Correio de Carajás

Pensão para ex-prefeitos é ‘excrescência’, afirma Adelina Braglia

Ela foi servidora pública, ativista social, vereadora e encerrou a carreira política precocemente como vice-prefeita. Em entrevista, Adelina diz que não via maior sentido em se aproveitar da pensão por atuação tão curta em cargo eletivo

Adelina Braglia em entrevista a Ulisses Pompeu e Gabriela Silva

Embora não tenha sido a primeira mulher vereadora em Marabá, Maria Adelina Guglioti Braglia permanece como referência na política local, passados 35 anos desde que deixou a cidade para trabalhar em São Paulo e depois Belém. Aqui, ela chegou no início da década de 1970, quando Marabá tinha sido declarada Área de Segurança Nacional, enfrentou poderosos da política local e criou, juntamente com outras personagens, a Associação da Mulher de Marabá. Ela também atuou no núcleo avançado da USP nesta cidade, foi vereadora, vice-prefeita e mobilizou várias mulheres para participarem da política partidária.

Depois de mais de 25 anos distante de Marabá, Adelina Braglia, agora com 74 anos de idade, retornou à cidade para visitar filhos e netos, conhecer uma rua que leva seu nome e ainda participou de um bate-papo com o jornalista Ulisses Pompeu e com a educadora Gabriela Silva, no podcast Lugar de Debates, da Câmara Municipal de Marabá, onde falou de vários assuntos, inclusive polêmicos, mas com muita humildade:

 

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Lugar de Debates – Você é de que cidade, qual sua formação e como veio parar em Marabá, ajudando a moldar a política local?

Adelina Braglia – A minha educação formal jamais me levaria a isso. Eu sou bibliotecária por formação. Mas a minha experiência de trabalho em São Paulo foi muito privilegiada, tive um emprego de adolescente como telefonista, depois fui trabalhar no Dieese. Era uma equipe pequena na época e o coordenador era o Walter Barelli, uma figura da maior dignidade. Trabalhei lá de 1970 a 77. Foram os anos mais cruéis da ditadura, e esta equipe que era unida, solidária e comprometida com o mesmo objetivo, foi pra mim uma escola. Tanto que eu sempre digo que sou uma pessoa muito privilegiada. O que eu posso ter feito de ruim é pela minha conta. Mas o que eu fiz de bom foi a coleta de aprendizagem e oportunidades, as quais chamo de privilégio, de ter podido andar por alguns caminhos. O máximo que fiz foi aproveitar isso e transformar em algo bom.

Então, essa experiencia de trabalhar no Dieese abriu meus horizontes. O Dieese era basicamente ligado ao Sindicato dos Trabalhadores Urbanos, mas ali você começa a ter uma visão de que alguma coisa está errada. Ou como já dizia meu pai: “No capitalismo nada se salva”, então eu cresci um pouco com essas noções.

E aí acontecia uma coisa na minha geração em São Paulo, apontando para uma diáspora da cidade. Eu tinha vontade de sair de São Paulo e conhecer outras partes do Brasil. Foi então que houve uma coincidência muito boa. Em 1974 eu vim a Marabá pelo Campus da Universidade de São Paulo (USP) e, aqui, conheci a Rosa Almeida. Uma amizade entre todos nós nasceu, fazendo com que, depois da visita, nós criássemos o hábito de trocar correspondências.

Depois de tentar várias vezes retornar, cheguei em Marabá definitivamente no dia 18 de fevereiro de 1977, inclusive no meio de uma enchente. Me lembro da descida no aeroporto, onde havia apenas uma casa de palha e tinha um menino com um isopor. Atravessei nas canoinhas, descemos na Avenida Antônio Maia. Para mim, era tudo um fascínio.

 

Lugar de Debates – Chegando aqui, passou a trabalhar em que área?

Adelina Braglia – Depois que a enchente passou, eu comecei a trabalhar na prefeitura, no departamento de administração. Um mundo absolutamente desconhecido caiu em cima de mim, porque eu vinha da experiência profissional, luta sindical por direitos trabalhistas e aqui naquele momento e era ficção científica então comecei a compreender que eu não tinha muita certeza do meu papel, mas eu sabia que o que eu tinha que fazer era o que eu sabia ser o certo.

O Haroldo sempre foi uma pessoa que te dava independência, deixava você trabalhar. E ele me deu essa carta branca para ir resolvendo as questões administrativas dos servidores da prefeitura, naquele momento nenhum tinha um comprovante, um contracheque, nada disso. Começar esse trabalho e foi me fazendo muito bem e ali eu fiquei um ano e meio. Foi inclusive ali que minha amizade com Ademir Braz nasceu.

 

Lugar de Debates – Como você acabou indo trabalhar no Campus Avançado da USP?

Adelina Braglia – Em setembro de 1978 fui convidada e aceitei o cargo de diretora adjunta do campus da USP aqui. Isso ocorreu depois de uma conversa com o Haroldo Bezerra, que foi super compreensível. O campus da USP naquele momento não era somente um local onde os alunos vinham passar férias, ele tinha uma programação contínua. Havia um acordo com a prefeitura, o antigo SESP, e nós tínhamos estagiários formados nas áreas de medicina, veterinária e odontologia.

Ali, se abriu para mim um novo universo, porque os atendimentos dos estudantes eram na área rural, e eu comecei a acompanhá-los. Comecei a ir ao São Félix, Murumuru, Morada Nova, que naquele momento eram vilas. E ai, eu fui vendo outra realidade.

Quando eu despenquei aqui, naquele momento, parecia que eu tava em outro planeta. Primeiro, eu me toquei de que a maioria das pessoas eram do Nordeste. Naquele momento, não havia paraense em Marabá, e as pessoas que ocupavam essas terras eram nordestinos. O que eu acho que era um processo antigo do corredor da seca.

Vi uma vida absolutamente dura, desumana, morando em casebres, dentro da mata, derrubando árvore no serrote pra conseguir destocar e plantar um arroz, ficando a quilômetros, no sentido da infraestrutura, sem água. Quando vinham à cidade vender esse produto, o preço era extorsivo. Lembro de um companheiro nosso que saia com quatro sacas de arroz e voltava com um litro de óleo, porque esse era o valor que davam.

Aquilo foi abrindo na minha cabeça, uma realidade. Eu comecei a achar que alguma coisa precisava ser feita. Aí vem a história dos meus privilégios e Gabriel Pimenta. Ele vinha de Conceição do Araguaia, trabalhou um tempo na CPT, e havia chegado em Marabá nos meados dos anos 80. Nos conhecemos, havia uma identidade de estrangeiro, depois ele veio com o compromisso de organizar os trabalhadores rurais, o que era exatamente o meu caminho. Isso nos uniu.

Lugar de Debates – E como era essa amizade entre você e o Gabriel Sales Pimenta?

Adelina Braglia – Ele era uma figura muito especial. Eu tenho 74 anos agora e conheci poucos com luz própria, como Gabriel. Era muito inteligente, dedicado a esse compromisso da organização dos trabalhadores, ele vivia pra isso. Aliado a isso era muito gentil e bonito. Quando íamos a reuniões, a maior alegria das velinhas e crianças era a chegada do Gabriel, parecia Papai Noel, porque era muito afetuoso. Ele facilmente agregava as pessoas. Era uma face importante, inclusive pro trabalho dele porque essa coisa do afeto e da proximidade é diretamente ligada ao que ele fazia.

Lugar de Debates – Como a morte de Gabriel Pimenta mudou os rumos desse projeto?

Adelina Braglia – A minha avaliação foi que o assassinato do Gabriel teve uma motivação óbvia e pública que foi a comunidade rural Pau Seco. E, naquele momento, o que o Gabriel fez? Conseguiu com o Benedito Monteiro, e entrou com uma ação. Eu vi o despejo dos posseiros, despejados pela PM, que batia, tocava fogo, matava galinha. Eu vi com meus próprios olhos. E o Gabriel entrou com uma ação que até hoje não houve nenhum outro caso, onde ele conseguiu a reintegração dos posseiros, o que foi como um soco no fígado. Imagine que, de repente, você tem uma reintegração judicial que quebra toda história de expulsão.

O Gabriel veio e o primeiro trabalho foi a organização do sindicato e ao mesmo tempo trabalhava o fortalecimento do sindicato dos construtores civis, ajudou na criação dos sindicatos de carregadores de carga e me sugeriu que a minha atividade fosse a organização do trabalho com as mulheres.

Um mês antes de morrer, ele foi a Parauapebas, teve uma reunião rápida e curta com os meninos que estavam fundando o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Metalúrgica, então eu penso que a morte não foi só pelo que fez, mas pelo que faria, também. Eu acho que intimidou esse poder local acostumado a não ser contestado. Ele foi uma pessoa que chegou a organizar movimentos e tem uma empatia que faz toda diferença.

Então, eu nunca me convenci que o assassinato do Gabriel foi uma composição pequena.

Como eu cheguei nisso? É claro que viver essa vida na área rural, mais do que na urbana, foi me levando a entender que eu nunca acreditei na revolução armada, apesar da minha má fama daquela época. Até hoje acredito na democracia. Então eu pensava que se era isso que eu achava, o caminho era a política. Naquele momento não se tinha pessoas qualificadas capazes de enfrentar o poder político local e o Gabriel teve muito poder sob essa minha decisão. Ele morreu em 82, no dia em que foi feita a convenção do MDB para escolha dos candidatos para vereador. Aí, meio que ficou emposta minha candidatura. Nessa noite o Gabriel chegou a participar. A convenção foi uma coisa bonita e aconteceu no colégio Plinio Pinheiro Neto.

 

Lugar de Debates – Nos conte detalhes sobre aquela noite macabra em que tiraram a vida do Gabriel Pimenta

Adelina Braglia – Quando nós saímos da convenção do MDB, fomos ao Bacaba para sentar e comemorar, e foi nesse momento que Gabriel foi assassinado. Ele saiu para levar a esposa de um dos nossos amigos que estava se sentindo mal. A distância entre o bar e a casa dessa terceira pessoa, era de 200 metros. Ele saiu e quando chegou para pegar o carro, os pistoleiros que estavam num Fusca atiraram três vezes em suas costas.

A partir daí, virou uma situação pesada do que eu passei a representar. Era pegar ou largar. Ou a gente deixava se derrotar, ou a gente multiplicava, que, inclusive, estava escrito em uma faixa no velório de Gabriel.

Minha campanha foi uma coisa muito bonita, de garra, da participação de alguns produtores rurais, principalmente das mulheres. Foi o que me elegeu. Nós fomos três eleitos: o João Chamon, o Ademir Martins e eu. O MDB era o grande guarda-chuva.

A minha eleição se deu a esse compromisso, meu mandato não tinha outro sentido era esse, a contribuição para o movimento rural, algo da área urbana começou a ficar mais claro pra mim, mas meu mandato não tinha outra coisa. A origem da candidatura era isso.

A eleição foi em 1982, eu fui vereadora em 83, 84 e 85. Ai, em 85, Marabá deixa de ser Área de Segurança Nacional e veio uma composição do MDB com o Hamilton, como prefeito e eu como vice. Ali fiquei mais três anos. No final de 88, foi tomada uma decisão. Havia uma expetativa das pessoas que trabalhavam comigo de que eu seguisse essa trajetória, e naquele momento eu disse: agora eu preciso por o pé no freio.

Amo fazer política, em todos os cargos que ocupei, mas a política parlamentar não é pra mim. Então foi uma decisão que, pela primeira vez, estou colocando publicamente.

Adelina Braglia ajudou a fundar a Associação da Mulher de Marabá e motivar as mulheres a ingressarem na política

Lugar de Debates – Como foi ser mulher política naquela época e qual sua visão dessa representatividade na atualidade?

Adelina Braglia – Eu acho que eu tenho uma dívida para saudar com as mulheres de Marabá. Primeiro porque pra mim, naquele momento eu não tinha a percepção do meu papel como mulher, candidata e enfrentando uma política misógina, e até certo ponto violenta. Eu não tinha essa clareza no momento da luta, até porque quando você tem uma formação esquerda, você comete erros graves.

Eu vinha de São Paulo, muito ligada ao movimento sindical urbano, naquele momento ainda não existia luta feminina e quando eu cheguei aqui e até realmente foi muito por influência do Gabriel, que discutia muito isso comigo. É uma vergonha dizer isso, mas eu tinha a ideia de que trabalhar com mulheres dividia o movimento. Eu cria que, se separasse as lutas nos sexos, isso enfraqueceria todo mundo, o que é o inverso do real.

Eu relutei, parecia que eu tava indo contra um princípio meu. Mas eu comecei pela discussão da criação da Associação da Mulher. O início foi na área urbana, começamos pela Nova Marabá, depois Novo Horizonte. Foram diversas guerreiras que tinham respeitabilidade na sua comunidade e se engajaram, organizando as reuniões. Não foi nenhum feito brilhante meu, foi uma conjunção de necessidades e e eu aprendi pra caramba. Primeiro porque eu também tinha essa coisa de não precisar de tanta necessidade de me sobrepor.

Uma das minhas virtudes é ouvir, então eu comecei a ouvir algo que não fazia parte da minha realidade, com casos de sofrimento por violência doméstica, até o sofrimento de quem tinha que dividir o pedaço de bife em cinco, de não ter como comprar pão. Pensar que pouquíssimas mulheres tinham entrado no mercado de trabalho, apenas as que tinham o privilégio de serem servidores públicas. A independência financeira não existia.

A minha história nunca foi assim. Eu sempre estive empregada, eu nunca passei fome. Tudo isso foi aprendizado. A Adelina que saiu de São Paulo e a Adelina que viveu em Marabá eram pessoas completamente diferentes.

 

Lugar de Debates – Quais foram os desafios na campanha de 1988, como vice-prefeita?

Adelina Braglia – A campanha de 88 foi completamente suja. Eu tinha uma relação afetiva com a Rosa, nunca escondemos isso, ou pusemos debaixo do tapete. E também nunca precisamos exibir. Mas isso foi usado da forma mais asquerosa na campanha. Os muros da cidade eram pichados com “Adelina sapatão”.

Meu filho mais velho tinha que sair na porrada com outros estudantes da escola porque provocavam ele com esse pretexto. Me xingavam.

E é gozado como isso não atemorizou as mulheres, me parece que foi uma faca de dois gumes, acho que fez com que elas se dispusessem a falar: “chega”. No comício na Praça Duque de Caxias, quando ganhamos a eleição, Hamilton e eu, havia uma multidão de mulheres, havia muitos homens, mas as mulheres era a maior parte. Os olhos eram de brilho como quem diz: “chegamos”.

Ali, eu pensei que a coisa chegou muito além do que eu queria. Assim como eu acho que as mulheres começaram a perceber que a gente podia ter outro lugar nessa sociedade mesmo misógina. Isso vou levar comigo com muito prazer e aprendizado.

 

Lugar de Debates – Em algum momento da história você se separou do Hamilton, que era o prefeito. O que aconteceu pra ocorrer essa ruptura?

Adelina Braglia – Na nossa escolha de candidaturas, o professor Hamilton era uma figura pública simpática, agradável, e nós fomos abençoados como prefeito e vice pelo patrimônio paraense chamado Jader Barbalho. Já que sem a benção dele naquele momento ninguém seguia em frente. E a campanha foi algo muito animado, muito tranquila. Ninguém parou para pensar em plano de governo então nossa convivência começou do jeito que dava.

No início era tudo tranquilo, inclusive, ele me garantiu um espaço de trabalho que não era usual. Eu tinha um gabinete, secretarias importantes e aí o primeiro ano passou com tranquilidade, com o segundo ano adiante os nossos objetivos já não convergiam tanto, não sei lhe dizer se eu tava certa ou errada, mas a minha perspectiva de gestão ainda era você tratar de cuidar da vinda das pessoas. A vaidade podia esperar um pouco e talvez minha visão tenha sido ingênua, mas isso foi fazendo a gente divergir em prioridades da prefeitura até o momento que o atrito foi grande.

O fato que desencadeou isso foi que começaram a chegar pessoas de fora, vindo de Belém e outros locais, e sugeriram a ele a criação de uma empresa particular que iria cuidar do cadastramento de arrecadação do IPTU, alguma coisa me fez não gostar da proposta e quando eu fui conversar com o Hamilton ele também não gostou de eu não ter gostado. Ele demitiu imediatamente a Julia Rosa, o Ricardo Smith, o médico que era da saúde, a Rosângela, todo mundo ficou desempregado na véspera do Natal. Ele não podia me demitir porque eu tinha cargo eletivo, mas a turma que trabalhava comigo foi toda pra rua.

Lugar de Debates – Você não acha que teve uma atitude intransigente?

Adelina Braglia – É importante dizer que a velhice não traz só artrite ela traz também, remorar fatos com sua visão de hoje. Naquele momento eu em achava correta, mas hoje penso que talvez não tenha tido habilidade para lidar com as coisas. Dali pra frente começou uma guerra aberta, com a convenção do MDB, que foi em janeiro de 1988 e a disputa foi pra valer. O Hamilton e Asdrúbal tinham a chapa deles e nós do lado de cá tínhamos a nossa. E ganhamos a convenção contra a torcida de todos.

E aí veio a segunda questão, onde eu poderia ter sido maleável, que foi a escolha da candidatura a prefeito. A nossa escolha era o Haroldo, em relação a isso, naquele momento, eu não tinha nenhuma dúvida, mas a gente sabia que a alguns setores não interessava e havia uma possível proposta de candidato a vice e nós não aceitamos por uma coisa até infantil de dizer que quem escolhia era o MDB, fomos contra o desejo de todos inclusive do então, na época, ministro e pegamos uma paulada feia em 88. Nosso candidato a prefeito foi o Haroldo e o vice Antonio Carlos Miranda. Foi a candidatura do Nagib, que ganhou e com a benção do Jader Barbalho. Houve um comício e ele chegou a colocar as mãos nos ombros do Vavá Mutran dizendo que ele havia sido injustiçado, quando cassado. E nós perdemos fragorosamente a eleição.

Hoje eu penso que se naquela época houvéssemos tido maturidade política, mas não tínhamos e nem sei se teria sido melhor ou pior, mas de fato seria diferente do que foi. Não existe arrependimento nessas minhas palavras, porque naquele exato momento era o que a gente achava justo e achava correto, mas quando você olha na linha do tempo, você percebe algumas coisas que talvez poderiam ter sido conduzidas de outra forma.

Adelina e o prefeito Hamilton Bezerra durante homenagem à parteira Maria Piauí, de Murumuru (à direita)

Lugar de Debates – Foi nesse contexto de derrota e rompimento que a senhora decidiu abandonar a política partidária e deixar Marabá?

Adelina Braglia – Uma coisa levou a outra, eu me perguntava qual era meu papel em Marabá, e o que eu representava. Um bem ou mal, liderança política, e alguém que tinha algumas perspectivas de dar continuidade a esse caminho e quando eu recusava isso parecia que eu não cabia na cidade, que não era mais o meu lugar, já que eu não correspondia àquilo que esperavam que eu fosse.

Aí veio a ideia de voltar a São Paulo, e retornei ao Dieese, que estava começando a fazer uma pesquisa sobre emprego e desemprego. O antigo idespe. Como minha vida nunca é como eu penso, eu acabei ficando três anos em Belém, mas a ideia de voltar a São Paulo fazia sentido pra mim. Ai em 1992 eu voltei a minha cidade natal, para o Dieese mesmo.

Lá fiz um concurso na fundação Seade, fui aprovada, minha vida já estava estruturada, não passava mais pela minha cabeça voltar ao Pará. Até que doutor Almir Gabriel, como governador, me fez um convite para criar um grupo de mediar conflitos de terra e eu vim conversar com ele, mas disposta a não ficar. Eu só quis vir me justificar, e tentei realmente. Foi muito difícil minha volta pra São Paulo. Disse a ele que era concursada, não posso perder isso, mas ele me ofereceu continuar vinculada à Seade e ficar em Belém. E fiquei trabalhando em Belém de 1996 a 2018. Isso porque achei que ficaria um ano.

Fui ficando até me aposentar, trabalhando todo esse período no governo do Estado. Eu só não fiquei quando foi o governo do Ana Julia, porque eu não ia esperar ser demitida, eu mesma me demiti. Depois quando o governador Jatene ganhou a eleição, foi quando eu fui pro Idesp.

 

Lugar de Debates – Em Marabá, um grupo de ex-prefeitos e ex-vice-prefeitos recebem uma pensão que é muito questionada e leva milhões da Prefeitura todos os anos. Por que Adelina Braglia, embora tivesse direito, não requereu esse ‘benefício’?

Adelina Braglia – Me perdoe se eu usar uma palavra forte e sem querer ofender as pessoas que recebem, mas eu acho isso uma excrescência. Como trabalhadora, trabalhei 40 anos pra me aposentar e isso é a realidade da maioria dos brasileiros. Aos que exerceram o cargo de prefeito, acredito que tenha que ser cobrado de acordo com o período que fora trabalhado. Mas quem senta na cadeira por 24h? Não tem como concordar com isso.

Ninguém da minha família nunca passou fome, e não havia maior sentido de me aproveitar disso. Me apropriar de um recurso que não considero justo receber por ser um dinheiro público que deveria estar sendo investido na cidade. (Ulisses Pompeu, Gabriela Silva e Thays Araujo)