Mais de 4 bilhões de pessoas serão obesas ou estarão acima do peso no mundo até 2035, se não forem tomadas medidas significativas para conter o problema de saúde pública.
O alerta foi feito pela Federação Mundial da Obesidade, em relatório divulgado na quinta-feira (2). Neste sábado (4), o Dia Mundial da Obesidade alerta para a necessidade de ações imediatas e o desenvolvimento de políticas públicas na área.
A obesidade e o excesso de peso são questões de saúde com causas multifatoriais, o que destaca o envolvimento de diversos setores da sociedade com o objetivo de reduzir os impactos do problema.
Leia mais:“A obesidade e o sobrepeso na infância nos preocupam de forma especial, pois, quanto mais precoce o aparecimento, maior risco do acúmulo de comorbidades e maior exposição à essas comorbidades durante a vida. O que leva à múltiplas complicações associadas à doença como o risco de desenvolver diabetes, hipertensão, doença cardiovascular, aparecimento de alguns tipos de cânceres, além do risco de morte precoce e impacto sobre qualidade de vida”, alerta Paulo Miranda, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
Do ponto de vista conceitual, tanto o sobrepeso quanto a obesidade se referem ao acúmulo excessivo de gordura corporal, um guarda-chuva que inclui todos os outros conceitos. A obesidade é fator de risco para outras enfermidades, como: doenças cardiovasculares, diabetes, hipertensão e alguns tipos de câncer.
Além disso, soma-se a maneira como o problema é visto pela sociedade, podendo levar a estereótipos e discriminação. Para especialistas, é justamente nesse ponto que fica evidente como aspectos sociais e psicológicos do indivíduo podem ser afetados, para além da questão física.
Aumento da obesidade
A prevalência de obesidade tem aumentado de maneira epidêmica entre crianças e adolescentes nas últimas quatro décadas e, atualmente, representa um grande problema de saúde pública no mundo. No Brasil, o excesso de peso, que compreende o sobrepeso e a obesidade, também tem aumentado em todas as faixas etárias, de acordo com o Ministério da Saúde.
Dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS, 2020) mostram que mais da metade dos adultos apresenta excesso de peso (60,3%, o que representa 96 milhões de pessoas), com prevalência maior no público feminino (62,6%) do que no masculino (57,5%). Um em cada cinco adolescentes com idades entre 15 e 17 anos estava com excesso de peso (19,4%) e 6,7% estavam com obesidade.
Em 2021, dados do Relatório público do Sistema Nacional de Vigilância Alimentar e Nutricional mostram que, das crianças acompanhadas na Atenção Primária à Saúde, 15,8% dos menores de 5 anos e 33,9% das crianças entre 5 e 9 anos tinham excesso de peso, e dessas, 7,6% e 17,8%, respectivamente, apresentavam obesidade segundo o Índice de Massa Corporal (IMC) para idade. Quanto aos adolescentes acompanhados na APS em 2021, 32,7% e 13,0% apresentavam excesso de peso e obesidade, respectivamente.
A obesidade em crianças e adolescentes é um problema grave, que ocasiona repercussões para as saúdes física e mental, além de sobrecarregar o Sistema Único de Saúde (SUS) com altos custos relacionados ao tratamento do agravo e de complicações.
No caso da obesidade infantil, muitas crianças estão crescendo em ambientes que promovem ou favorecem comportamentos sedentários e escolhas alimentares não saudáveis com presença de alimentos ultraprocessados, ricos em gorduras, sódio, aditivos químicos e pobres em nutrientes.
Como lidar com a obesidade de maneira saudável
Por ser um problema de saúde de causas multifatoriais e complexas, a obesidade precisa ser tratada considerando os contextos sociais e econômicos que envolvem os indivíduos.
“O tratamento da obesidade é complexo e multidisciplinar. Em linhas gerais, o tratamento farmacológico é adjuvante e inicia-se na prevenção secundária para impedir a progressão da doença para um estágio mais grave e prevenir complicações, sempre com uma abordagem terapêutica individualizada”, afirma o médico cirurgião Leonardo Emilio, professor adjunto do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG).
Algumas medidas podem contribuir para o enfrentamento do excesso de peso.
1. Tirar o foco da perda de peso
Um manual do SUS sobre o tema enfatiza que o cuidado com a obesidade deve considerar a perda de peso apenas como um dos elementos ou resultados do processo, mas não o único.
Segundo o documento, quando perder peso é o único objetivo ou o foco principal, os meios para alcançá-lo podem se distanciar de atitudes saudáveis. Além de reconhecer que o ganho ou a perda de peso não são resultados apenas de escolhas individuais, as orientações devem se fundamentar na ideia de que todos são capazes de alcançar saúde e bem-estar, independentemente do peso corporal, porque saúde e qualidade de vida são os verdadeiros objetivos.
“Alcançar e manter um peso saudável inclui alimentação saudável, atividade física, sono ideal e redução do estresse. As medidas de prevenção devem se concentrar em políticas e estratégias ambientais para tornar a alimentação saudável e a vida ativa acessíveis para todos os cidadãos. Essas prioridades ajudam a melhorar a saúde geral e o bem-estar e prevenir, retardar e controlar muitas doenças crônicas, em especial as relacionadas à obesidade”, afirma Emilio, que atua como chefe de equipe cirúrgica do Hospital Israelita Albert Einstein, em Goiânia.
Para se ter uma ideia de que as estratégias de cuidado vão além do peso ou do percentual de gordura corporal, em uma circunstância de sobrepeso ou obesidade, uma perda de 5 a 10% do peso corporal promove benefícios significativos para a saúde, uma vez que pode provocar melhora nos principais fatores de risco e nas comorbidades, como por exemplo: redução da pressão arterial, redução do risco cardiovascular, do colesterol e da glicemia, entre outros.
“Medicamentos para perda de peso devem ser usados junto com mudanças na dieta, exercícios e comportamento, não em vez deles. Antes de selecionar um medicamento, um médico deve ser consultado e ele considerará seu histórico de saúde, bem como possíveis efeitos colaterais”, afirma Emilio.
2. Adotar uma alimentação adequada e saudável
Para pessoas com excesso de peso, uma das principais recomendações é ter uma alimentação baseada em alimentos in natura e minimamente processados, conforme orienta o Guia Alimentar para a População Brasileira, do Ministério da Saúde.
Nesse contexto, deve-se evitar o consumo de alimentos ultraprocessados, que estão amplamente associados ao ganho de peso (veja abaixo como identificá-los).
Falando especificamente da infância, é preciso pensar nas influências que as famílias recebem para comprar alimentos. Nesse quesito, pesam a condição de acesso a alimentos saudáveis, tanto do ponto de vista físico quanto econômico, por exemplo.
Outro ponto fundamental é observar se as mães têm condições de amamentar os bebês ao invés de oferecer fórmulas e se após o aleitamento exclusivo é feita a introdução à alimentação complementar.
O Ministério da Saúde ainda traz as seguintes recomendações principais:
- Estimular o consumo diário de alimento do grupo de feijões, preferencialmente no almoço e jantar;
- evitar o consumo de bebidas adoçadas tais como refrigerante, suco e água de coco de caixinha, que são ultraprocessadas;
- evitar o consumo de alimentos como hambúrguer, embutidos – linguiças, salsicha, macarrão instantâneo, salgadinhos de pacote e doces;
- consumir diariamente legumes e verduras no almoço e no jantar;
- consumir diariamente frutas;
- alimentar-se com regularidade e atenção, sem se envolver em outras atividades
3. Praticar atividade física regularmente
Independente de resultados aparentes em relação ao peso, as mudanças no estilo de vida devem ser valorizadas, ainda que possam parecer pequenas. Como o início de uma atividade física, mesmo que não seja na intensidade ideal ainda, mas que pode ser ampliada ao longo do tempo.
Dessa forma, é preciso respeitar o ritmo de cada indivíduo. O professor e preparador físico Marcio Atalla explica que o primeiro passo para a mudança de hábitos alimentares e de atividade física é a criação de hábitos. Ele recomenda que o momento para o exercício seja acrescentado à lista de tarefas do dia por escrito ou na agenda no formato digital.
“A criação do hábito passa pela repetição da tarefa. Minha dica é: não importa se nesse começo a sua mudança na alimentação ou na atividade física vai ser ótima, o importante é que se faça uma mudança possível de ser repetida nos próximos 90 dias pelo menos 70 vezes, ou seja, cinco vezes por semana”, destaca.
Segundo o preparador físico, a incorporação de atividades mais próximas do cotidiano pode ser um bom começo para a criação do hábito do movimento, como a realização de caminhadas diárias de 15 minutos ou subir dez andares de escadas.
4. Acolher e cuidar do lado emocional
Abusos físicos ou verbais ainda são comuns à vivência de indivíduos com sobrepeso ou obesidade. O estigma é fruto da associação da obesidade à falta de vontade, preguiça ou comportamento desleixado – uma visão inadequada que exclui as nuances profundas que envolvem o problema.
Essas situações se agravam especialmente na infância e adolescência, quando o excesso de peso pode levar à exclusão e discriminação. O estigma acontece, frequentemente, apoiado na justificativa de desencorajar comportamentos não saudáveis e melhorar a saúde das pessoas com obesidade, que são culpabilizadas pelo seu excesso de peso.
O preconceito, o estigma e a discriminação ao invés de estimularem mudanças, desmotivam e até promovem uma piora do quadro, principalmente do ponto de vista emocional. De acordo com o Ministério da Saúde, quem passa por isso é menos propenso a procurar os serviços de saúde, tanto para essa como para outras condições, comprometendo o acesso à saúde como um todo.
5. Fazer planos que possam ser executados
Quando os objetivos de vida partem de pontos executáveis, se torna mais fácil atingir as metas.
Para especialistas em saúde mental, o estabelecimento de propostas mais palpáveis de serem concretizadas ajuda na busca pela mudança de hábito e pode contribuir para evitar frustrações.
“Às vezes, as pessoas têm metas extremamente elevadas e inatingíveis. Trabalhar isso envolve um processo que chamamos de autocompaixão, de entender do que se é capaz e aceitar os próprios limites”, afirma o psicólogo Renato Caminha.
(Fonte: CNN Brasil/Lucas Rocha)