Correio de Carajás

É falso que o Brasil tenha sido escolhido pela OMS como um dos três países que melhor atuaram no combate à pandemia

Falso
Vídeo mente ao afirmar que o Brasil foi escolhido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um dos três países que mais se destacaram no combate à pandemia do coronavírus. A matéria citada para embasar a afirmação trata, na verdade, da participação do país em um grupo para o planejamento de ações em futuras pandemias. A seleção não teve como critério a ação dos países em relação à covid, mas sim questões diplomáticas e de representatividade regional.
Conteúdo verificadoVídeo em que um homem afirma que o Brasil foi declarado pela OMS como melhor país das Américas no combate à pandemia do coronavírus.

Onde foi publicado: aplicativos Helo e Kwai.

Conclusão do Comprova: É falso que o Brasil tenha sido escolhido pela OMS como um dos três países que melhor atuaram no combate à pandemia. O autor do vídeo verificado pelo Comprova diz embasar a informação em uma matéria da Agência Brasil. Contudo, a publicação não menciona esse dado. O texto trata da escolha do país para integrar o Grupo de Negociação Intergovernamental (INB), que reúne outros cinco países de diferentes continentes.

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O grupo tem como foco o planejamento de um instrumento — como um tratado ou acordo — para o fortalecimento global no combate a futuras pandemias. Ao Comprova, o Ministério das Relações Exteriores esclareceu que a escolha foi feita em consenso entre países-membros da OMS e que levou em consideração, entre outros fatores, a experiência brasileira em negociações diplomáticas.

Já a OMS cita a necessidade de equilíbrio entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, cada qual pertencente às regiões de atuação da organização, para a composição do INB.

Nas respostas de todos os órgãos procurados pelo Comprova, e nas notícias consultadas em seus canais oficiais e em veículos de comunicação, não há qualquer menção à escolha dos países por terem se destacado no combate à pandemia.

O Comprova classifica como falsos os conteúdos inventados ou que tenham sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgados de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

O que diz o autor da publicação: O autor foi procurado pelo Comprova, mas não respondeu até a publicação desta verificação.

Como verificamos: O primeiro passo foi procurar pela matéria citada no vídeo. Até o dia 29 de março, a notícia seguia disponível no site da Agência Brasil. Também buscamos no site da OMS informações sobre o grupo e sua criação. O site do Ministério de Relações Exteriores e o perfil do Twitter do ministro da Saúde e de outras autoridades também foram consultados.

A equipe ainda procurou a OMS e o Itamaraty via e-mail.

O Comprova também buscou pelo vídeo original publicado no Kwai. A partir do nome da conta, fizemos buscas em outras redes sociais e encontramos três perfis do Instagram associados ao homem que aparece no vídeo. A equipe entrou em contato com o autor por meio de um desses perfis.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 29 de março de 2022.

O que é o Grupo de Negociação Intergovernamental criado pela OMS

O Grupo de Negociação Intergovernamental (INB) foi criado em dezembro de 2021. Em matéria publicada no site da OMS na mesma data, o órgão explica que o objetivo do projeto é a elaboração de um instrumento para fortalecer a prevenção e ações de resposta a futuras pandemias.

Além do Brasil, participam do INB a África do Sul, Egito, Holanda, Japão e Tailândia. A informação consta em nota divulgada pelo Ministério de Relações Exteriores em fevereiro deste ano.

Pelo menos duas reuniões entre os integrantes foram previstas pela OMS para serem realizadas ainda este ano. O instrumento final deve ser apresentado até 2024, com o estabelecimento de medidas que auxiliem no combate a futuras emergências globais.

Em nota enviada ao Comprova, o Ministério das Relações Exteriores informou que a escolha do Brasil como membro se deu em consenso entre os países da América e envolveu questões diplomáticas. A organização também citou que o país tem um importante parque industrial farmacêutico.

“O País reúne credenciais sólidas para representar o continente no ‘bureau’. Na qualidade de país em desenvolvimento, com importante parque industrial farmacêutico, o Brasil compartilha tanto perspectiva e experiência, como necessidades e aptidões da região. Além disso, a extensa experiência brasileira em negociações na OMS e nossa reconhecida capacidade diplomática estão sendo mobilizadas em favor das Américas”, disse o Itamaraty.

Já na ata da reunião de criação do INB, em dezembro do ano passado, a OMS informa que a eleição dos dois co-presidentes do grupo deve refletir o equilíbrio entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. A ata cita, ainda, a eleição de quatro vice-presidentes, e que cada membro deve representar uma das seis regiões em que a OMS atua.

Em 24 de fevereiro, houve a eleição dos integrantes do INB durante o primeiro encontro do grupo. O Brasil está representado pelo embaixador Tovar da Silva Nunes, um dos quatro vice-presidentes eleitos.

Pandemia no Brasil

O Comprova questionou se a OMS possui algum ranking que aponta o Brasil como um dos melhores no combate à pandemia e se, por isso, teria sido escolhido para integrar o INB. Na resposta, a OMS apenas encaminhou links sobre a criação do grupo, nos quais não consta a informação. Em pesquisas na internet, também não foi localizado qualquer dado a respeito.

De acordo com o painel de dados de covid da organização, o Brasil é o terceiro país no mundo com mais casos confirmados. Até segunda-feira (28), 29 milhões de pessoas foram infectadas. Apenas Estados Unidos (79 milhões) e Índia (43 milhões) ficam à frente.

Em relação aos óbitos por covid, o Brasil é o segundo país no ranking da OMS – 658 mil pessoas morreram em decorrência da doença até março deste ano.

Dados do Our World in Data mostram que no Brasil a cada 1 milhão de habitantes, 139 mil foram infectados. O país está a frente de países como a Rússia, México e Japão.

Em janeiro de 2021, o Brasil foi considerado o pior país do mundo na gestão da pandemia. A avaliação foi feita pelo instituto australiano Lowy Institute, que faz pesquisas independentes sobre a gestão da pandemia em diferentes países, e analisou quase 100 estudos de acordo com critérios como casos confirmados, mortes e capacidade de detecção da doença.

Quem é o autor da publicação

O homem, identificado nas redes sociais como Sergio de Almeida de Farias, tem 5 mil seguidores no Kwai e suas publicações acumulam mais de 51 mil curtidas. Na maioria delas são tecidas críticas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao Partido dos Trabalhadores (PT). No perfil, o autor se descreve como “pedreiro e mais 30 profissões, pára-quedista, militar, capoeirista, espiritualista universalista, patriota ao extremo e favelado.”

Apesar de se identificar como militar, o Comprova fez buscas no Portal da Transparência que não apontaram qualquer vínculo entre Sergio e as Forças Armadas. Procurado, o homem não respondeu aos nossos questionamentos.

Por que investigamos: O Comprova verifica conteúdos que viralizam na internet sobre políticas públicas, pandemia e as eleições presidenciais deste ano. O vídeo em questão compartilha informações falsas sobre a atuação do governo federal no combate à pandemia, o que pode influenciar o cidadão na escolha de candidatos, já que o atual presidente concorre à reeleição.

Alcance da publicação: O vídeo atingiu 75 mil visualizações no Kwai até as 15h20 do dia 28/3. No Helo, foram 1,2 mil curtidas e 1 mil compartilhamentos.

Outras checagens sobre o tema: Em verificação anterior, o Comprova mostrou que texto no Telegram espalha teoria conspiratória sobre tratado internacional da OMS.

Desde 2020 o Correio de Carajás integra o Projeto Comprova, que reúne jornalistas de 33 diferentes veículos de comunicação brasileiros para descobrir e investigar informações enganosas, inventadas e deliberadamente falsas sobre políticas públicas e a pandemia de covid-19 compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.