Correio de Carajás

Reserva ecológica corre o risco de desaparecer

Ambientalista de 90 anos de idade clama para que a Justiça barre as invasões que têm destruído, desde 2005, uma das maiores reservas ambientais do Estado

Área onde havia 10 mil pés de cupu está completamente destruída depois da ação dos posseiros/ Fotos: Divulgação

Com 2.263,9 ha, a fazenda Bandeirante faz parte da Reserva Ecológica Pedro da Mata, no município de Itupiranga. É um dos poucos lugares que ainda abriga a floresta em sua essência no sudeste do Pará, mas a área vem sendo alvo de constantes invasões, notadamente a partir de 2005. O objetivo dos invasores têm sido de fatiar a terra em lotes e saquear a madeira. O proprietário da reserva, o ancião José Ricardo Barboza Sobrinho, de 90 anos, que é coronel reformado do Corpo de Bombeiros, já não sabe mais o que fazer para impedir o crime ambiental que acontece há décadas.

A reserva tem uma longa história. Foi concedida pelo governo federal em 1974, para José Leocádio Soares, que 11 anos mais tarde repassou a posse para Ricardo Sobrinho, Desde então ele vem zelando pela área, mas não tem sido nada fácil.

Ricardo lembra que quando chegou ao Pará, vindo do Nordeste, pensando em criar gado, mas quando se deparou com toda a diversidade da floresta não teve dúvidas de que a área deveria ser preservada em sua essência. “Menos boi e mais floresta”, resume.

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A ideia inicial era explorar mel, castanha, cupuaçu, açaí, árvores medicinais e peixes em açudes e represas. Desde então ele iniciou a primeira luta, que era transformar a área, formada pela Gleba Carajás (Fazendo Bandeirantes) em uma reserva ecológica, conseguiu por meio do Decreto nº 31, de 2005 criou a ARIE denominada reserva ecológica “Pedro da Mata” foi uma homenagem a um dos pioneiros de Itupiranga, com quem Ricardo conviveu desde quando chegou à região.

Pelo decreto, 80% da área ficou preservada, formando uma das maiores reservas do Estado. Com3.521.6h contando com área da fazenda Potiguar. Ele lembra que quando foi feito o inventário, em 2005, foram encontrados nada menos que 1.125 pés de castanha. “Hoje em dia, se existirem 100 castanheiras na área é muito”, lamenta.

Qualidade da cerca erguida no local mostra que o posseiro tem alto poder aquisitivo
Crimes ambientais e grilagem

No mesmo ano em que a reserva foi oficializada, uma onda de invasões se iniciou. De lá para cá, já houve três reintegrações de posse e até que a quarta seja cumprida, os ocupantes posseiros permanecem na área. Ele não tem dúvidas de que as invasões têm como principal objetivo a derrubada de madeiras e a grilagem da área.

Além disso, no local hoje existe plantação de maconha e também esconderijo de motos roubadas.

No último ataque à sede da fazenda, em 2017, os criminosos derrubaram a casa do vaqueiro e roubaram cinco vacas, causando um prejuízo de mais de R$ 500 mil. Além de haverem queimado um trator de esteira D 50 e arrombaram a represa com varias toneladas de peixe tambaqui nas invasões anteriores.

Em um vídeo, ele chega a chorar diante do crime ambiental cometido na área que ele vem lutando há décadas para manter.

Quem entra na reserva vê o nítido contraste entre a área que se mantém preservada, sob os cuidados de Ricardo, diante da degradação nas partes que estão griladas. Só como exemplo, uma das áreas onde havia 10 mil pés de cupuaçu, hoje está completamente destruída depois da ação dos posseiros que não respeitam nem a área de preservação permanente.

Ricardo não está de braços cruzados e tampouco agiu fora dos limites da lei. Nada menos de 22 ocorrências policiais foram registradas na Delegacia Especializada de Conflitos Agrários (DECA), além de ter feito várias comunicações de crime ambiental na Secretaria de Estado de Meio Ambiente e do município (Sema) e também no Ibama. “Todas as autoridades que tínhamos de comunicar, nós comunicamos”, afirma. Infelizmente, a degradação ambiental continua.

O aposentado observa ainda que não existem colonos na área, mas sim grileiros e três endinheirados (consta são fazendeiros) que compraram lotes dos invasores e pagam a indivíduos que se dizem posseiros para se manterem no anonimato. Prova disso é que existe dentro da reserva vários kms de cerca com estacas de madeira de lei com cinco fiadas de arame liso, o que demanda muito recurso e dificilmente seria feito por colonos pobres.

Primeiro Reintegração de Posse da reserva biológica foi obtida ainda no ano de 2006
Preocupação com futuras gerações

Quando perguntado por que decidiu preservar a área de mata, ele responde sem pestanejar: “Eu quero que as futuras gerações de Itupiranga vejam como era sua floresta porque isso aqui tudo vai acabar e os jovens que estão nascendo hoje não vão saber como era sua floresta”.

Sua preocupação com as gerações futuras é genuína ele lançou um panfleto, por conta própria chamado de “Informativo Itupiranga”, com o seguinte título: “Carta aos jovens de Itupiranga – O Meio Ambiente Pede Socorro!”.

Ricardo Sobrinho: “Todas as autoridades que tínhamos de comunicar, nós comunicamos”

No impresso, de quatro páginas, Ricardo faz um relato de toda a história da reserva ecológica, denuncia os crimes diante da inércia das autoridades, mostra imagens da degradação ambiental e apresenta até um mapa da área. No período de 2018 a 2022 os novos posseiros derrubaram mais de 400 ha da floresta nativa dessa fazenda.

Preocupado e entristecido, o Sr. Ricardo lamenta a omissão e o descaso com a tão importante reserva que vem sendo mantida por ele a tanto custo durante quarenta anos. Onde viu matarem três antas, várias capivaras e até macacos que ali existiam.

(Chagas Filho)