Os deputados da Comissão de Estudos do Transporte Fluvial de Passageiros do Estado, realizaram em diligencia semi virtual mais uma oitiva coletiva, realizada na Sala VIP da ALEPA. No dia 14 foram ouvidos os usuários do transporte fluvial, sobreviventes e o primeiro pescador que chegou ao local do naufrágio da Lancha Dona Lourdes II, e líderes de municípios pertencentes a região do Marajó e da Tocantina.
A Comissão foi instalada a partir da necessidade de averiguar como ocorreram as circunstâncias do acidente.
Foi do Porto de Umarizal, localizado em Cachoeira do Arari, que partiu a embarcação que afundou no dia 8 de setembro passado, às proximidades da Praia de Cotijuba. O naufrágio resultou na morte de 23 pessoas. Outros 66 passageiros foram resgatados. Esse porto é considerado clandestino. Antes, a embarcação havia parado ilegalmente no Porto do Camará, para o embarque e desembarque de cerca de 40 passageiros. O destino final seria a cidade de Belém.
Leia mais:A reunião foi instalada pelo deputado Orlando Lobato, presidente da Comissão, e as perguntas conduzidas pelo deputado Carlos Bordalo, relator, que definiu a reunião como um grande bate papo, troca de informações e colheita de sugestões para equacionar os problemas identificados. As contribuições irão constar do relatório e do marco regulatória que a Comissão pretende construir.
Para o deputado presidente, a terceira reunião foi muito importante por que os depoimentos trouxeram contribuições. “Mostrando essa ausência de regulamentação, regulação nos portos e embarcações que transportam passageiros”, disse.
A oitiva marcou o encontro do pescador Rafael Lobato Castro, 37 anos, morador de Cotijuba, proprietário de uma rabeta. Ele resgatou o casal Raimundo Ferro (65 anos) e Diva Seabra Oliveira (69), embarcados no Porto Umarizal e sobreviventes do sinistro marítimo. Eles eram pais da professora Brenda Seabra Oliveira de 34 anos e avós de Lívia Vitória de dois anos e sete meses, vítimas fatais do naufrágio.
“Aguardava um colega na praia Frecherinha para pescar. Nesse dia tinha muita maresia e nos atrasamos para sair, foi quando eu avistei duas “rabetinhas” e vimos um sinal de pano branco e fomos lá ver”, relatou o pescador. “Foi nesse momento que percebi se tratar de náufragos passando em sua frente em dois botes flutuantes, uns de colete, outros sem, agarrados nas malas e sacolas que boiavam na agua”, lembra o pescador. “Consegui trazer para praia sete pessoas dentro da rabeta e outros três seguros na borda”. Outros pescadores trouxeram os demais sobreviventes.
“Eu e minha neta saímos por uma janela quebrada por um rapaz, e depois, fomos nos distanciando do ponto do naufrágio, devido a maresia que nos afastava, e desde esse momento não vi minha filha mais. E depois de duas horas e meia, eu não consegui manter e larguei minha neta. Aí, foi que eu vi uma pequena rabeta chegar”, relatou aos prantos Dona Diva, muito emocionada.
No momento fazia muita maresia, maré cheia, vento forte na baia do Marajó, local onde os sobreviventes foram encontrados . O marido dela, seu Raimundo, que estava sem colete no momento do salvamento, boiava com o apoio de uma mala. “Estava há mais de uma hora me mantendo e foi quando passou uma mala e ai consegui pegar ela para sustentar um pouco, senão, não resistiria”, relatou o seu Raimundo aos deputados.
Dona Diva falou com detalhes dos momentos anteriores da embarcação afundar até o seu resgate. “A viagem, apesar da maresia, estava desenrolando normalmente. E quando chegou próximo da Ilha de Cotijuba, percebemos uma movimentação e algo estranho entre os tripulantes e o comandante. Até que a lancha foi parando e o comandante falou, ‘calma gente, ninguém se levante dos bancos e fiquem sentados para não se movimentar, para que a lancha não fique virando de um lado por outro.
“E foi então que ele mandou outro tripulante jogar a ancora e todo muito ficou preocupado, ele estaria falando com a mãe e que logo chegaria outra lancha para nos socorrer. Mas isso não aconteceu. Ele não orientou ninguém”, recorda d. Diva.
Como tripulantes na lancha havia o comandante Marcos de Souza Oliveira, de 34 anos, sua esposa e mais dois outros tripulantes. “E quando vimos, rapidamente estava entrando água, então o comandante largou o timão e subiu. Nos ficamos desesperados, quem podia pegar o colete, colocava. Por sinal, meu esposo ficou sem colete, eu vi que minha filha estava desesperada, eu fiquei com a filha dela e ela pegou e colocou o colete em mim e acho que ela conseguiu amarrar o colete nela. E foi neste momento que a vi indo pra frente da embarcação e depois não a vi mais”.
O pescador e o casal sobrevivente participaram presencialmente da oitiva. O jornalista Dário Pedrosa, do Movimento Acorda Marajó, disse que a tragédia, como a do Lourdes II, era anunciada. “Não temos fiscalização adequada mesmo tendo uma agencia reguladora. Não existe autonomia técnica e administrativa nas tomadas de decisão”.
A tarde a reunião prosseguiu e ouviu em reunião semi virtual os usuários e lideranças comunitárias da conexão Região Metropolitana de Belém e municípios do Baixo Amazonas e Tapajós.