Quem acompanhou o Mundial de Ginástica, na Bélgica, viu a cada dia de apresentação do Brasil belíssimos colants vestindo nossas medalhistas Rebeca Andrade, Flávia Saraiva, Jade Barbosa, Julia Soares, Lorrane Oliveira e Carolyne Pedro. O que poucos sabem é que são todos criação de uma das integrantes da medalha de prata por equipes. A ginasta Jade Barbosa, pelo segundo ano consecutivo, é a responsável por trazer outro talento para dentro do ginásio, o de designer.
Fora dos campeonatos desde 2019 por causa de uma lesão, a ginasta de 32 anos teve um retorno triunfal em 2023. Com a consagração da medalha de prata por equipes, Jade conseguiu colocar no corpo suas próprias criações e colaborar para que elas entrassem para a história, junto com as conquistas na Antuérpia.
– Na final por equipes, a gente queria um colant de gala e até ficamos na dúvida se íamos mesmo deixar para final porque caso a gente não classificasse, não usaríamos. Mas aí dissemos ‘não, a gente vai para final por equipes e a gente vai usar esse collant’. Ele tem veludo, que é um tecido que foi muito usado na época da Dai (Daiane dos Santos) e da Dani (Daniele Hipolito), e eu trouxe um pouco disso também. E tem as pedras douradas que impressionaram, tanto é que quando fomos para o ginásio de aquecimento, o técnico da equipe da França falou ‘nossa, que colant bonito, vocês estão com cara de campeãs hoje’! E era o que a gente queria, chegar impecável em todos os momentos – contou sobre o processo criativo para o ge.
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Ao lado do pai, Jade iniciou jovem uma empresa de roupas de ginástica e sempre gostou de ajudar na criação dos collants. A atleta tentou terminar a faculdade de design de produto na PUC, mas os preparativos dos Jogos do Rio, em 2016, acabaram por interromper a graduação. Em 2022, Jade assumiu a responsabilidade de desenvolver os maiôs da seleção no Pan e no Mundial.
– Eu fiquei tão realizada! Também fiquei feliz porque as meninas voltaram e falaram ‘a arbitragem adorou e disseram que estava bem diferente, há muito tempo não se via design diferentes assim’. O collant também faz parte da apresentação e antigamente a gente não tinha dinheiro, então não tinha a oportunidade de não repetir collant. Até nas Olimpíadas nós repetimos e aqui nós tivemos um diferente para cada dia – falou com satisfação em ver suas ideias tomarem forma.
Jade costuma pegar referências em outros esportes, como também em catálogos de moda e nas redes sociais.
Por causa do alto custo de produção para collants personalizados, Jade explicou que a equipe precisava repetir o mesmo modelo em dias diferentes de competição no passado. Com maior investimento na ginástica, a equipe atualmente tem patrocinador exclusivo. Os valores de produção para um collant de seleção não foram revelados, mas um modelo bem mais simples à venda na internet custa em média mil reais a unidade.
– Eu tentei trazer muitas gerações nos collants. Para o de treinamento de pódio, trouxe um mais retrô. Queria algo mais sóbrio e com pedras douradas que nunca tínhamos usado. Para a classificatória, eu decidi colocar as cores do nosso país porque fazia muito tempo que a gente não competia e a gente precisava mostrar essa representatividade, principalmente pela música da Flávia e da Rebeca. O maiô rosa é por causa do outubro rosa. O amarelo mais uma vez para ter a cor do Brasil. Ele no meio tem um formato de esmeralda e por isso trouxemos um detalhe em verde no meio.
Nova fase de Jade
O Mundial também marcou uma nova fase de Jade. Em Pequim 2008, a jovem de 17 anos fazia sua estreia nas Olimpíadas como um dos principais nomes do grupo. Ao lado de Daiane dos Santos, Daniele Hypolito, Ana Cláudia Silva, Ethiene Franco e Laís Souza, conquistou o oitavo lugar por equipes, além de ser finalista no individual geral e sétima no salto. Quinze anos depois, Jade está no quinto ciclo olímpico de treinos.
– Não imaginei que poderia ir para Paris 2024. Imaginei minha carreira até os 30 anos, até Tóquio, mas nem sabia se seria isso tudo pois eu tinha planos pra faculdade. Cada ciclo que foi passando e cada forma que eu consegui me renovar. Foi principalmente a equipe multidisciplinar que conseguiu me proporcionar uma vida útil na ginástica que eu nunca imaginei. Hoje faço elementos mais difíceis do que quando conquistei minha primeira medalha em Mundial (2007) – celebra a ginasta que passou por momentos difíceis na carreira, marcada principalmente por lesões.
Após a Olimpíada de Pequim (2008), Jade teve uma grave lesão no punho direito. Nas Olimpíadas de Londres, em 2012, ficou fora por causa do corte após divergências com patrocinador. Nas Olimpíadas do Rio, teve uma torsão no tornozelo direito durante sua apresentação de solo. No pré-olímpico de 2019, Jade lesionou o joelho direito durante o Mundial de Stuttgart e passou por uma cirurgia de reconstrução do ligamento cruzado anterior (LCA) , o que a deixou sem possibilidades de brigar por um vaga em Tóquio.
Com a pandemia, os jogos adiados para 2021 deram uma nova oportunidade a Jade, mas o destino não queria dessa forma. Na última chance de classificação, durante o Pan, um entorse desta vez no joelho esquerdo.
— Fazia quatro anos que eu não estava no cenário competitivo e a etapa da Copa do Mundo de Paris foi ótima para me reencontrar nesse cenário. Desde 2019, quando a gente voltou do Pré-olímpico e não conseguimos a vaga para Tóquio, falei que dessa vez faria ginástica de uma forma diferente. Fui para as lembranças do início da minha carreira. Por que eu escolhi fazer ginástica? E eu tentei levar dessa forma. O que me encantou no esporte? Eu quis trazer aquela jovem Jade apaixonada de volta . Se eu estou podendo viver e ter oportunidade de ter tudo que eu tenho hoje, foi porque eu aprendi com cada coisa que passou e eu vou continuar aprendendo, sabe? Acho que a vida é isso.
Mundial e Paris 2024
O excelente desempenho do Brasil no Mundial de 2023 reascendeu a carreira de Jade. Com a medalha de prata por equipes, o país chega em Paris como um dos favoritos ao pódio, o que pode ser a grande coroação para a mais velha do grupo, com 32 anos.
– Eu estou muito realizada com o Mundial que eu tive a oportunidade de viver. Eu já vivi muitas coisas diferentes na ginástica e há muito tempo eu queria viver isso e as outras gerações também. Voltar pro cenário mundial com a competição que a gente fez, eu sempre almejei isso como equipe e individualmente.
Jade sabe que a primeira etapa foi concluída e a cobrança por resultados também virá. Depois do desempenho histórico com as seis medalhas conquistadas (um ouro, três pratas, dois bronzes), os holofotes estarão em cima da ginástica brasileira.
– Eu sinto que dessa vez a gente vai treinar para as Olimpíadas, ter a vaga traz muita paz. A gente precisa ser inteligente como fomos para esse Mundial e pegar o que cada uma tem de melhor e ter a chance de fazer esse trabalho de novo bem feito. A nossa cabeça para 2024 é ‘nós fizemos um bom trabalho, nós fomos recompensados’. Com os holofotes, a gente sabe que a imprensa vem em cima. Rebeca aqui foi perguntada se com a Simone Biles aqui isso seria um problema e ela lidou super bem porque a gente também está preparada para cada passo.
(Fonte:G1)