia sendo licenciados pela cultura, não pela consulta prévia”, afirma.
Ao ser questionado se essa aliança é o preço político dos pactos eleitorais de 2022, Dan afirmou que o Partido dos Trabalhadores (PT) continua preso a um modelo de progresso que ameaça ecossistemas, popularizado por mídias sociais que seduzem e viciam desde a infância.
“A alfabetização digital, uma base prioritária da Eco-Pedagogia, possibilita uma consciência deste neo-fascismo cultural, para romper com a cumplicidade sem nosso consentimento”, finalizou.
QUEM É DAN BARON?
Dan Baron é artista, escritor e eco pedagogo comunitário de origem quebecois-gales, com 24 anos de colaboração com o MST (Santa Catarina, Pará), o Povo Pataxó (Monte Pascoal, Bahia) e comunidades urbanas em risco. Enraizado na comunidade afro-indígena Cabelo Seco, em Marabá, Pará, desde 2008. Coordena o projeto Rios de Encontro e sua Universidade Comunitária dos Rios que inspiram 380 famílias ribeirinhas a se transformarem em uma ecovila Bem Viver, protegida por uma lei estadual de Ecocídio.