Levar luz, e não só isso: suporte a quem necessita, além de brinquedos a crianças carentes é o propósito de quem consegue se colocar no lugar do outro. No Exército Brasileiro, um grito de guerra ecoa pelos quarteis do Brasil: “Braço forte, mão amiga”. E foi lá que o segundo sargento Wallace Acioly ecoou as lições de seus pais e os ensinamentos da caserna.
Wallace cresceu no Morro do Dendê, na cidade do Rio de Janeiro. Ele conta já ter vivido o outro lado da moeda, ao ter sido acolhido por projetos sociais onde morava: “Um deles tinha a finalidade de fazer com que eu e outros da minha idade não nos envolvêssemos com o tráfico, algo extremamente influente na área”, relembra, acrescentando a influência fundamental dos próprios pais, ambos professores, e seus maiores incentivadores na vida.
Com uma sólida base familiar, Wallace conseguiu estudar e ingressar na carreira militar do Exército, profissão que lhe proporcionou morar em quatro estados diferentes e vivenciar de perto em um deles a prática do trabalho social. Segundo o sargento, o “estalo” aconteceu em Foz do Iguaçu, depois de receber a visita inesperada de um grupo de crianças em tratamento contra o câncer. A partir daí, passou a contribuir com pessoas que sofrem com a doença.
Leia mais:O militar relata que foi tocado emocionalmente pelas crianças devido a uma questão particular: “eu havia acabado de ser pai e uma das crianças tinha a idade de uma das minhas filhas. Posso dizer que foi exatamente isso que fez com que eu começasse a agir”, recorda. Em seguida, ele começou a mobilizar pessoas ao seu redor a fim de unir doações através de eventos sociais, em Foz do Iguaçu, para ajudar essas crianças.
No Paraná, ele explica ter levado as crianças com câncer para o quartel onde servia, com o intuito de distraí-las da rotina árdua e desumana de ir de suas casas para o hospital e do hospital para suas casas: “Elas achavam interessante a farda, os veículos blindados e, por incrível que pareça, isso mudou a vida do batalhão inteiro, dos militares que serviam lá e tinham contato direto com elas”, descreve.
Ao ser transferido para Marabá, durante a pandemia, Wallace assume ter se deslocado com a concepção da realidade da carência presente na região Norte, mas também com o objetivo de continuar contribuindo socialmente da forma que pudesse.
Ele faz uma distinção considerável entre as regiões Sul e Norte, analisando que os pacientes com câncer de lá recebem auxilio do poder público, por meio de locomoção e infraestrutura, o que ele lamenta ainda não ter visto no Pará.
Depois que chegou aqui, sem conhecer ninguém, Wallace teve dificuldades em identificar uma entidade que desenvolvesse trabalho voluntário que pudesse fazer parte. Após diversas procuras, seu último ato foi digitar a palavra “esperança” na barra de pesquisa na rede social Facebook, onde encontrou um projeto social exatamente com essa denominação. A verdadeira luz no fim do túnel digital.
A partir daí, entrou em contato com a presidente do grupo e se disponibilizou a ajudar com o que fosse preciso. Atitude essa que acabou criando um vínculo forte com o Instituto Esperança e Vida. Wallace começou oferecendo apoio a uma moça marabaense em tratamento contra o câncer.
“Ela possuía quatro filhos e carecia de estadia em Tucuruí para não se deslocar todos os dias para Marabá e, pensando em ajudá-la, movimentei um grupo de amigos no WhatsApp para que arrecadássemos dinheiro para pagarmos dois meses de uma quitinete mobiliada”, relembra, incluindo que depois dela, naturalmente foram surgindo outras pessoas para ajudar.
Wallace recorda que, com o surgimento da pandemia e o comprometimento da arrecadação de cestas básicas e de subsídios, ele e sua esposa Bárbara Acioly precisaram inovar e, disso, nasceu a ideia de promoverem feijoadas para obter recursos que, mais tarde seriam transformados em auxílio para diversas famílias marabaenses. Ele conta que no primeiro decreto estadual emitido pelo governo, o casal aproveitou para cozinhar em 10 dias feijoada para cerca de 100 pessoas.
A ação levantou fundos que fortaleceram as ações do Instituto Esperança e Vida. Mas, com a falta de visibilidade, ele recorda que precisou tirar do próprio bolso também para poder alcançar mais pessoas com contribuições: “Apesar de, desde o início eu desejar que a comunidade nos ajudasse, eu pegava o que eu tinha e tentava ressarcir depois de alguma forma, evitando assim que as ações carecessem de recursos para acontecer”, diz.
No entanto, em 2019, o casal conseguiu, com a primeira feijoada realizada, que 90 famílias fossem amparadas, número que dobrou em 2020, graças ao reconhecimento maior do projeto e de ampla ajuda da população. Com o apoio de 200 pessoas que consumiram a feijoada, Wallace idealizou a arrecadação de brinquedos novos e usados para uma ação que beneficiou diversas crianças do Residencial Magalhães II.
Para o militar, o céu é o limite, então em 2021 decidiu focar o projeto social na arrecadação de mais brinquedos e, com isso, realizou a façanha de cozinhar feijoada para 280 pessoas, dobrando o arrecadamento de todos os outros anos. Tudo isso com a ajuda da sociedade marabaense: “Eu ia até empresas, enviava um ofício e as pessoas se solidarizavam, concretizando o que eu sempre sonhei, o reconhecimento e a ajuda da comunidade”, relata.
As ações ocorrem uma vez ao ano, sempre próximo em outubro, em alusão ao mês de combate ao câncer de mama e ao Dia das Crianças, com exceção deste ano devido às eleições, tendo em vista que a maioria dos voluntários ajuda na votação como mesários. Mas para 2022, Wallace diz estar focado na reforma da sede do Instituto Esperança e Vida. O sonho dele, no momento, é a construção de alojamentos de acolhimentos na sede situada na Velha Marabá, além do desenvolvimento de cursos profissionalizantes para pessoas carentes.
Com a obrigatoriedade da transferência militar e do deslocamento para assumir o posto em outro estado, ele espera que o projeto permaneça mesmo sem ele: “Acredito que tendo plantado essa semente no coração de cada colaborador, as raízes poderão fixar-se aqui e dar bons frutos como resultado”, abre o coração.
Para Wallace, é imensurável a retribuição de todos os projetos sociais que amparam pessoas diagnosticadas com câncer. Ele encerra seu testemunho como anjo, incentivando todo mundo a fazer qualquer tipo de ação social que seja, levando em consideração a satisfação de se ver o resultado final, em seu caso, quando a pessoa tem alta no tratamento contra o câncer. Para ele, quando isso acontece é como se fosse alguém da própria família. E o mesmo ocorre com o sorriso no rosto de uma criança que tem a oportunidade de ganhar um brinquedo que não espera, devido a sua condição.
E isso Wallace Acyoli tem feito com maestria. Criado há três anos, o projeto vem, através de verbas arrecadadas por eventos promovidas em Marabá, proporcionando fé e dignidade para pessoas em vulnerabilidade social. Durante esse tempo, cerca de 300 famílias e dezenas de crianças foram beneficiadas com os subsídios dessas ações. (Ulisses Pompeu e Thays Araujo)