Com o Rio Tocantins alcançando os 11,24m acima do nível normal, a enchente não tem sido a única problemática desse inverno amazônico em Marabá. Além de precisarem lidar com a saída de imóveis, perda bens materiais e da própria paz, marabaenses flagelados têm perdido o sono com a falta de assistência nos abrigos e a demora para a construção de novos barracos, enquanto assistem seus pertences molharem com a chuva.
A reportagem deste CORREIO esteve em alguns abrigos da cidade e conversou com moradores em situações críticas. Na estrutura improvisada levantada na entrada da Marabá Pioneira, a adolescente de 16 anos, Valdeane Borges dos Santos, conta que está lá com a família há tantos dias que perdeu noção de tempo. Eles precisaram ficar por um tempo debaixo da lona até que os barracos fossem construídos.
CHEIA DE ÁGUA E FAMÍLIAS DESABRIGADAS
Leia mais:Moradora da Rua São Pedro, no bairro Santa Rosa, a jovem diz que a água alagou completamente sua casa, chegando a cobrir as pernas, cintura, batendo na “boca do estômago”. Para poder sair foi outra complicação, já que não possuem carro e, ao pedir ajuda para a Defesa Civil, receberam como resposta que existiam outras prioridades.
Já mãe, a adolescente estava com seu filho pequeno dentro da água onde morava e por isso precisou pagar alguém para que fossem levados até o local. Ela se indigna ao falar que também teve dificuldades ao pedir uma lona para colocar suas “coisas” debaixo, pois segundo Valdeane, foi dito que a lona já tinha sido solicitada por elas.
Mas os problemas não pararam por aí. Com a chuva, o abrigo também sofre com a quantidade de água caindo todos os dias do céu: “Eles disseram que viriam aqui colocar o cimento, mas até agora nada foi feito sobre”, ressalva, dizendo que a solução em curto prazo é cimentar, mas que acaba sendo em vão, pois com o clima, o material não firma e nem soluciona o problema. Os blocos de abrigos estão cheios de água e famílias.
Euza Vidal dos Santos e sua família precisaram ir para o abrigo improvisado no galpão da antiga Borges informática, localizado na Avenida Antônio Maia, também na Marabá Pioneira, no sábado (18) à noite, devido ao alagamento. Com relação à assistência que deveria receber, a mulher diz que até o momento só solicitaram seus nomes e a quantidade de pessoas por família.
“A gente fica à mercê dos auxílios que recebemos, mas eles têm a data certa para cair. Fora isso, as diárias que me sustentam estão suspensas devido a todo o transtorno com as chuvas”, conta a flagelada.
PERPETUAÇÃO DA PROBLEMÁTICA
Moradora da Vila Canaã, Zenilde chegou ao abrigo instalado na Avenida 5 de Abril, no domingo (19). Ela conta que fez o cadastro para que a Defesa Civil pegasse os objetos de sua casa, que foi completamente tomada pela água no sábado e ameaçada novamente no dia seguinte.
Segundo a mulher, um carro do órgão foi o responsável por levar suas coisas e fornecer a energia. No entanto, ela cita goteiras dentro do barraco instalado temporariamente para abrigar ela e sua família. Conforme o depoimento dado por Zenilde, não tem faltado o mínimo para as dezessete famílias que ali se encontram.
CADA UM POR SI
Luiz Felipe, conhecido como “Luiz da Santa Rosa”, vivencia a dificuldade na pele, ao se juntar à lista de pessoas que precisaram ser realocadas de onde moram para as quadras de esporte da orla, no Largo da Santa Rosa, onde ainda serão levantadas as estruturas.
O funcionário público assume saber que se trata de uma situação muito delicada, mas que apesar disso, precisa pontuar que há uma única empresa contratada pelo município para ficar responsável por diversos pontos de alagamento da cidade e que isso acaba gerando transtornos porque é difícil catalisar toda essa responsabilidade.
“Se cai uma chuva agora, a lona não vai impedir que a pessoa perca uma geladeira, uma televisão, um tanque de lavar roupas. Governador, venha olhar para gente igual o senhor olhou ano passado”, clama o homem.
Além disso, Luiz afirma que o dono da empresa, de prenome Neto, disse a ele e as outras pessoas que os materiais para levantar os barracos estavam sendo entregues e que seria de responsabilidade de cada um a mão de obra das estruturas improvisadas. Segundo ele, há mais de 100 famílias só lá e apenas na data de hoje o Exército se fez presente para ajudar levando as mudanças de moradores.
SONO E DESESPERO
E até mesmo o sono tem sido uma dificuldade, como conta Maria Zilda, moradora de uma rua ao ado do campo Del Cobra. Ela diz que desde quinta-feira (16) sua casa foi tomada pela enchente e se uniu a outras famílias a procura de uma alternativa para se abrigarem, mas seu tormento não parece ter chegado ao fim, considerando que, agora, mesmo tendo sido escalada para ficar temporariamente na quadra, ainda sofre com a falta de abrigo: “Tem sido um verdadeiro pesadelo, minhas coisas e o cachorro na chuva, as galinhas morrendo. Eu fui conseguir dormir 4h30 da manhã porque ainda não tem barraco para descansar”:
“Tem sido um verdadeiro pesadelo, minhas coisas e o cachorro na chuva, as galinhas morrendo. Eu fui conseguir dormir 4h30 da manhã porque ainda não tem barraco para descansar”.
A senhora levanta que tem sido um verdadeiro descaso, pois até agora não recebeu previsão de quando um barraco para abrigar sua família e móveis será construído. Para piorar, ela afirma que a Defesa Civil não pôde ir buscar sua mudança, portanto, precisou levá-la sozinha.
O OUTRO LADO
Diego Bastos, que faz parte da prestação de serviço da empresa contratada pela prefeitura, denominada de GR Frota, afirma que a intenção do poder público é realocar as pessoas que estão passando por esse momento de dificuldade por causa da força da natureza. Diante disso, foi solicitado a eles que os abrigos fossem construídos o mais rápido possível para tirar os moradores desse sofrimento inicial, porém, ele assume que tal situação, ainda, não foi vencida.
“A chuva começou e, quando vimos, o rio já tinha alcançado seus 11m. Na mesma proporção que tem chovido, nós temos feito mais frentes de serviço”, conta o trabalhador, acrescentando que, naquele momento nos abrigos da Z-30, havia 14 homens descarregando material e construindo os barracos improvisados. Além das pessoas que se voluntariaram para ajudar.
Ele explica que estão sendo construídos outros abrigos no mesmo local e no núcleo São Félix. E, para que as pessoas não saiam de suas casas para vivenciarem essa mesma situação, um novo plano será alinhado com a Defesa Civil, para evitar novos transtornos aos flagelados.
“Algumas pessoas se anteciparam para viver novo sofrimento e, diante disso, vamos tentar lutar contra o tempo para ajudá-las”, diz. Por fim, Diego aproveitou para agradecer à população, que mesmo com tantas dificuldades, tem tido compreensão para com a empresa, que também fica à mercê do tempo. (Thays Araujo com informações de Luciana Araújo)