Correio de Carajás

Brasileiros têm alto nível de comprometimento com o trabalho, diz pesquisa

Estudo que mediu engajamento de trabalhadores com empresas na América Latina conclui que índice no país chega a 80%

Foto: Reprodução Freepik

O estudo BetterWork, elaborado pela consultoria Criteria e encomendado pela Betterfly, administradora de benefícios corporativos, concluiu que latino-americanos, em geral, são muito comprometidos com seus empregadores. No Brasil, o índice, que leva em consideração fatores como a permanência dos trabalhadores na organização, o orgulho que sentem do emprego e a probabilidade de recomendarem a empresa a outros profissionais, chega a 80%. Em pesquisa semelhante realizada na Espanha, o índice era de 72%.

O levantamento foi realizado com mais de três mil trabalhadores, mulheres e homens, de 18 a 65 anos, de empresas com 100 pessoas ou mais, da Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México e Peru. Entre esses, a Colômbia se destaca com o mercado de trabalho mais comprometido, e a Argentina, com o menos engajado. Para fins do estudo, os pesquisadores definiram comprometimento como conexão ou disposição de entregar ao empregador um compromisso adicional às tarefas de trabalho.

O principal motivo que leva trabalhadores brasileiros a se comprometerem com suas organizações, segundo a pesquisa, é a percepção da contribuição do trabalho individual para o sucesso da empresa. Outros fatores que contam são igualdade de tratamento entre homens e mulheres, além de benefícios como seguros de vida e saúde. “É interessante constatar que a preferência dos colaboradores no Brasil visa o reconhecimento e a saúde mental”, observa João Kohn, Diretor Geral da Betterfly no Brasil.

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Paulo Sardinha, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), afirma que, como regra geral, quatro elementos estão ligados ao comprometimento do trabalhador: oportunidade de crescimento, o que inclui salário, carreira e fatores financeiros; reconhecimento, sentir que seu trabalho está sendo percebido como algo importante pela empresa; realização pessoal, ou seja, a percepção de fazer algo significativo; e compromisso social da organização, que está ligado ao impacto positivo na sociedade que o trabalhador pode observar. “Normalmente, o que mobiliza as pessoas é algo muito interno”, diz.

Henrique Martins, 32 anos, coordena a Central de Atendimento do Senai-DF e concorda: “Nossa missão aqui é qualificar a comunidade para atuar na indústria, então a gente acaba comprando essa missão, se engajando mesmo, por amor à causa, à medida que vemos que as pessoas estão mudando de vida”.

Henrique Martins, coordenador da central de atendimento do Senai-DF: “A missão da empresa faz a gente vestir a camisa”
(foto: Kayo Magalhães/CB/D.A Press)

Os resultados da pesquisa BetterWork, porém, contrastam com outro levantamento realizado este ano pela Michael Page, multinacional de recrutamento, que demonstrou que 84,5% dos entrevistados apontam o salário como o principal motivador para aceitar uma nova oportunidade de emprego. Em segundo lugar, está a flexibilidade na jornada: 82% dos profissionais acreditam que a semana de quatro dias úteis aumentaria seu bem-estar e felicidade.

Henrique pontua que, apesar de o impacto do seu trabalho e o propósito da empresa serem grandes motivadores, o primeiro fator que vem à mente, quando o assunto é comprometimento, é mesmo o salário.

Entre os entrevistados pela Michael Page, mais de 40% não consideram sua remuneração justa e consideram isso uma fonte de estresse. A pesquisa BetterWork traz índices ainda mais baixos: 31% acreditam ser remunerados justamente pelo trabalho desempenhado, e apenas 27% declaram receber remuneração equivalente à de outras pessoas com responsabilidades semelhantes em outras empresas. Apesar disso, 37,6% das empresas não planejam aumentar os salários em 2024, e entre as que farão, o acréscimo planejado será de 6%.

“Ao analisar o aspecto salarial, percebe-se que a inflação global tem pressionado muito o custo de vida. Isso fez com que as pessoas priorizassem a remuneração em suas decisões de mudança de trabalho. Do ponto de vista das empresas, os custos em geral também aumentaram e elas também estão sofrendo com a influência da inflação. Em decorrência disso, boa parte das empresas não planeja aumentar os salários em 2024”, explica Humberto Wahrhaftig, diretor executivo da Michael Page.

Jornada menor

Brunno Costa, analista de sistemas do Grupo GPS, valoriza a flexibilidade de horários possibilitada pelo trabalho remoto
(foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Na opinião de Brunno Costa, 27 anos, analista de sistemas do Grupo GPS, o equilíbrio entre vida profissional e pessoal que a flexibilização da jornada traz é o fator mais preponderante na hora de medir sua satisfação com o empregador. “O que orienta minhas decisões de ficar ou mudar de emprego é a quantidade de tempo que vou ter para lazer, família, academia… Por isso, o que foi decisivo para eu aceitar a oferta de onde estou agora foi a possibilidade do trabalho remoto, mais até do que o salário”, conta.

Antes de trabalhar como desenvolvedor, Brunno foi professor e coordenador, por seis anos, em uma escola de idiomas. Ele considera que seu envolvimento com o primeiro emprego foi maior, pelo tempo de serviço, mas também por ter conhecido a empresa mais de perto. Hoje, o desenvolvedor trabalha de forma totalmente remota.

O caso de Brunno reforça uma conclusão apresentada pelas duas pesquisas: os índices de satisfação entre funcionários que passam a trabalhar remotamente são maiores, porém, seu grau de comprometimento com a empresa pode diminuir, a depender da habilidade dos gestores em distribuir tarefas, comunicar o propósito da empresa e promover a integração da equipe.

“Qualidade de vida é equilíbrio. No passado, vivíamos em uma cultura workaholic, então a gente via muito mais profissionais se submetendo a condições de trabalho ruins, mas, hoje, as pessoas estão mais conscientes do preço que se paga por trabalhar demais”, afirma Paulo Sardinha. O administrador explica que, nas últimas décadas, a ambição por qualidade de vida em países em desenvolvimento, como o Brasil, está se igualando à de países ricos, e que as empresas têm que se atentar a isso.

Alex Araujo, presidente da 4Life Prime Saúde Ocupacional, empresa de exames ocupacionais, afirma, porém, que a pandemia fez as cargas de trabalho aumentarem. “Com a popularização do trabalho remoto, vários profissionais vislumbraram a oportunidade de buscar um maior salário e uma menor carga horária. Mas, quando não encontram os dois, acabam sacrificando a qualidade de vida pelo salário, pois os índices de endividamento estão altos.”

Por isso, para o empresário, é importante que gestores mudem sua maneira de se comunicar quando o assunto é comprometimento. “Alguns setores ainda têm a mentalidade de que quando a empresa pede compromisso, ela quer dizer mais trabalho, porque a fala dos gestores não é clara. O que eles precisam dizer é que querem melhor qualidade de trabalho e não mais tempo de vida dos funcionários”, explica.

Diversidade
Outro ponto de confluência entre as pesquisas é a importância da inclusão para os pesquisados. Segundo a Michael Page, 60,7% dos profissionais consideram importante que a empresa tenha uma cultura que promova a diversidade, equidade e inclusão, sendo igualdade de gênero, geracional e de pessoas com deficiência, os pilares que precisam de mais atenção.

A importância que os funcionários dão ao tema começa a se refletir nas políticas das empresas. O Brasil se destacou no que diz respeito ao respeito à diversidade sexual e de gênero no estudo BetterWork, com índice de 60% de aprovação das organizações. As mulheres, porém, ainda reportam mais problemas de relacionamento com equipes e chefias.

(Correio Braziliense)