Dois estudos publicados recentemente, um holandês e um americano, se dedicam a uma nova fronteira da pesquisa em medicina: a criação de órgãos em miniatura para estudar os impactos de tratamentos e doenças em ambientes controlados. O estudo europeu cultivou minicérebros do diâmetro de um prego, e o americano criou cerebelos in vitro.
“Antes tínhamos de recorrer a estudos com animais, geralmente camundongos. Essa técnica sempre tem uma limitação porque o animal não é igual ao humano. Você pode ter uma ideia de uma doença provocada no animal, mas nunca vai ser exatamente igual ao humano. Estes modelos de organelas podem fazer com que superemos essas barreiras e aceleremos as pesquisas”, explica o neurologista Felipe von Glehn, do Hospital Brasília Unidade Águas Claras, da rede Dasa no DF.
Minicerebelos
O estudo americano conseguiu cultivar em laboratório as células de um cerebelo a partir de células-tronco de humanos adultos. O cerebelo controla o movimento e desempenha papéis importantes nas funções cognitivas, incluindo linguagem, processamento espacial, memória de trabalho, funções executivas e processamento emocional.
O órgão em miniatura criado pelos pesquisadores da Universidade do Sul da Califórnia, em Los Angeles, foi o primeiro modelo organoide do cérebro humano a gerar todos os principais tipos de células do cerebelo, incluindo as células granulares e neurônios de Purkinje. É a primeira vez que se consegue elaborar células funcionais deste tipo, segundo artigo publicado no dia 4/1 na revista Cell Stem Cell.
“Algumas doenças que acometem o cerebelo são neurodegenerativas graves, como as ataxias espinocerebelares. Agora, é possível ver em células cerebrais, recolhidas do próprio paciente, o processo de evolução e testar tratamentos. Esse estudo é muito bem-vindo e provavelmente vai ser reproduzido por outros pesquisadores no mundo”, imagina Glehn.
Minicérebros
Já a investigação dos pesquisadores holandeses desenvolveu minicérebros cultivados a partir de células de fetos humanos. Com até 5 milímetros de tamanho, as organelas serão utilizadas para entender doenças do neurodesenvolvimento que atingem bebês em sua formação uterina, como a microcefalia e o câncer cerebral infantil.
O estudo foi publicado na revista Cell em 8/1. Trabalhando com pequenos pedaços de tecido cerebral fetal (de bebês que morreram antes do nascimento, por volta das 12 ou 15 semanas, de forma natural), a equipe descobriu que esses pedaços poderiam se auto-organizar em organoides semelhantes ao cérebro humano sem precisar ser induzidos a isso.
Estes mini-órgãos foram usados para estudar o câncer cerebral. Os pesquisadores usaram a técnica de edição genética CRISPR-Cas9 para introduzir mutações encontradas no glioblastoma e, após três meses, as células mutadas ultrapassaram em quantidade as células saudáveis no organoide. A partir deste momento, eles foram usados para observar a resposta aos medicamentos contra o câncer.
Os cientistas concluíram que os experimentos demonstraram o potencial de uso dos minicérebros para a pesquisa de novos tratamentos para a doença.
(Metrópoles)