A morte de uma menina indígena, na última sexta-feira, chamou a atenção de especialistas para o avanço da raiva humana entre as populações desassistidas. Segundo o mais recente boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, em 2020 e 2021 foram registrados 40 casos da doença. Neste ano, já foram confirmados três óbitos causados pela exposição ao vírus transmissor.
Os estudiosos consideram a raiva uma doença diretamente ligada às más condições de vida da população, como higiene precária, ausência de saneamento básico, falta de cuidados pessoais e ausência de informação. Com o avanço da pobreza — de acordo com levantamento realizado pela Fundação Getulio Vargas (FGV Social), divulgado em outubro passado, quase 28 milhões de pessoas vivem abaixo da linha da pobreza no Brasil; em 2019, antes da pandemia de covid-19, eram pouco mais de 23 milhões nesta situação —, os casos começaram a ser percebidos na rede pública de saúde.
Jonas Brant, epidemiologista e professor do departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília (UnB), confirma a relação da raiva com a pobreza. “Depende de um bom acesso de saúde para conseguir (tratamento), caso haja a exposição, e depende, também, de uma boa infraestrutura sanitária”, esclarece.
Leia mais:Brant observa que caso a pessoa perceba que pode ter sido exposto ao agente infeccioso, a higiene é essencial para que a doença não avance. “O vírus é muito sensível ao sabão. Ao lavar, posso conseguir inativá-lo e não me infectar”, observou.
O epidemiologista alerta que é preciso uma campanha constante de esclarecimento, por parte das autoridades de saúde, sobre como as pessoas devem se proteger do vírus para, uma vez infectadas, se tratarem corretamente. “Um dos grandes problemas da doença é que, muitas vezes, os sintomas vão se desenvolver dois ou três meses depois da exposição. A pessoa esquece que está infectada e, depois, começa a desenvolver os sinais. O vírus vai progredindo até chegar ao sistema nervoso central”, explicou.
Maiores incidências
De acordo com o boletim do Ministério da Saúde, a incidência de raiva humana diminuiu entre 2006 e 2017, e as regiões Norte e Nordeste concentraram a maioria dos casos. De acordo com um estudo desenvolvido, em 2018, pelo doutorando em Ciências Animais pela (UnB) Alexander Vargas, os riscos da raiva estão relacionados, principalmente, ao contato com algumas espécies de mamíferos silvestres.
“No Nordeste, temos a transmissão por raposas, mas, em todo o país, é praticamente feita por morcegos. No Norte, os últimos surtos têm sido verificados entre as populações ribeirinhas ou indígenas”, observa.
Segundo Vargas, os morcegos “transmitem o vírus da raiva entre eles e, como ficam doentes, entram nas casas e caiem no chão. Inadvertidamente, as pessoas manuseiam esses animais e são mordidas e infectadas” — alerta.
(Fonte: Correio Brazieliense)