Em 2023, o Poder Judiciário em Marabá determinou 225 medidas protetivas de urgência a mulheres vítimas de violência doméstica atendidas pela Defensoria Pública do Estado do Pará. Os dados foram coletados pela equipe do defensor público Allysson Castro, que pretende empregá-los na prevenção de novos crimes.
Segundo o levantamento, o Núcleo Nova Marabá foi o que apresentou o maior número de ocorrências, com 62 casos analisados. Em seguida, aparecem o Bairro Amapá (32) e o Núcleo São Felix (18).
Em relação ao perfil das vítimas, a maioria (108) é mulher jovem, com idade entre 18 e 30 anos, enquanto os agressores são, na maior parte, homens com idades entre tem entre 30 e 34 anos (59).
Leia mais:A maior parte dos episódios que geraram medida protetiva ocorreu dentro da residência da vítima (179). Casos também são frequentemente registrados em via pública (29) e nas redes sociais (19), uma informação que pode causar surpresa. Apesar de ser uma “novidade”, Castro explica ser grande a quantidade de medidas decretadas em decorrência de crimes virtuais.
Conforme ele, atualmente esse tipo de violência doméstica é praticada principalmente por meio de ameaças via WhatsApp e pela divulgação de imagens íntimas das vítimas como uma forma de vingança.
Castro atua na Vara de Violência Doméstica contra a Mulher de Marabá há 11 anos e relatou ao Correio de Carajás ter decidido iniciar uma compilação de dados após ter sido procurado diversas vezes por pessoas que estavam em busca de informações estatísticas, principalmente acadêmicos e representantes de órgãos de Segurança Pública.
De acordo com ele, isso o fez perceber que há uma carência de dados sobre esse assunto, então, desde o início de 2023, a equipe passou a catalogar os casos um a um.
Medida Protetiva
Segundo o defensor, a medida protetiva de urgência é o principal mecanismo de proteção contra a mulher na questão da violência doméstica e Marabá possui expressivo número de agressores presos por descumprirem a decisão. “Muita gente a critica, mas ela é o primeiro passo que a justiça tem que dar na proteção da mulher. Embora não garanta 100% de proteção, esse pedido é um primeiro grito de socorro. Quando a mulher pede a medida protetiva algo não está bem, algo não está disfuncional, já há violência física, psicológica, moral ou financeira”, diz.
Após a solicitação da medida, a justiça tem um prazo entre 40 e 48 horas para deferi-lo ou não. Caso sim, são intimados o Ministério Público e a Defensoria Pública, quando o agressor não tem advogado. Em Marabá, informa Castro, estes são 98% dos casos.
O servidor analisa que a proteção da mulher tem avançado, inclusive com a punibilidade do agressor, que antes era mais leve. “As leis como a da medida protetiva, que antes não davam em nada, mudaram. O legislador decidiu que quem não cumprir seria preso e depois disso transformarem o descumprimento em crime. Agora, a pessoa que já responde a um processo por ameaça, por exemplo, passa a responder a mais um processo ao descumprir a medida protetiva”.
Para ele, a Lei Maira da Penha é uma das mais avançadas no mundo em termos de proteção à vítima, mas há necessidade de mais conscientização. “A lei é importante, mas ainda mais importante é a gente conscientizar as gerações futuras de que é errado e, assim, vamos ter menos violência contra a mulher”.
Uso dos dados
Neste sentido, o objetivo da Defensoria Pública com os dados coletados é subsidiar um trabalho de prevenção nas áreas mais afetadas. Assim, Castro já se reuniu com as polícias Militar e Civil para apresentar as estatísticas e debater soluções. “Falamos sobre a possibilidade de focar em um trabalho preventivo na área da Nova Marabá, que registrou maior número de casos. Podemos pensar quantas escolas tem nesses bairros e como podemos atuar junto das delegacias itinerantes. Podemos fazer palestras em escolas e em postos de saúde”.
Outro recorte apontado por ele como guia para pensar propostas é o socioeconômico a partir do perfil das vítimas e dos agressores. As mulheres vítimas, por exemplo, são em maioria jovens, enquanto os agressores são mais velhos. “Esse perfil aponta para mulheres que engravidaram cedo, que têm baixa escolaridade e uma extrema dependência financeira do agressor”.
Duas frentes
De acordo com o defensor público, a cada 10 medidas protetivas decretadas, há descumprimento de 20% a 30% delas. Muitos agressores, diz, descumprem a decisão judicial por falta de conhecimento e alegam que desconheciam a possibilidade de serem presos se mantivessem contato com as vítimas.
Desta forma, um dos trabalhos feitos pelo órgão é a conscientização dos agressores presos. Em Marabá, explica, há uma defensora pública que atende as vítimas e as demandas delas, como pedido de medida protetiva e ação de divórcio e alimentos, enquanto ele fica responsável por atuar na defesa do agressor, seja no trabalho processual, seja no extra processual.
O segundo caso é considerado por ele o mais difícil. Castro tem a árdua tarefa de fazer os agressores, homens, na maioria, entenderem quais os tipos de agressões contra as mulheres e porque elas estão erradas. “Eu sento com ele (agressor) e começo a conversar, como se fosse palestra mesmo, sempre faço trabalho de prevenção e conscientização para que depois não digam que não sabem por que estão presos”.
Neste sentido, explica, é necessário explicar ao homem as consequências de seus atos, explicando para ele que está errada a agressão e que ele está tendo um comportamento machista. A intenção do defensor é minimizar o número de casos. “A gente faz esse trabalho, de repressão, mas também de conscientização, contemplando tanto a vítima como o acusado”.
(Da Redação – com informações de Luciana Araújo)