Ocasionalmente apontado como “melhor prefeito de Marabá” ou “o homem que iniciou a transformação da cidade”, Geraldo Mendes de Castro Veloso, ou apenas Dr. Veloso, governou o município de 1º de janeiro de 1997 a 2 de fevereiro de 2002, quando faleceu, vítima de câncer.
Mas sua trajetória na cidade não se limitou a um espaço de tempo tão curto. O piauiense de Floriano nasceu em 26 de abril de 1933. Fez medicina em Belém-PA e de lá seguiu para seu primeiro trabalho em Breves (Ilha do Marajó), onde prestava serviços para FSESP (Fundação de Saúde Pública). Ali, conheceu e casou-se com Dalva Furtado Veloso, com quem veio transferido para Marabá em 1963, para trabalhar no antigo Hospital da FSESP (atual Materno infantil).
Em 1970, Dr. Veloso montou seu consultório particular na Praça Duque de Caxias.
Leia mais:Em 1974 fundou a Clínica Manoel Mendes, na Avenida Getúlio Vargas, na Marabá Pioneira, que beneficiou milhares de pessoas de baixa renda da cidade.
Em 1988, em um novo episódio de sua trajetória de sucesso, Dr. Veloso inaugurou o Hospital Celina Gonçalves, cujo nome homenageava sua mãe. Depois, aquela casa de saúde foi vendida para um empresário e, após sua morte, o Estado comprou o prédio e o transformou em um hospital de média e alta complexidade, dando-lhe o nome de Hospital Regional do Sudeste do Pará “Dr. Geraldo Veloso”.
Mas não foi apenas essa homenagem póstuma que ele recebeu. Uma escola estadual e um condomínio residencial ganharam seu nome no Novo Horizonte, além de uma avenida no Bairro Bela Vista.
Como médico, realizou mais de 20 mil partos. Além de atuação em ginecologia e obstetrícia, atendia a todos, pois também realizava inúmeras cirurgias. A memória afetiva de muitos marabaenses ainda relembra o tempo em que ele percorria as ruas da cidade em uma bicicleta para atendimento nas residências, embora muitas das famílias não tivessem como pagá-lo.
Em quase 40 anos de casamento com sua companheira Dalva, Dr. Veloso teve os seguintes filhos: Dário Furtado Veloso, engenheiro civil; Manoel Veloso, médico cardiologista; Renato Veloso, jornalista e administrador (in memoriam); e Cristina Veloso, nutricionista.
VIDA POLÍTICA
Foi na época em que trabalhava na Fundação Sesp que Dr. Veloso conquistou o respeito e notoriedade de milhares de pacientes, muitos dos quais fazia atendimento em casa, sem cobrar nada por isso.
A popularidade lhe rendeu uma cadeira como vereador na Câmara Municipal, na década de 1970, tendo sido até mesmo presidente do Poder Legislativo. Chegou a tentar uma cadeira como deputado federal, mas alcançou apenas 11.500 votos, o que não foi suficiente para guindá-lo ao Congresso Nacional.
Mas deu a volta por cima em 1996, quando foi eleito prefeito. Fez uma revolução na gestão municipal a partir de 1997 e foi reeleito em 2000, mas não completou o mandato, porque faleceu a 2 de fevereiro, causando grande comoção na cidade. Tião Miranda, seu vice, deu continuidade e terminou o mandato.
Procurado pela Reportagem do CORREIO, o vereador Miguel Gomes Filho, o Miguelito, falou emocionado da trajetória e do legado de Dr. Veloso para a medicina e política de Marabá. Recordou que ele atendia muitas famílias em suas casas e percorria do Cabelo Seco ao Santa Rosa em uma bicicleta para realizar atendimentos.
DEPOIMENTOS
“Foi vereador, presidente da Câmara e depois prefeito. Foi nesta última que deixou um marco sem precedente. Eu diria que a história da gestão pública de Marabá está dividida em antes e depois de Dr. Veloso. Ele foi o cara que descentralizou a gestão, passou a delegar responsabilidades a seus secretários e isso mudou tudo”.
Miguelito diz que quando acontecia um problema na cidade e os vereadores começaram a discutir, Dr. Veloso não esperava os parlamentarem o procurarem. Geralmente, ele ia pessoalmente ao Parlamento para dialogar com os vereadores. “Isso era incrível. Seu legado como ser humano, médico, gestor, serve de exemplo a todos nós marabaenses até hoje. Como médico, nos enchia de orgulho; como político, revolucionou a cidade”, sintetiza o decano da CMM, com mais três décadas como vereador.
No seio da família, além da saudade, o legado de Dr. Veloso também continua vivo. Também procurado pela Reportagem do Correio de Carajás, o médico cardiologista Manoel Veloso atesta que o pai deixou aos filhos um exemplo de humildade, de honestidade, de desprendimento dos bens materiais e de lealdade.
“Nos deixou exemplos concretos durante toda a sua vida. Atendia a todos, sem discriminação. Foram muitas e muitas pessoas ajudadas. Como é gratificante poder receber o carinho dos marabaenses, ouvir suas estórias de admiração e gratidão pelo que receberam dele, ao longo da sua vida médica e política. Ele é nosso exemplo, nosso espelho, nossa inspiração”.
Dr. Veloso empreendeu importantes obras nos cinco anos em que foi prefeito de Marabá. Veja algumas abaixo:
– Duplicação do trecho urbano da Transamazônica entre a Ponte do Itacaiunas ao Aeroporto, com nova iluminação;
– Urbanização do Km 06 e terminal agro rodoviário Miguel Pernambuco;
– Construção da Praça São Francisco, na Cidade Nova
– Construção da Praça da Prefeitura (Paço Municipal)
– Construção da Secretaria de Saúde
– Construção de sede para a Secretaria de Assistência social
– Construção de 12 postos de saúde
– Construção de 25 novas escolas municipais
– Reforma de 54 escolas municipais
– Construção do Ginásio Poliesportivo Renato Veloso
– Implantação do SACI (para emitir documentos)
– Implantação do DMTU
Memórias de Dalva Veloso
Quando saiu de Breves-PA e chegou a Marabá, em 1963, casada com o médico Geraldo Veloso, dona Dalva Furtado Veloso não sabia que encontraria aqui uma cultura tão diferente da sua, embora migrasse dentro do mesmo estado.
Abaixo, leia um texto que ela escrevera anos atrás, relembrando com lágrimas nos olhos os bons tempos que viveu ao lado do esposo e dos quatro filhos:
As recordações estão dentro do meu sonho, sonho este que guardo daquela época feliz, em que descobria deslumbrada uma vida nova: casada (lua de mel) chegava a Marabá, totalmente desconhecida para mim, no dia 9 de agosto de 1963, num avião da VARIG de prefixo ANU.
Do aeroporto fomos a pé até as canoinhas e, no aterro, o senhor Guido Mutran nos cedeu uma carona em seu caminhão até o hospital da Fundação Sesp, onde meu marido, Geraldo Veloso, trabalhava, na Rua dos Mineiros, hoje Rua 5 de Abril, onde fica atualmente o Hospital Materno Infantil.
A cidade era uma tranquilidade! Apenas quatro carros rodavam em Marabá: um Jeep Land Rover, do nosso inesquecível Dr. Amadeu Vivacqua; uma Chevrolet do senhor Miguel Pernambuco; uma Veraneio de Nagib Mutran, na época prefeito da cidade, e uma Rural Willys, do nosso amigo João Ferreira.
A Praça Duque de Caxias era bonita e bem cuidada, cheia de flores, crianças brincando com seus velocípedes e bicicletas, enfim era uma festa para a gurizada. Não esqueço os jumentinhos carregando água e areias que iam passando pelas ruas tranquilas…
Tudo era novidade para mim, pois nasci no sul da ilha de Marajó, na cidade de Breves, onde o costume é muito diferente. A banana prata para nós, aqui é conhecida como tucum e o taperebá aqui é cajá.
O comércio forte de Marabá era na beira do Rio Tocantins, o famoso Marabazinho. Lá se destacavam as casas comerciais: Casas Pernambucanas, Casa Tibiriçá, Casa Contente, Casa Saliba, Casa Bandeira, Nelito S/A, Bazar Cristal, Casa Saturno, Casa Salomão e outras.
No centro da cidade havia a Casa Belém, Loja N. S. de Nazaré, Casa São José, Sapataria da Rabi (hoje J.P. Silva Calçados), Casa Marabá, Casa São Paulo, Livraria e Tipografia Iris, do nosso inesquecível jornalista João Rocha, Casa Síria (Jamil Gebrim), Armazém Câmara, Casa Xandu e Casa Aurora.
As farmácias eram Santa Luzia do nosso amigo Eduardo Bezerra, Santa Gema, do Sr. Lima, farmácia Salvação, de Tonico Teixeira e Farmácia São Miguel, do amigo José Brasil.
O mercado municipal era a Feira de Marabá, lá tudo se encontrava. No setor hoteleiro dos anos 60, apenas três hotéis serviam a cidade: Hotel de propriedade da dona Zezé, na Praça Duque de Caxias; Hotel de dona Hilda Mutran; e Marabá Hotel, de dona Naide, ambos na Rua 5 de Abril.
Quanto à saúde no município, o Hospital da Fundação Sesp era o único da região e atendia todos os municípios vizinhos. Quatro médicos atendiam nesse hospital: Dr. Veloso, Dr. Linhares, Dr. Régis e Dra. Eimar. As enfermeiras eram duas: dona Orquídea e dona Lucila. O laboratorista era o Sr. Milton Athaide, as atendentes parteiras eram Deney e dona Barbosa.
Além dos médicos do Hospital, tínhamos dois excelentes médicos particulares, que eram os saudosos Dr. Amadeu Vivacqua e Dr. Demóstenes Azevedo. Marabá muito deve a estes profissionais que lutaram pela saúde dos filhos da terra.
Existiam na cidade apenas três igrejas católicas: São Félix de Valois, Capela de Nossa Senhora das Graças, na Santa Rosa, e Capela de São José, no Bairro Amapá. Nossos sacerdotes eram apenas quatro: Padres Cícero, Sebastião, Frei Gil e padre Baltazar, sendo que este último ficou conosco por muito tempo e passou a se chamar Monsenhor.
Igrejas protestantes ou evangélicas havia três na cidade: Assembleia de Deus, Presbiteriana e Batista.
Na educação, o melhor da cidade era o Santa Terezinha, dirigido pelas irmãs Dominicanas e situado nas colinas do Amapá. Lembro aqui as irmãs que passaram por este colégio e que deixaram enormes saudades: Madre Lina, Madre Terezinha, Irmãs Nobertina, Celina, Ana Rita, Theodora, Cristiana, Madalena, Zoé, Diva, Cláudia, entre outras.
Quem não se lembra dos teatrinhos da professora Felipa Serrão? Ela era um orgulho para quem a conheceu e Marabá lhe deve muito. Falando em educadoras, não podemos deixar de mencionar duas professoras excelentes alfabetizadoras: “Santa”, cujo nome era Judith Gomes Leitão e sua irmã Julieta. Elas também alfabetizaram gerações em Marabá, incluindo meus filhos, que hoje são formados.
Cine Marrocos, onde estás? O teu prédio continua lá, deixando aos que te conheceram muita saudade… Eu era assídua frequentadora do matinê, levando os meus filhos, então pequenos, para assistirmos ótimos “bang-bang”, do faroeste americano e outros bons filmes musicais. Que saudade sinto de tudo isso.
Agora vamos falar do carnaval de Marabá que era uma diversão inocente, alegre e divertida. O carnaval de rua era animado pelo conjunto do compadre Manduquinha. Saiam às ruas para brincar nas casas de famílias conhecidas. Os foliões mais animados eram Sr. Maneco, Adelina Marinho, Hiram Bichara, Miguel Pernambuco, Dr. Régis, Jamil Gebrim, Milton Athaide, Celso Leite, compadre Armandinho e tantos outros. Havia uma amizade simples e sincera entre os filhos da terra e os que chegavam aqui.
Não posso esquecer-me da época junina com o famoso boi-bumbá, que andava pelas ruas de Marabá tendo à frente o conhecido Palmica. Vamos lembrar o tacacá da dona Açucena, o mais gostoso da região. Lembro com saudade também o espetinho do Caetano que era uma gostosura! Ah! Marabá, quem te conheceu no passado não te conhece mais!
Onde estão os vai-e-vem de motores cheios de castanhas que faziam a alegria do Marabazinho? Os barcos conhecidos como marabaenses eram destemidos e valentes desafiando a terrível capitariquara e outros como Santa Maria, Itaboca (hoje coberta pela represa de Tucuruí) e Carneirão. Esses barcos iam cheios de castanha levando nossa riqueza, que infelizmente acabou.
Lembro das famílias tradicionais da época que aqui cheguei: Macias, Chuquia, Moraes, Saliba, Holanda, Almeida, Gabi, Pinheiro, Matos, Vivacqua, Gomes, Bandeira, Contente, Zaidan, Morback, Zarlou, Salame, Bezerra, Ferreira, Câmara, Maia, Mutran, Marinho, Vergolino, Maranhão, Leandro, Rodrigues, Bichara, Moussalem, Andrade, Abdelnor, Salomão, Cunha, Braga, Costa, Amaral, Abbade, Gemus, Santis, Leão, Brasil, Sampaio, Amoury, Mathias, Botelho, Jadão, Rocha, Quadro, Malaquias, Azevedo, Solino e Silva.
Zonas do Meretrício eram as famosas Canela Fina, Pau do Urubu, Pau de Arara, Fabrícia Jadão, Magalhães Barata e Pela Pato, esta última no Bairro Santa Rosa, cantada em versos pelo saudoso Alcidinho, que era um esmoler que todos conheciam.
Marabá, querida, que vi crescer e que nos recebeu a mim e meu marido de braços abertos, me recordo de ti com muito orgulho.
Obrigada Marabá, eu te amo.”
Dalva Veloso
(Ulisses Pompeu)