Neste dezembro, oferecemos ao leitor histórias que sintetizam o que há de mais humano em nós – amor, alegria, fé, luz e esperança – reportagens inspiradas em São Francisco de Assis, que revolucionou a Igreja no século XIII e, posteriormente, ganhou uma oração, que se transformou em uma das preces mais populares no Ocidente. As palavras acima, que estão em negrito, foram retiradas da Oração de São Francisco para mostrar que em Marabá há pessoas que vivem os ideais dessa prece ajudando o próximo.
Na escola municipal Martinho Mota, localizada na Folha 27, Nova Marabá, Célia Regina da Silva Costa, professora, transforma a vida de diversos alunos matriculados no curso Educação de Jovens e Adultos (EJA). Com idades entre 16 e 75 anos, os estudantes que antes tinham os olhos escurecidos para as palavras, têm suas vidas iluminadas pelas mãos da professora, responsável por sua alfabetização.
Célia é natural de São Luís (MA) e marabaense de coração. Ela trabalha com educação há mais de 17 anos e sua história começou muito antes da sua atuação em sala de aula. Ela recorda que desde os 14 anos é apaixonada por ensinar pessoas. “Comecei com o catecismo e foi aí que eu vi o quanto era necessário alfabetizar”, relembra.
Leia mais:Foi em Marabá que seu interesse pela educação cresceu e ela mergulhou de cabeça nesse universo. Além da graduação em pedagogia, tem formação psicopedagogia, educação especial e mantém o hábito de renovar seus conhecimentos com frequência. Para ela, alfabetizar é muito mais do que um trabalho, é amor. Sentimento que reflete diretamente no desempenho de seus alunos.
“Eu digo para eles: quando vocês começaram comigo, vocês eram cegos porque olhavam as letras e não sabiam (ler)”, diz. Para ela ensiná-los a ler e escrever é como trazer a luz para suas vidas. Inclusive, houve um tempo em que pessoas mais velhas utilizavam o termo “esclarecido” para se referirem a pessoas que sabem ler, escrever e são “estudadas”. No dicionário, esclarecer também significa iluminar.
“Eles dizem ‘hoje eu posso pegar um ônibus, professora. Hoje posso ir ao supermercado perto da minha casa e consigo visualizar o que vou comprar. Hoje eu sei realmente ler’. Então tirou aquela venda, que deixava escuro, e hoje está claro. Ele clareou diante do aprendizado (sic)”.
Além do trabalho realizado na sala de aula, Célia e a equipe escolar do Martinho Mota, visitam bairros periféricos da cidade, fazendo um levantamento de pessoas mais velhas que não são alfabetizadas, dando incentivo para que procurem uma escola e comecem – ou retomem – os estudos.
Não à toa, a turma de Célia é repleta de alunos que moram nas Folhas 06, 12, e até da 35, A professora conta que os idosos são os mais dedicados, vão para a escola caminhando, até mesmo em dias de chuva.
Entre sorrisos, a professora compartilha com a Reportagem do CORREIO DE CARAJÁS um de seus maiores desejos: “Eu tenho o sonho de um dia, alugar um galpão, pegar um microfone e falar: quem quiser ler, que venha. É muito mágico”.
COM A PALAVRA, O ALUNO
Francisco de Sousa Miranda, 52 anos, vigilante autônomo, morador do bairro Nossa Senhora Aparecida (também conhecido como “Cola-Cola”), conta que viu no Martinho Mota uma oportunidade de estudar: “Aqui na escola eu achei uma professora que desenvolve muito o EJA, a professora Célia”.
Uma curiosidade sobre Francisco, é que sua esposa, dona Euda, estuda coladinha com ele, na mesma turma. Incentivada pelo esposo, ela começou a frequentar as aulas de Célia e aos poucos está aprendendo a ler e escrever.
Antes de chegar nas mãos de Célia, o vigilante explica que já havia estudado, porém acabou esquecendo tudo o que aprendeu. Mas seu momento atual é diferente, segundo ele é de dedicação ao seu aprendizado. Francisco tem certeza do seu desenvolvimento.
“Antes de entrar aqui eu sabia muito pouco, escrevia muito pouco, lia muito ruim (sic). Agora eu acho que me desenvolvi mais, tô escrevendo e lendo melhor”, avalia.
Em 2022, uma das vitórias de Célia foi encerrar o ano com uma turma de 17 alunos, tarefa difícil para uma classe estudantil que possui grande evasão.
CURIOSIDADE
O nome Célia possui alguns significados e uma das possíveis origens da alcunha remota do inglês “Celia”, abreviação de “Cecília”. Este último tem origem do romano “Caecilius”, derivado do latim“caecus”, que quer dizer “cega”.
Um nome muito com a sabedoria e inteligência, pois na ausência do sentido da visão, é possível desenvolver um conhecimento filosófico muito mais profundo e imparcial sobre o universo e os homens. (Luciana Araújo e Ulisses Pompeu)